Eles não são alimentos nem medicamentos. Sobre esses, as agências reguladores possuem instrumentos bem definidos de vigilância. São suplementos, o motivo crescente de preocupação por parte de médicos e serviços de saúde, pelas brechas legais que garantem seu livre comércio e propaganda, mesmo que suas alegações sejam totalmente destituídas de comprovação científica e de segurança.
Foi publicado recentemente nos Estados Unidos, o resultado de notificações de efeitos colaterais graves e mortes, relacionados ao uso de suplementos naturais dirigidas ao FDA, a agência americana que regula alimentos e medicamentos. Essas notificações partiram de pacientes, médicos e fabricantes de suplementos, alcançando 10.300 casos nos últimos 5 anos. Dentre eles, 115 mortes, 2100 internações, 1000 lesões graves, 900 atendimentos em unidades de emergência e 4000 outros eventos médicos importantes. Desde reações alérgicas, náuseas e vômitos, até lesões graves em fígado, rins e coração foram descritos.
É bem provável, que o FDA receba um número muito maior de notificações de efeitos colaterais originados a partir de medicamentos, mas esses geralmente são utilizados em pessoas doentes, nas quais tem efeito benéfico comprovado, podendo salvar vidas. Corre-se um risco em prol de um benefício de saúde real. Infelizmente, isso não ocorre com os suplementos, utilizados geralmente por pessoas saudáveis e que a partir desse uso passam a correr riscos sem nenhum benefício definido.
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O quadro deve ser muito mais alarmante do que esse publicado recentemente, pois a maioria dos casos nem chegam a serem detectados como provenientes do uso dos suplementos e outros nem chegam a ser declarados. Mesmo assim, são universais as dificuldades em se banir produtos conhecidamente perigosos do mercado de suplementos e em reconhecer a necessidade de maior regulamentação e vigilância. Nos Estados Unidos, o FDA levou mais de uma década para banir um único suplemento, a efedrina, apesar dela ter causado milhares de efeitos colaterais e mortes. Esse produto era utilizado como um suplemento natural emagrecedor.
Disfarce para medicamentos
Um risco bem conhecido dos suplementos nutricionais é a sua adulteração através da adição de verdadeiros medicamentos. Os mais comuns são as drogas utilizadas no fisiculturismo como os esteroides anabólicos, os emagrecedores como a sibutramina e os medicamentos que melhoram a performance sexual.
Nos Estados Unidos, nos últimos 4 anos, foram recolhidos pelo FDA cerca de 400 suplementos adulterados além de inúmeras notificações de casos de derrame cerebral, falência renal, hepatites medicamentosas, embolia pulmonar e morte associados ao uso de suplementos adulterados.
No Brasil, nós não temos uma estatística que demonstre o fato, mas o último episódio que ficou conhecido foi de um suplemento adulterado com sibutramina, devidamente registrado na Anvisa na categoria de alimento. Tal suplemento era importado da China e foi retirado do mercado brasileiro em dezembro de 2011.
Ironicamente¸ as pessoas que tentam fugir dos remédios optando por suplementos naturais, podem estar consumindo esses mesmos remédios de maneira camuflada e o que é pior, sem prescrição ou acompanhamento médico. Infelizmente, não podemos deixar de culpar as autoridades sanitárias e legislativas, pela permissividade com que tratam questão tão sérias aceitando a inocente alegação de "natural" ou de alimentos. Pelo que entendemos, alimentos são muito diferentes desses suplementos que espertamente utilizam-se deles para receberem o aval e serem comercializados como naturais.
*Por Ellen Simone de Paiva, endocrinologista e diretora do Citen - Centro Integrado de Terapia Nutricional)