Os momentos de tensão durante a invasão do Congresso Nacional em 8 de janeiro tiveram conversas por telefone em meio a bombas de gás lacrimogêneo, ligações frustradas para a cúpula do Governo do Distrito Federal e voz de prisão no plenário do Senado.
Mesmo avisado minutos antes de que o Senado tinha sido invadido, o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), só entendeu a dimensão do que estava acontecendo quando recebeu uma ligação direto do Salão Azul.
"Eu liguei e falei: presidente, invadiram o Senado", conta o diretor-adjunto da Polícia Legislativa, Gilvan Xavier, que estava do outro lado da linha. "Eles estão quebrando tudo. Ele falou: Gilvan, toma conta do seu efetivo, cuidado. E faça o que você puder."
Leia mais:
Bolsonaro fala em 'fato isolado' e diz que explosões em Brasília devem levar a reflexão
Novo Código de Obras é debatido em audiência pública na Câmara
Deputados federais de Londrina não assinam PEC e questionam fim da escala 6x1 para trabalhadores
PEC 6x1 ainda não foi debatida no núcleo do governo, afirma ministro
O barulho de bombas e vidros estilhaçados também marcou a conversa entre Gilvan e o vice-presidente do Senado, Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB).
"Eu me recordo muito vivamente do desespero de Gilvan porque ele desligou o telefone gritando: senador Depois ouvi um barulho ensurdecedor", disse o senador à reportagem.
Os sinais de que alguma coisa poderia sair de ordem vinham desde a véspera. Pacheco, que estava de férias na França, chegou a mandar uma mensagem para o governador do DF, Ibaneis Rocha (MDB), diante da ameaça de invasão ao Congresso.
Sem que a resposta do governador a Pacheco conseguisse convencer a Polícia do Senado, Veneziano relata que voltou a tentar falar com Ibaneis no dia 8 pela manhã.
Após novo insucesso, o senador ligou para o secretário estadual da Casa Civil, Gustavo Rocha, e ouviu dele que o esquema de segurança havia sido deixado por Anderson Torres.
A mensagem foi tão tranquilizadora, segundo Veneziano, que ele foi para uma praia de João Pessoa com a família. Coube ao filho do vice-presidente do Senado mostrar, pelo celular, as primeiras notícias do que acontecia em Brasília.
"Ele disse: pai, olha o que está acontecendo", relata. "A partir dali, efetivamente, eu conversei com o ministro Flávio Dino (Justiça), com uma diversidade de companheiros e de pessoas que estavam, direta ou indiretamente, envoltos aos episódios."
Apesar das ameaças que vinham desde a véspera, a Polícia Legislativa disparou o alerta vermelho no dia 8 quando os vândalos romperam a barreira que tinha sido montada a cerca de 2 km do Congresso.
Policiais do Senado foram acionados às pressas para reforçar a segurança da instituição e tentar conter a horda que caminhava pela Esplanada dos Ministérios com sinais de confronto. Além do ânimo exaltado dos golpistas e dos indícios de planejamento, também chamava atenção a inércia da Polícia Militar.
"A Polícia Militar é parceira nossa. A gente sempre teve um bom contato, mas no dia, aqui no Senado, quem agiu foi a Polícia do Senado", relata Gilvan.
"O pessoal que estava do lado de fora [do Congresso] tacava água para quem estava dentro porque a água serve de inibidor dos agentes químicos. A gente via que tinha uma organização. Eles sabiam onde era a chave geral de luz e desligaram. A meu ver, tudo isso já foi premeditado", conta.
Após o decreto de intervenção federal na segurança de Brasília, boa parte dos vândalos fugiu ou voltou ao acampamento em frente ao quartel-general do Exército. Com a situação sob controle, Gilvan foi responsável por dar voz de prisão ao grupo que ficou dentro do plenário do Senado.
"No momento em que chegaram vários policiais treinados, aptos a fazerem aquilo que estavam fazendo, que era lançar granada, bomba de efeito moral, eu vi que dava para a gente controlar o pessoal", afirma.
"Quando eu entrei no plenário, já vi coisas quebradas. Aí eu falei: aqui está todo mundo preso, não tem para onde correr. Na mesma hora passei [uma mensagem de] rádio, pedi um apoio e encaminhei todo mundo para a delegacia", completa ele sobre os 39 presos.
Enquanto os Três Poderes eram invadidos, Pacheco afirma ter conversado com a então presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Rosa Weber, e afastado a possibilidade de pedir às demais autoridades uma ação de GLO (Garantia da Lei e da Ordem).
"[Tivemos] um diálogo a respeito da possibilidade de pedido de GLO ou não. Para ambos, o entendimento foi de que talvez fosse isso o que os criminosos que fizeram no dia 8 de janeiro pretendiam: a colocação das Forças Armadas em campo para poder ter uma perspectiva de uma ruptura de democracia", afirma.
"Foram vários momentos tensos, desde a notícia de que os prédios estavam sendo invadidos nas conversas que eu tive com a Polícia Legislativa até o diálogo com os próprios ministros, outros senadores. Todo mundo muito preocupado, então foi um momento de tensão perene, permanente."