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Em busca de espaço

Mulheres se destacam em ambientes normalmente ocupados por homens

Jéssica Sabbadini - Especial para a Folha
08 mar 2025 às 11:14

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O papel da mulher na sociedade é um assunto discutido há tempos. Sempre vinculado ao cuidado, tanto com a casa, com a família ou com os filhos quanto com os pais na velhice ou com algum parente que necessita de atenção redobrada. Redobrar. É isso que muitas mulheres fazem, elas se dobram e redobram para manter a máquina funcionando.


Por muitos anos, o papel de cuidar era o único futuro planejado para uma mulher, já que um bom casamento traria o conforto que ela precisa para manter o foco na família. Sonhos eram reprimidos e vontades podadas, já que o lugar de uma mulher era traçado pelos homens.

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Nas últimas décadas, o cenário foi ganhando novas formas. Mas não pense que foi uma mudança fácil e que veio de bom grado, ao contrário, exigiu uma intensa luta em prol de uma igualdade de direitos e deveres. Até hoje é necessário, vez ou outra, panfletar os ideias em uma perseguição de cão e gato contra uma sociedade que permanece machista e desigual. Uma sociedade que matou mais de 51 mil mulheres em todo o mundo em 2023. Por dia, foram 140.

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Neste 8 de março, sábado, é celebrado o Dia Internacional da Mulher, data que marca a luta de tantas em prol de direitos básicos e de igualdade perante os homens. Essa também é uma luta que deve ser relembrada para nunca ser esquecida.

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Hoje, a FOLHA traz um especial reunindo a história de três mulheres que foram atrás dos seus sonhos e fizeram carreira em profissões antes dominadas pelos homens. Afinal, o lugar de uma mulher é onde ela quiser estar.


NO JUDICIÁRIO

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Ao pautar sua vida e suas escolhas em nome do sonho de fazer carreira na magistratura, Luciene Oliveira Vizzotto, de 47 anos, ouviu constantes comentários desencorajadores ao longo dos anos, já que não tinha o “perfil esperado”. Em poucas palavras: ela não era um homem.

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“Minha graduação foi maravilhosa. Durante o curso de direito, tive a certeza absoluta de que queria prestar concurso para ser juíza, a maioria dos meus amigos e amigas, coordenadores e coordenadoras de estágio pensavam como eu e me ajudaram muito no meu crescimento acadêmico e profissional”, conta. Formada aos 25 anos, o caminho até a magistratura, pelo contrário, foi cheio de percalços.


O principal desafio no início da carreira, segundo ela, foi o de conquistar o respeito dos demais advogados, principalmente durante as audiências, em que chegava a ficar sem voz por ter que elevar o tom em diversas ocasiões, o que não acontecia com o colega, homem, que era ainda mais jovem. “Percebi que a dificuldade não estava na nossa juventude, mas sim no meu gênero”, afirma.

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Tanto na magistratura quanto em outros espaços de poder, as principais barreiras são aquelas invisíveis a olho nu. É necessário mergulhar mais a fundo para entender as nuances de um machismo estrutural e institucional, tão enraizado que chega a ser visto como algo natural. “Eu nunca me conformei com isso”, ressalta.


A necessidade incessante de provar que aquele lugar também pertence a uma mulher trazia efeitos colaterais que afetam corpo e mente. Vizzotto destaca a dificuldade de ingressar no “clube do bolinha”, onde as decisões mais importantes são tomadas. “Somos constantemente interrompidas, temos nossas ideias subestimadas e somos vistas como não tendo perfil para questões estratégicas, pois nos colocam o estereótipo de sensíveis, fracas e não racionais”, relata.

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Hoje, Luciene Oliveira Vizzotto é juíza de Direito do TJPR (Tribunal de Justiça do Estado do Paraná) e tem mais de 20 anos de uma carreira consolidada e com um papel importante no combate às desigualdades dentro do Judiciário. A magistrada aponta que seu principal objetivo é desenvolver alternativas para desconstruir a cultura patriarcal dentro do TJPR a fim de alcançar uma verdadeira democracia representativa.


O lugar da mulher é onde ela quiser, mas essa ainda não é a realidade em todos os lugares, já que o medo da violência e dos abusos ainda vive. “É fundamental que continuemos lutando para mudar essa situação e garantir que todas as mulheres possam estar onde desejarem, sem medo e sem restrições”, afirma.

