Política

Advogado confunde 'O Pequeno Príncipe' com 'O Príncipe' em julgamento no STF

15 set 2023 às 19:06

Um príncipe veio ao mundo há 80 anos graças à imaginação de um francês. O outro é bem mais antigo, passou a ser conhecido em meados do século 16 como resultado das reflexões de um italiano.


Confundir o garoto criado pelo romancista e aviador Antoine de Saint-Exupéry em "O Pequeno Príncipe" com o monarca astucioso concebido pelo diplomata e conselheiro político Nicolau Maquiavel em "O Príncipe" durante um dos julgamentos mais aguardados do STF (Supremo Tribunal Federal) neste ano só poderia virar piada - e virou.


Na quinta (14), durante a defesa de Thiago de Assis Mathar, um dos réus condenados pelos ataques golpistas de 8 de janeiro, Hery Kattwinkel soltou a pérola: "Como diz 'O Pequeno Príncipe', os fins justificam os meios".


Numa só frase, duas gafes constrangedoras para um advogado - ainda mais durante uma fala na mais alta corte do país. O vídeo com esse trecho do julgamento virou febre nas redes sociais, dando origem, claro, a memes.


Para começo de conversa, são dois livros em quase tudo distantes um do outro. Quatro séculos os separam; os autores são de países e formações diferentes; e têm temáticas, estilos e públicos-alvo muito distintos entre si. Aproximam-se apenas no status de clássicos e, por óbvio, na palavra "príncipe" levada aos títulos.



O PEQUENO PRÍNCIPE


Direcionado ao público infantil, "O Pequeno Príncipe" parte de uma pane em um avião, que cai no deserto do Saara. Ao acordar depois do acidente, o piloto - que narra a história - encontra um menino, que vive no asteroide B-612. Na conversa entre eles, o garoto se lembra da rosa, sob seus cuidados, e da raposa, sua melhor amiga.


O livro ganhou fama de excessivamente sentimental, muito por conta das recorrentes citações nos discursos das misses. E, claro, das frases que pipocam nas redes sociais.


O PRÍNCIPE


Em "O Príncipe", Maquiavel mostra como a sagacidade, a ambição e até outros sentimentos menos nobres devem ser manejados por quem está no comando de um Estado e deseja permanecer nessa condição.


"Maquiavel trata muito bem dos instrumentos para chegar ao poder e para mantê-lo", disse o filósofo Renato Janine Ribeiro à Folha de S.Paulo por ocasião do lançamento do seu livro "Maquiavel, a Democracia e o Brasil" no ano passado.


O pensador italiano é autor de outras obras relevantes, como "A Arte da Guerra" e "História de Florença", mas é considerado o pai da ciência política moderna graças, sobretudo, a "O Príncipe".


OUTRA GAFE


Houve ainda outra gafe. Ainda que tivesse acertado o "príncipe", o advogado teria errado a citação. O autor florentino nunca escreveu que "os fins justificam os meios". Em "Discursos", Maquiavel se aproxima dessa ideia, mas não a enuncia exatamente dessa forma. No capítulo nove do primeiro livro, diz: "Cumpre que, se o fato o acusa, o efeito o escuse". E segue: "quando o efeito for bom, como o de Rômulo [da história lendária da função de Roma], sempre o escusará".


"Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas", disse a raposa ao pequeno príncipe. Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que dizes, aprendeu o advogado Kattwinkel.


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