Curitiba - O ano mal começou e o mercado brasileiro de quadrinhos já tem o que comemorar, afinal de contas tem gente nova no pedaço. Bem, não assim tão nova, na verdade. Da parceria entre as editoras carioca e paulista Ediouro e Futuro Comunicação, respectivamente, nasce a Pixel Media, que promete lançar 150 álbuns nos próximos cinco anos, sendo 32 somente nesta temporada.
''Nós observamos que em vários mercados já aconteceu o que no Brasil está fase de transição. O entretenimento de massa de quadrinhos para crianças não faz mais sentido. Não dá pra gibi competir com Gameboy hoje em dia. As crianças hoje só compram gibis que têm algo atrelado a outras mídias, como um desenho animado na televisão'', afirmou o editor André Forastieri, que trouxe sua experiência em quadrinhos da Conrad Editora para a Futuro Comunicação e, agora, para a Pixel Media.
''Então, a solução não criamos, ela já foi encontrada. A publicação de álbuns de quadrinhos para público adulto, com arte sofisticada e roteiro inteligente, como Corto Maltese, que trata o leitor de forma inteligente, seja adulto ou um moleque de 12 anos'', comentou. De acordo com Forastieri, a tendência de publicação de tradepaperbacks (os chamados TPs, encadernações especiais) e graphic novels, bastante popular há tempos no Japão e na Europa, cresceu bastante nos Estados Unidos nesses últimos três anos e também já está presente no Brasil.
Depois de identificada essa possibilidade de mercado, restou à Futuro Comunicação encontrar interessados em publicar material com esse potencial comercial no Brasil. ''A Ediouro tem lá seus 60 anos de vida e vende best-sellers, tem 90% de mercado de bancas, com distribuição e impressão próprias. Mas eles não tinha muito conhecimento na área de quadrinhos e nós temos'', explicou Forastieri, sobre a parceria, que deu origem à nova empresa.
Agora, a intenção é trazer de volta os leitores inativos e não necessariamente criar novos fãs de quadrinhos. ''Não vejo necessidade de criar leitores. No começo dos anos 90, Conan vendia 200 mil exemplares por mês, X-Men vendia 150 mil, a Animal vendia 30 mil. Esse pessoal que comprava essas revistas na época tinha 15 anos e hoje tem 30. E esse cara não tem mais saco pra ficar indo toda a semana na banca para ver o que saiu e quando ele vai só encontra super-herói e mangá. Vamos lançar material para o leitor mais velho que prioriza o que gosta'', disse o editor.
A previsão é de que somente este ano sejam lançados pela Pixel Media 32 livros, com material consagrado mundo afora. O primeiro deles é ''A Balada do Mar Salgado'', do italiano Hugo Pratt, que finalmente terá no Brasil uma publicação luxuosa digna das aventuras do charmoso viajante Corto Maltese. A história, um clássico europeu, já havia sido disponibilizada por aqui de maneira um tanto irregular, em 83, pela LP&M e os álbuns de Maltese só estavam disponíveis em solo tupiniquim nos últimos anos porque a editora portuguesa Meribérica/Liber vinha trazendo o material pra cá.
Em seguida, a Pixel Media deve colocar nas prateleiras a sensualidade de Guliveriana, a versão erótica de Gulliver nos traços do italiano Milo Manara; a psicodelia e o surrealismo no universo pop de Mike Allred, um dos mais inventivos artistas norte-americanos das duas últimas décadas; a visão de uma Terra alternativa dominada pelo Império Britânico, pelas mãos do premiado inglês Bryan Talbot e ''Jingle Belle'', criação cartunesca de Paul Dini, um dos mentores de todas as animações da DC Comics na Warner, com ''Batman'', ''Liga da Justiça'' e ''Superman''. O talento brasileiro será representado pelo belo trabalho de Flávio Colin, que morreu em 2002 mas deixou obras como ''Curupira'', que reflete sobre as questões ambientais no Brasil.
Estão programados também revisões em material já lançado pela Ediouro, como edições encadernadas em álbuns luxuosos de ''Criaturas da Noite'', da dupla Neil Gaiman e Michael Zulli, e de ''Arthur - Uma Epopéia Celta'', bem-sucedida produção francesa de David Chauvel e Jérôme Lereculey. As histórias devem chegar às prateleiras de bancas selecionadas, em torno de 500 a mil em todo o território nacional, e lojas especializadas, além de livrarias, sempre no formato de graphic novels, de 100 a 200 páginas, e com preços entre R$ 20 e R$ 35.
Ero-Guro - O que aconteceria se você juntasse a loucura e bizarrise dos cineastas David Cronenberg e David Lynch, com as visões caóticas do mundo dos quadrinhistas Daniel Clowes e Charles Burns, somada à escatologia do brasileiro Marcatti, em um mangá? A resposta está em ''Ero-Guro'', de Suehiro Maruo, lançado por aqui pela Conrad Editora.
''Ero-Guro'' é nomenclatura para uma das centenas de estilos de mangás disponíveis no Japão. Os artistas que exploram essa linha ''erótica-grotesca'' costumam misturar sexo e violência com bizarrices, a fim de chocar. Como exemplo, é possível presenciar relação entre hermafroditas, incesto, sodomia, necrofilia, pedofilia, coprofagia, mutilação, entre outras coisas, que deixariam até mesmo o Zé do Caixão, se não fosse careca, de cabelo em pé.
Talvez a especialista em quadrinhos japoneses, a pesquisadora Sonia Bibe Luyten, saiba explicar exatamente a razão do interesse dos nipônicos por essa temática. Independente dessa curiosidade quase mórbida, a verdade é que a perturbada visão de realidade de Suehiro Maruo, com traços bastante competentes para retratar esse ''doce inferno'', cumprem a missão de chocar e trazer, no mínimo, um universo totalmente diferente do que qualquer um já presenciou em um ''gibi''. Recomendado para adultos e para quem tem estômago em dia.
Serviço - ''Ero-Guro'' tem o formato 16 x 23 cm, com 224 páginas e custa R$ 33.
Todas as publicações citadas acima podem ser encontradas em Curitiba na Itiban Comic Shop: Av. Silva Jardim, 845. Fone: (41) 3232-5367.
Música+Quadrinhos: Belle & Sebastian+Corto Maltese