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NO TRANSPORTE


A profissão de motorista de ônibus foi, aos poucos, conquistando Fernanda Roberta Feliciano, de 43 anos. Colaboradora da TCGL (Transportes Coletivos Grande Londrina) há quase três anos, ela começou na empresa como auxiliar administrativa. A vontade de encarar um novo desafio veio ao ver cada vez mais mulheres assumindo a direção dos veículos da frota.


“Cada vez que eu via as meninas dirigindo eu ficava mais empolgada”, conta. O primeiro passo rumo ao sonho foi a conquista da categoria D na CNH (Carteira Nacional de Habitação), seguido do curso de transporte coletivo.


No dia 1° de novembro do ano passado, Feliciano passou a ser motorista de ônibus da TCGL. Mais apaixonada pelo emprego a cada dia que passa, ela relata que já ouviu muita piadinha de mau gosto de amigos relacionada ao estereótipo de que toda mulher dirige mal ou é “barbeira”.


Os passageiros, por outro lado, comemoram o fato de ser uma mulher na condução do ônibus. “Já ouvi muitos comentários de senhorinhas dizendo que preferem mulheres pelo fato de sermos mais cuidadosas”, conta. Sempre comunicativa e atenciosa, a motorista admite que já fez muita amizade com os passageiros que, dia após dia, a aguardam no ponto para irem para seus destinos.


No curso preparatório, a proporção era de uma mulher para cada três homens, mas percebia os olhares admirados de muitos que paravam para ver o treinamento das motoristas na condução dos veículos. “A gente se sente um pouco como uma super-heroína”, relata, citando os acenos que recebe de muitas crianças durante os trajetos.


O lugar da mulher é onde ela quiser, mas para isso é necessário dar oportunidade para que elas possam mostrar do que são capazes. “Se você tem vontade de fazer algo que acha muito difícil ou impossível, acredite no seu potencial e no seu sonho que você vai chegar onde quer chegar. Quem diria que eu, aos 43 anos, ia me tornar uma motorista? Muitos iam pensar que era muito tarde para começar. Hoje eu sou uma motorista muito realizada, feliz e muito agradecida pela oportunidade que recebi”, finaliza.


NO AGRONEGÓCIO


Ao nascer dentro do agronegócio, Gayza Maria de Paula Iácono, de 63 anos, sente uma verdadeira paixão pela terra, que tudo dá, cresce e floresce. Veterinária de formação, hoje é gestora de uma propriedade rural de médio porte em Santo Antônio do Caiuá (Noroeste), voltada para a bovinocultura de corte.


Em um setor ainda predominantemente masculino, a produtora afirma que a mulher precisa ter conhecimento e se manter capacitada para conquistar seu espaço no agronegócio e o respeito das pessoas. Ao trabalhar por muitos anos no IDR-PR (Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná), ela garante que sempre foi muito respeitada pelos colegas. “Eu fiz faculdade e trabalhei em um ambiente masculino e era sempre de igual para igual”, afirma.


Ao reforçar a importância da valorização das mulheres, Iácono destaca que as produtoras querem caminhar juntas com os colegas. “Dentro de uma propriedade rural, a mulher sempre trabalhou junto com o marido, mas ela não tinha visibilidade”, explica, complementando que hoje as mulheres estão mais informadas e querem assumir a posição de gestoras e protagonistas dentro do agronegócio.


Apesar disso, a produtora ainda vê como principal desafio da mulher a tríade de cuidados que ela precisa ter, que vai desde a vida profissional até os filhos e a família. Presidente do Sindicato Rural de Rolândia desde 2021, Gayza Maria de Paula Iácono explica que montou uma comissão envolvendo mais de 50 mulheres para incentivar a capacitação das produtoras em assuntos técnicos e que movem o dia a dia do agronegócio.


Ao assumir a presidência, ela afirma que sentiu medo de não ser capaz de bater de frente com as necessidades dos produtores da cidade. “A força do agro está nas mãos das mulheres”, reforça. Segundo ela, as produtoras também têm a capacidade de envolver os filhos nos negócios da família, sendo que o fortalecimento da participação das mulheres possibilitou que jovens também viessem para dentro do sindicato.


“Levanta a cabeça e vamos seguir os nossos sonhos porque esse é o nosso negócio e que sustenta toda uma cadeia produtiva”, afirma.


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