Política

Lideranças da direita e do centrão criticam insistência de Bolsonaro em 2026

22 fev 2025 às 14:50

Lideranças da direita e do centrão manifestam em conversas reservadas resistência ao plano do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) de insistir em uma chapa encabeçada por ele para a disputa presidencial de 2026, a despeito de sua inelegibilidade.


A Folha de S.Paulo ouviu relatos de dirigentes partidários e parlamentares que temem que a demora em admitir outra candidatura possa custar a eleição no próximo ano.


A denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República na última semana, que coloca Bolsonaro no centro de uma tentativa de golpe e pode levá-lo a uma condenação criminal ainda em 2025, aumentou o desconforto diante das intenções do ex-presidente.


Líderes do campo, inclusive seus aliados, dizem à reportagem que a insistência de Bolsonaro, que tenta preservar seu capital político em um momento crítico, pode prejudicar a ele próprio. A avaliação é de que um indulto só seria possível com a eleição de um nome alinhado ao bolsonarismo.


Eles defendem que o ideal seria aglutinar a direita em torno de um único candidato até o fim deste ano, a tempo de construir uma candidatura nacional.


O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), é o principal nome levantado por essas lideranças. Como mostrou a Folha, ele avisou a aliados que aceitaria disputar a Presidência caso Bolsonaro pedisse, mas disse que prefere buscar a reeleição. Em público, afirma que não será candidato.


Outro nome que ganha tração é o de Ratinho Jr (PSD), governador do Paraná. Além destes, há ainda Ronaldo Caiado (União Brasil), de Goiás, e Romeu Zema (Novo), de Minas Gerais.


Segundo relatos, alguns aliados conversaram com Bolsonaro sobre a importância de sinalizar já um sucessor, mas ele se mostra irritado e reativo a essa possibilidade, com acusações de traição.


Seu entorno familiar reage da mesma forma. Há uma pressão no bolsonarismo para que não se admita outra candidatura em 2026 --qualquer aliado que sugira outros nomes ou fale sobre o tema publicamente vira alvo nas redes sociais.


Uma pessoa do entorno de Bolsonaro compara a situação à de Lula (PT) em 2018, quando estava preso e insistiu na candidatura até ser barrado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Fernando Haddad (PT) só foi oficializado em setembro, inviabilizando a campanha nacional e levando o partido à derrota.


Essa pessoa diz, portanto, que a direita não pode repetir o mesmo erro. Para ela, hoje o cenário diante da queda na aprovação de Lula é favorável ao grupo, mas uma candidatura só tem chances de prosperar com o apoio de Bolsonaro.


Aliados do ex-presidente dizem que ele está determinado a insistir no próprio nome como cabeça de chapa até o momento do registro, poucos meses antes do pleito, apostando na pressão de movimentos de rua e de aliados internacionais, como o presidente dos EUA, Donald Trump.


Nesse caso, ele prefere que a vice fique com uma pessoa da família, provavelmente o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL), que assumiria a candidatura após uma provável impugnação.


Em entrevista à CNN, Bolsonaro também chegou a mencionar sua mulher, Michelle Bolsonaro (PL), como uma possibilidade -contanto que fosse nomeado ministro da Casa Civil. Ninguém do seu entorno, porém, considera essa opção factível.


Bolsonaro mostra resistência à ascensão de outras figuras do campo. Publicamente, ele já criticou Caiado e sugeriu que Zema não tem alcance nacional. Ao lado de Tarcísio, seu pupilo, reforçou que o candidato em 2026 é ele próprio.


Algumas lideranças, porém, tentam derrubar a hegemonia de Bolsonaro. O maior exemplo foi no ano passado, nas eleições municipais em São Paulo, quando o influenciador Pablo Marçal (PRTB) avançou sobre eleitores do ex-presidente mesmo em meio à artilharia da família Bolsonaro contra ele.


Mais recentemente, Bolsonaro também foi desafiado quando descartou a defesa do impeachment no ato organizado para março contra Lula. Ele definiu o mote do protesto como "Fora Lula 2026, anistia já", apostando que a popularidade do petista possa derreter ainda mais até as eleições.


Como mostrou o Painel, deputados de direita se descolaram dessa estratégia e continuaram a defender o impeachment. Um deles foi Nikolas Ferreira (PL), um dos nomes mais populares do bolsonarismo.


O cientista político Jorge Chaloub, professor da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), avalia que a investigação da trama golpista fragiliza Bolsonaro e abre espaço para que outras lideranças do campo o desafiem.


Ele afirma, porém, que os dois caminhos que se apresentam para a direita até 2026 são complicados: buscar a vitória eleitoral sem o apoio de Bolsonaro ou viabilizar esse apoio, mas lidar com sua instabilidade.


A primeira opção é difícil, diz o professor, diante do "imponderável". Ele diz que, para ganhar uma eleição, não é suficiente injetar recursos na campanha -é preciso um candidato popular. Chaloub lembra do apoio que o centrão deu a Geraldo Alckmin (PSB) para sua candidatura à Presidência em 2018, derrotada com 5% dos votos.


"Por mais que o centrão seja forte operando internamente, não me parece fácil achar uma candidatura a ser construída", afirma.


Por outro lado, "não é simples lidar com alguém tão inconstante e personalista quanto o Bolsonaro", diz Chaloub. "Os vínculos são baseados na lealdade pessoal, e isso traz instabilidade. Alguém que tenha seu apoio corre o risco de desagradá-lo e ser atacado por ele. Difícil ganhar eleição assim."


O professor acredita que Bolsonaro deve manter sua pretensa candidatura até a data limite do registro eleitoral, considerando que sua popularidade é sua principal moeda. O ex-presidente poderia, por exemplo, negociar o apoio a outra figura em troca da anistia aos envolvidos no 8 de janeiro.


"Qual o grande trunfo do Bolsonaro? Ele não é um grande articulador, não tem um grande partido. O que ele pode oferecer é a capacidade de eleger figuras que apoia", diz Chaloub.


"Ele vai esticar até o limite para fazer uma troca no final. Tentar influenciar um futuro governo, trocar por uma anistia, ou mesmo para tentar contar com alguns militares [em busca de um golpe], o que parece que está sempre no horizonte de Bolsonaro."


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