A liminar dada pelo ministro Cristiano Zanin, do STF (Supremo Tribunal Federal), suspendendo a desoneração da folha de pagamento deve ter impacto nos 17 setores já em 20 de maio, quando ocorre o próximo recolhimento da contribuição patronal.
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A medida, tomada na última semana, suspendeu trechos da lei que prorrogou a desoneração da folha de empresas e prefeituras.
Já são cinco votos para manter a liminar. Além de Zanin, votaram pela manutenção Gilmar Mendes, Flávio Dino, Luís Roberto Barroso e Edson Fachin.
O julgamento da ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) foi paralisado após o pedido de vista (mais tempo para análise) do ministro Luiz Fux. O pedido de vista, no entanto, não afeta a liminar, ou seja: a desoneração da folha permanece suspensa. Fux tem até 90 dias para devolver o caso ao plenário.
O Senado acionou o STF na sexta-feira (26) contra a decisão liminar.
Segundo advogados especializados no tema, as empresas têm poucas opções agora, antes de fazer o recolhimento referente ao mês de abril: elas podem recolher o valor cheio em maio e depois solicitar a sua devolução, caso a desoneração volte a valer, ou ainda depositar o valor em juízo.
O não recolhimento poderia acarretar em uma autuação da Receita em caso de fiscalização.
Quando o ministro pede vista, a decisão que está parada continua tendo efeito, ela prevalece até alcançados os votos ou que haja um pedido de destaque, diz Marcello Pedroso Pereira, sócio da área Tributária, especialista em Contribuições Previdenciárias do Demarest.
"Uma outra coisa que as empresas poderiam fazer, nesse meio-tempo, sem contrariar diretamente a liminar, é pedir em ações próprias ou coletivas que a Justiça confira a elas o direito de permanecer na sistemática de recolhimento anterior até que haja uma decisão final."
Ele complementa que o governo não pode mudar as regras no meio do jogo. "As empresas se planejaram a partir de uma lei dizendo que elas podem recolher daquela forma e se tudo muda no meio do ano, isso as atrapalha completamente."
Para André Félix Ricotta de Oliveira, doutor e mestre em direto tributário pela PUC-SP, a mudança nas regras agora não estava no radar dos setores. "O Supremo colocou as empresas em um beco sem saída, não há muitas opções."
Oliveira, que é presidente da Comissão de Direito Tributário e Constitucional da OAB-SP (subseção Pinheiros), reforça que a liminar gera um grau de insegurança para as empresas. "Os contribuintes não sabem mais o que vai estar valendo dentro de três semanas."
Segundo Pedro Rezek, advogado tributário Consultivo da Dessimoni & Blanco Advogados, dada a situação de insegurança, é possível que o próprio ministro da Fazenda, Fernando Haddad, renegocie com o Congresso uma agenda para o fim da desoneração.
Ele diz, no entanto, que faltou tato e consideração com o contribuinte. "Faltou pensar na previsibilidade. As empresas já têm de se preocupar com diversas mudanças, como a reforma tributária, e agora também foi colocada essa questão da desoneração."
A desoneração da folha foi criada em 2011, na gestão Dilma Rousseff (PT), e prorrogada sucessivas vezes.
A medida permite o pagamento de alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta, em vez de 20% sobre a folha de salários para a Previdência.
A desoneração vale para 17 setores da economia. Entre eles está o de comunicação.
Também são contemplados os segmentos de calçados, call center, confecção e vestuário, construção civil, entre outros.
A prorrogação do benefício até o fim de 2027 foi aprovada pelo Congresso no ano passado e o benefício f oi estendido às prefeituras, mas o texto foi integralmente vetado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Em dezembro, o Legislativo decidiu derrubar o veto.
Há controvérsia entre os especialistas se a medida deveria respeitar a chamada noventena, que determina que os entes cobrem o tributo somente depois de decorridos 90 dias da publicação da lei que o instituiu ou aumentou.
"A noventena vale quando se cria um novo tributo, e acho que se aplica a este caso, por ser algo que existe desde 2011. Faria sentido dar pelo menos os 90 dias para que as empresas consigam se planejar um pouco mais", diz Pedroso.
Já Rezek avalia que o princípio não se aplicaria neste caso, por se tratar de um tributo cuja desoneração foi julgada inconstitucional pelo STF, "não se tratando de criação de um novo tributo através de lei".
Na última semana, as entidades afetadas pela medida reagiram à liminar com reprovação.
Uma nota conjunta assinada por representantes dos 17 setores destaca que eles empregam 9,3 milhões de profissionais, e que foram criados 151 mil empregos nos dois primeiros meses de 2024.
"Além disso, o salário médio nestes setores é 12,7% superior aos setores que não contam com essa desoneração tributária", escreveram.