A Deccor (Divisão Estadual de Combate à Corrupção) da PCPR (Polícia Civil do Paraná) ouviu nesta quarta-feira (15) três servidores da CMTU (Companhia Municipal de Trânsito e Urbanização) no âmbito do inquérito que apura uma dispensa de licitação suspeita de ter sido disputada por duas empresas de Curitiba que seriam de uma mesma família.
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O contrato previa a realização de uma auditoria nas planilhas do transporte coletivo de Londrina — um dos principais gargalos orçamentários identificados pela gestão Tiago Amaral (PSD). Uma empresa foi contratada por pouco mais de R$ 140 mil para fazer o trabalho, mas o sócio de uma concorrente teria vindo a Londrina para fazer o estudo.
A FOLHA mostrou que a CMTU decidiu rescindir o contrato com a empresa no começo de outubro, após as denúncias virem à tona. O MPPR (Ministério Público do Paraná), por meio da 26ª Promotoria de Justiça, também apura o caso.
Uma das pessoas ouvidas nesta quarta foi o diretor administrativo-financeiro da Companhia, Denilson Vieira Novaes, que comentou o caso após o depoimento.
“Houve uma denúncia e é papel da polícia investigar. O processo passa pela CMTU. A polícia está fazendo o papel dela, e nós estamos fazendo o nosso, que é fornecer todas as informações e colaborar com o processo. Temos todo o interesse de que isso seja esclarecido da melhor forma e o mais rápido possível”, disse na saída da delegacia.
O diretor da CMTU justificou a escolha pela dispensa de licitação em razão da urgência em realizar a auditoria dos custos do transporte. Com a rescisão contratual, outra empresa deverá ser contratada, ainda sem prazo definido. “A justificativa da urgência não passa pela Diretoria Administrativa. O pedido vem da Prefeitura, da Diretoria de Transporte. Cabe à Diretoria Administrativa tramitar todo o processo”, explicou.
Questionado se houve erro na contratação, Novaes disse que “é difícil avaliar”. “Depois que o problema está colocado, é fácil olhar para trás e perceber que poderia ter sido feito melhor. Aparentemente, o processo tramitou sem nenhum problema. O que levantou [suspeita] foi quando surgiu a denúncia de que a pessoa que estava aqui exercendo o trabalho era de outra empresa”, afirmou.
Ele ressaltou que, assim como houve pressa na contratação, a CMTU também “correu para corrigir o processo” com a rescisão contratual e devolução dos valores já pagos, cerca de R$ 28 mil. Novaes ponderou que não é possível auditar “no dia a dia” se há vínculo familiar entre empresas concorrentes, mas que cabe ao poder público averiguar as denúncias.
“Fazemos mais de 200 processos entre contratações, licitações e renovações. São muitos contratos. Imagine que em cada formação de preços eu tenho quatro, cinco orçamentos. Como vou auditar cada orçamento que chega? Na prática, não conseguimos fazer essa avaliação, a não ser que algo seja muito visível”, acrescentou.
Saída da CMTU
A FOLHA mostrou que Novaes, considerado uma peça-chave na CMTU, pediu demissão no final de setembro. A princípio, ele deixaria o cargo no dia 10 de outubro, mas deverá permanecer até o fim do mês, enquanto a Companhia busca um substituto. Segundo ele, a investigação não tem relação com o desligamento.
“A CMTU é um desafio muito grande e exige uma dedicação enorme. Saio por questões pessoais. Eu pretendia sair dia 10, mas fico até o final do mês. Na verdade, gostaria de sair quando isso estivesse resolvido. É importante que tudo esteja totalmente esclarecido para que eu saia com tranquilidade, sabendo que tudo foi feito da melhor maneira possível”, completou.
Investigação
O delegado Thiago Vicentini, da Deccor, explicou que a investigação começou após a PCPR receber uma denúncia anônima há cerca de duas semanas. O objetivo do inquérito é apurar uma possível fraude em licitação e contrato administrativo firmado com a CMTU.
“Essa notícia veio ao encontro do que a imprensa havia divulgado: que esse expediente teria envolvido duas empresas de um mesmo núcleo familiar”, disse o delegado, ao pontuar que, a princípio, a situação viola regras que devem permear qualquer procedimento licitatório.
Vicentini afirmou que já foram ouvidos três servidores da CMTU e uma pessoa que atestou capacidade técnica para uma das empresas envolvidas. Questionado sobre o teor dos depoimentos dos agentes públicos, o delegado destacou que um ponto em comum é a alegação de que a Companhia não teria capacidade técnica para analisar e identificar um eventual vínculo familiar entre as concorrentes.
Segundo o delegado, caso haja “prova inequívoca” de ato doloso, os envolvidos podem responder pelo crime de fraude em processo licitatório ou contrato da administração pública, previsto no artigo 337-L do Código Penal.
“Encaramos todos como testemunhas ou suspeitos. Os representantes das empresas, consequentemente, são suspeitos, mas não podemos atribuir nenhum indicativo criminal a eles até que se tenha o mínimo de prova de autoria”, concluiu.
O inquérito tem prazo de 30 dias para ser concluído, com possibilidade de prorrogação por igual período. A Deccor já recebeu e analisa os documentos referentes ao processo de contratação, e a expectativa é que mais pessoas sejam ouvidas ao longo da investigação.