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Alimentos na mesa não refletem biodiversidade do Brasil, diz estudo da USP

21 jul 2023 às 12:00

O Brasil tem 20% da biodiversidade do mundo. Entretando, esse dado não se reflete nos alimentos que estão na mesa da população. Segundo estudo do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde, da USP (Universidade de São Paulo), a quantidade de comida com origem na biodiversidade local adquirida pelos brasileiros foi considerada baixa. A pesquisa foi publicada nesta sexta-feira (21) na revista Cadernos de Saúde Pública, da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz).


A valorização e a expansão da monocultura em prejuízo de pequenos agricultores é um dos fatores que explicam essa conclusão. O artigo aponta que eles “são insatisfatórios e abaixo do que se espera de um território biodiverso e de um sistema alimentar que é destaque mundial. É necessário um maior comprometimento para a promoção de ações que fortaleçam o consumo desses alimentos entre brasileiros”. 


“O estudo tem como objetivo descrever a disponibilidade de alimentos nativos de cada estado do Brasil [para a população]. Consideramos frutas, legumes e verduras da biodiversidade. E o que a gente observou é que a disponibilidade desses alimentos é bem baixa”, aponta Anderson Lucas, um dos autores do artigo. 


Baixo consumo


Para Lucas, o consumo de frutas, legumes e verduras no Brasil já é baixo, no entanto, observando pela alimentação com itens da biodiversidade local, identificou-se uma quantidade ainda menor. “Isso se dá principalmente pela mudança do sistema alimentar global que favorece o cultivo de commodities, como milho e soja, que são base de alimentos ultraprocessados,” frisa. 


Segundo ele, sempre houve uma baixa aquisição de alimentos nativos no Brasil, entretanto, com a expansão da monocultura nos últimos anos, essa disponibilidade de alimentos da biodiversidade está caindo mais. 


A disponibilidade total (gramas/per capita/dia) de alimentos correspondeu a uma média de 1.092 gramas. A média da disponibilidade de frutas, legumes e verduras no país é de 108,67g/per capita/dia, sendo que apenas 7,09g corresponde à parcela de alimentos de origem da biodiversidade local. 


Como biodiversidade local, os pesquisadores consideraram alimentos nativos do estado em que vive aquela pessoa. Os dados se referem a 38 alimentos nativos. Foi usada uma amostra com dados de aquisição de alimentos de 57.920 domicílios, coletados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) de 2017 a 2018. 


O grupo das frutas corresponde a 56,7gramas/per capita/dia, sendo que apenas 5,89g é a parcela de itens da biodiversidade local. No caso das verduras e legumes, são 51,97gramas/per capita/dia, sendo que 1,20g são alimentos nativos. 


Por biomas, a caatinga apresentou a maior disponibilidade de frutas nativas na aquisição pela população (4,20g/per capita/dia), enquanto para legumes e verduras, a Amazônia se destacou (1,52g/per capita/dia). 


“Isso faz mal não só para a saúde do planeta como também da população, através de impactos ambientais, além de não valorizar a agricultura sustentável, só valorizar agricultura por meio monótono, que é utilizando muitos agrotóxicos e venenos. E também como isso prejudica as culturas tradicionais no Brasil, porque esse tipo de alimento que estamos destacando faz parte de algumas comunidades de povos indígenas, além de agregarem também para agricultura familiar”, pontua. 


O pesquisador sustentou que, sobre o consumo de frutas, legumes e verduras, a OMS (Organização Mundial da Saúde) recomenda  quatrocentas gramas diárias desses alimentos em cinco ou mais dias da semana. 


Soluções 


Para o pesquisador, o primeiro ponto para uma mudança nessa situação seria considerar a sazonalidade dos alimentos, valorizando os cultivados em ambientes naturais e não em ambientes controlados, com uso de agrotóxico e fertilizantes, que, artificialmente, levam ao maior rendimento daquela cultura. É preciso repassar tais alimentos com preço justo para a população. 


“Para isso, a gente tem que incentivar o cultivo desses alimentos, então é preciso criar feiras, espaço de troca de conhecimentos e dar apoio técnico aos agricultores e às comunidades que plantam e colhem alimentos da biodiversidade. A gente observou que alguns alimentos precisam de um trabalho muito manual para extração, por exemplo, o coco babaçu, que necessita ser quebrado para tirar a castanha que tem dentro dele para fazer leite da castanha de babaçu, além de farinhas e outras coisas”, afirma. 


Em relação a introduzir os alimentos nativos na dieta da população, citou a possibilidade de inclusão na alimentação escolar, principalmente por meio do Programa Nacional de Alimentação Escolar, que adquire alimentos da agricultura familiar. 


“Colocar esses alimentos na alimentação escolar e [introduzir] o debate sobre alimentação nas escolas para ensinar as crianças desde cedo a escolher e consumir os alimentos nativos, além de identificar quais alimentos são nativos de cada região e começar um questionamento sobre a origem dos alimentos”, sugere. 


Origem esquecida


Devido aos alimentos ultraprocessados, as pessoas acabam esquecendo a origem dos alimentos e que muitos não conhecem como é o alimento in natura, só sabem como é o pacote após ser processado, lembra o pesquisador. Nas cidades, há ainda maior distanciamento entre produção e população. 


“[É preciso] reaproximar a população através da produção dos alimentos, então a gente observa que a população agora vive em grande maioria na área urbana, então incentivar por meio de hortas comunitárias seria um bom exemplo para aumentar a disponibilidade desses alimentos nas áreas urbanas”, finaliza.


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