O fascínio pelo sabor doce do açúcar levou a humanidade a desbravar mares e travar guerras, criando impérios e formando uma indústria de bilhões que dura até hoje. Com esse histórico, não é de se estranhar que, em uma era de culto à magreza e sobrepeso pandêmico, encontrar equivalentes menos calóricos para adoçar tornou-se o Santo Graal da indústria de alimentos. Mas, afinal, como surgiram os substitutos do açúcar, os chamados adoçantes?
O caminho até 2023, quando a OMS (Organização Mundial de Saúde) recomendou que os produtos não sejam utilizados para controle de peso e ainda pode classificar o aspartame, adoçante de tantos refrigerantes, como substância possivelmente cancerígena, foi longo.
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DA FALTA DE HIGIENE AO ENVENENAMENTO DE CRIANÇAS
A "sakara", areia grossa criada pelos indianos a partir do caldo de cana, já havia sido refinada e deixada de ser um luxo reservado a reis quando, no século 19, começaram a surgir compostos sintéticos de gosto doce.
Sacarina, ciclamato e aspartame, os três primeiros adoçantes, vieram de experimentos que buscavam outros resultados e foram percebidos graças aos velhos hábitos humanos de não lavar direito as mãos, lamber os dedos e levar objetos contaminados à boca.
O primeiro deles foi descoberto em 1879, pelos farmacêuticos norte-americanos Constantine Fahlberg e Ira Remsen. Pesquisadores da Universidade de Johns Hopkins (EUA), eles buscavam produzir novas tintas a partir de derivados de petróleo quando uma fervura transbordou. Ao comer sem lavar devidamente as mãos, Fahlberg percebeu uma doçura estranha nos dedos.
Era a sulfanilamida de ácido benzóico, substância que ele batizaria depois de "sacarina" em homenagem ao termo "saccharum", que indica açúcar em latim. O componente era de 200 a 300 vezes mais doce que a sacarose original, com a vantagem de não ser digerida pelo corpo e, portanto, não gerar ganho calórico. O produto seria lançado no mercado apenas 18 anos depois, em 1897.
O ciclamato, por sua vez, surgiu em 1937, quando um estudante de química dos EUA chamado Michael Sveda pousou seu cigarro perto de um composto de sulfamato. Ele tentava descobrir um novo medicamento para febre, mas inventou um cigarro adocicado. No ano seguinte, a substância foi comercializada como "ciclamato de sódio" e era cerca de 30 vezes mais doce que o açúcar. Foi utilizada em refrigerantes até ser proibida por risco de causar câncer.
Em 1965, o farmacêutico Jim Schlatter lambeu o dedo durante o teste de uma medicação para úlceras gástricas e, então, surgiu o aspartame, cerca de 200 vezes mais doce que o açúcar. Depois disso, entre os séculos 19 e 21, dezenas de outras substâncias de origem artificial e natural foram registradas, chegando a sabores até 7 mil vezes mais doces que o do açúcar.
Entre elas está a "dulcina". A substância, posteriormente apontada como tóxica, acabou por envenenar crianças na época. O produto foi amplamente usado nos EUA e Europa durante as duas grandes guerras.
INDÚSTRIA
O mercado de adoçantes alimentícios no Brasil é segmentado em sacarose, adoçantes de amido e álcoois de açúcar, e aqueles de alta intensidade (HIS, na sigla em inglês). Além das gotinhas e saquinhos para adoçar o café, estão presentes na aplicação de diversos alimentos industrializados, como laticínios, pães, bebidas, doces, sopas, molhos e temperos.
Por isso, além de acompanhar de perto como é redigida a legislação para venda e produção nesse mercado, as empresas da área também investem em pesquisas que comprovem a segurança desses produtos. Um dos alvos é encontrar falhas nas evidências sobre danos potenciais à saúde.
Para parte dos cientistas e sociedades médicas, portanto, não há consenso científico sobre problemas que os adoçantes podem causar. Argumentam que os testes clínicos muitas vezes são feitos a partir de pequenas amostras, em animais ou com doses superiores às consumidas no dia a dia. Dizem ainda que os resultados devem servir para a criação de políticas públicas, e não orientação pessoal.
MAS, AFINAL, QUAIS OS RISCOS?
A classificação do aspartame como "possivelmente cancerígeno", que deve ser divulgada pela Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer (Iarc, na sigla em inglês), um órgão da OMS, é considerada vaga por especialistas, pois não especifica o tamanho do risco. Aloe vera e diesel, por exemplo, estão na mesma categoria.
Até 1981, a OMS apontava que era seguro ingerir até 40 mg/kg por dia. De acordo com a FDA (agência americana reguladora de alimentos e medicamentos), a recomendação diária varia de acordo com o composto. O limite do aspartame, possível alvo da nova recomendação, é de 50 mg/kg por dia. A ingestão da sacarina, por outro lado, é de até 15 mg/kg. O limite da sucralose é ainda mais baixo, de 5 mg/kg.