Em meio à tramitação do projeto de lei que proíbe o casamento de pessoas do mesmo sexo, participantes o 20º Seminário LGBTQIA+ do Congresso Nacional criticaram, na terça-feira (19), a iniciativa em discussão pelos deputados. No momento da realização do seminário, a Comissão de de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família da Câmara dos Deputados se reunia para a votação do PL 5167/09, que foi adiada para a semana que vem, depois de horas de discussão entre apoiadores e críticos da medida.
Segundo Bruna Benevides, secretária da Articulação Política da Associação Nacional de Travestis e Transexuais, a tentativa de votar o projeto no mesmo dia e hora do seminário foi uma tentativa de enfraquecer a articulação do movimento LGBTQIA+. “Essas armadilhas querem nos desviar do nosso objetivo, que é avançar, e a gente está avançando e vai avançar cada vez mais”, opinou. Benevides observou que, caso o projeto de lei seja aprovado pelo Congresso Nacional, será barrado pelo STF (Supremo Tribunal Federal), por ser inconstitucional.
“Se hoje não há a menor possibilidade de eles impedirem efetivamente o casamento, ou negarem o acesso à retificação de nome e gênero ou a garantia do acesso à saúde para a juventude e as crianças, todos direitos que nós conquistamos, é porque nós, enquanto movimento, conseguimos pautar essas conquistas de forma sólida”, afirmou.
Garantia constitucional
Em 2011, o STF equiparou as relações de pessoas do mesmo sexo às uniões estáveis de homens e mulheres, reconhecendo, portanto, a união homoafetiva como núcleo familiar. A decisão foi tomada no julgamento da ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) 4277 e da ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) 132.
Além disso, o STF entendeu que não há na constituição um conceito fechado ou reducionista de família, nem qualquer formalidade exigida para que ela seja considerada como tal. Em 2013, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) determinou que todos os cartórios do país realizassem casamentos homoafetivos.
Já o PL (projeto de lei) 5167/09 pretende incluir no artigo 1.521 do Código Civil o seguinte trecho: “Nos termos constitucionais, nenhuma relação entre pessoas do mesmo sexo pode equiparar-se ao casamento ou a entidade familiar.” Atualmente, o artigo 1.521 enumera os casos em que o casamento não é permitido, como nos casos de união entre pais e filhos ou entre pessoas já casadas.
Na justificativa, o relator do texto, deputado federal Pastor Eurico (PL-PE), afirmou que o casamento “representa uma realidade objetiva e atemporal, que tem como ponto de partida e finalidade a procriação, o que exclui a união entre pessoas do mesmo sexo”.
Direitos ameaçados
Representante da Liga Brasileira de Lésbicas, Léo Ribas, que participou do seminário, pontuou que milhares de pessoas LGBTQIA+ e filhos perderão a segurança jurídica de viver como famílias se o projeto de lei seguir adiante. “Retirar o direito ao casamento igualitário diz muito sobre um projeto reacionário e fascista, porque retira também o nosso direito de inserção na sociedade, como casais que compartilham toda uma vida”, declarou. Na visão de Ribas, o Parlamento deveria, na direção oposta, estar atuando para proteger esse segmento da população, já que o Brasil continua a ser o país que mais mata pessoas LGBTQIA+.
Para Symmy Larrat, secretária nacional de Promoção e Defesa dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+ do Ministério de Direitos Humanos e da Cidadania, a tentativa de votar esse projeto é uma uma forma de parlamentares conservadores obterem holofotes para um movimento que cultiva o ódio às pessoas LGBTQIA+. Na avaliação de Larrat, é necessário planejamento estratégico para enfrentar esses discursos de ódio e conseguir implementar políticas públicas para esse segmento da população.
Larrat pontuou ainda que neste ano haverá o maior orçamento da história para as pessoas LGBTQIA+, apesar de insuficiente para as políticas públicas necessárias para garantir a vida e os direitos dessa comunidade.
Nesta edição, o seminário, que prossegue nesta quarta-feira (20), homenageia o ex-deputado David Miranda, que se destacou na luta por liberdade de expressão e pelos direitos LGBTQIA+. Ele morreu em maio, depois de nove meses internado para tratamento de infecção gastrointestinal.
O seminário é promovido pelas comissões de Amazônia e dos Povos Originários e Tradicionais; de Defesa dos Direitos da Mulher; de Direitos Humanos, Minorias e Igualdade Racial; de Educação; e de Saúde. O evento prossegue nesta quarta-feira.
*Com informações da Agência Câmara de Notícias