Certamente, a humorista Evelyn Mayer, de 40 anos, já passou pela sua timeline alguma vez nos últimos meses. Com piadas ácidas e certeiras, a comediante da Zona Norte de Londrina faz cada vez mais sucesso nas redes sociais e se tornou viral no Instagram, onde conseguiu cerca de 120 mil seguidores em menos de um ano. Ela, que é doutora em Língua Portuguesa, decidiu "abandonar" as salas de aula e a vida em Londrina para alçar voo por meio do stand-up na capital paulista. A manobra - arriscada - foi concluída com sucesso e lhe rendeu uma aterrissagem em um terreno que hoje ela domina com maestria.
A carreira de Mayer no humor começou há 6 anos e meio. Ainda cursando o mestrado, ela viu em um anúncio no Facebook a oportunidade de contar as "histórias engraçadas" de sua vida. Começava ali, em 2018, o início do êxito da londrinense no stand-up.
"Vi uma postagem falando que haveria um show local. Estava escrito no flyer assim: 'se você tem uma história engraçada e quer contar, mande para a gente'. Eu mandei por e-mail a história do dia que eu fui com o meu filho ao mercado e, no caixa, ele pegou um pacote de camisinha [preservativo] e começou a gritar, dizendo que queria levar o chocolate a qualquer custo. Foi um vexame, mas o pessoal me chamou para contar essa história no palco", relembra.
Desde então, o talento da comediante foi sendo lapidado dia após dia até Londrina se tornar pequena para os seus sonhos. Há pouco mais de um ano, em 3 de janeiro de 2024, Mayer decidiu sair da sua cidade natal para se aventurar em São Paulo. Os shows, contados a dedo no município do interior do Paraná, foram multiplicados na maior megalópole da América Latina.
"Apesar de Londrina ter um espaço muito legal, eu não conseguia desenvolver mais como gostaria. Queria ter mais oportunidades e shows para fazer, e São Paulo é meio que a Meca do stand-up. Lá tem muitas oportunidades. Aqui [em São Paulo], a quantidade de shows que faço em uma semana eu fazia no mês inteiro em Londrina."
O município onde Mayer nasceu, no entanto, ainda tem espaço em seu microfone. Um dos seus sucessos mais recentes veio de um trecho em que ela fala sobre as peculiaridades de Londrina, seja por meio de notícias alarmantes que se tornaram assunto nacional ou dos estigmas políticos que também são uma vasta fonte de inspiração.
"Eu tenho um vídeo que vai bater 6 milhões de visualizações. Só neste mês, dois vídeos meus com piadas de Londrina bateram 1 milhão de visualizações cada um. Eu fiquei muito feliz, porque é um tema extremamente nichado e isso foi sensacional para mim", comemora Mayer.
Carreira como professora
Ser professora não era o sonho de infância da londrinense, mas a chegada da vida adulta desviou os planos dela por alguns anos. Ela relembra que desde criança tinha o sonho de ser artista, o que só pôde realizar por meio do atual trabalho.
"Eu era a criança que fazia todos os teatros da igreja, todos os teatros da escola. Eu tinha certeza que seria artista, mas eu jamais me imaginei humorista. Quando cheguei à fase adulta, a realidade deu as caras e eu fui fazer faculdade, me formei em Letras, fui casar, ter filho, fui seguir a minha vida e esqueci totalmente desse lado artístico."
A carreira como professora, segundo ela, agora é coisa do passado. Mesmo alcançando tão alto nível de graduação, ela garante que pretende seguir a carreira tão almejada desde a infância.
"Eu não pretendo voltar a ser professora. Não é porque não dê para conciliar, porque de fato não dá, é que são duas carreiras que exigem muito. Sinto que encerrei o meu ciclo como professora. Fui muito feliz como professora, amava a sala de aula. Tenho uma relação incrível com os meus ex-alunos até hoje. Eles me seguem, vão aos meus shows, mas eu não tenho mais interesse em ser professora", conta.
Mayer ainda não se acostumou com a fama e com reconhecimento de fãs nas ruas. "Eu ainda estou aprendendo. Quando vim para São Paulo, achei que ia levar mais ou menos uns três anos para isso acontecer, mas foi coisa de meses. É muito louco você estar em uma cidade com 14 milhões de habitantes e entrar no ônibus, no shopping e ser reconhecido. Eu acho bizarro."
Humor como ato político
Abordando temas complexos e satirizando pessoas "poderosas", a humorista reflete que a sua maneira de trabalhar é, além de tudo, um dever cívico. Ela ressalta que muitas pessoas ainda não assimilam o fato de uma mulher poder ser engraçada e fazer piada sobre qualquer tema.
"Só o fato de uma mulher fazer stand-up já é político. Se for para ter medo, tenho que ter medo de subir no palco e contar piada. Eu sou de um tempo em que era um dever cívico fazer piadas sobre políticos. Hoje estamos vivendo uma dicotomia na política, então, se você fala de um político você necessariamente não pode falar do outro. Mas eu sou do Brasil Casseta e Planeta, eu tenho que fazer piadas com político", afirma.
Limites no humor
As piadas agressivas contra minorias que viraram fórmula para grandes humoristas do país não têm espaço nos shows de stand-up da londrinense. Ela pontua que o seu foco enquanto artista é incomodar aqueles que poucas vezes são lembrados.
"Os meus alvos são as pessoas de poder na sociedade, por isso que eu digo que é um dever cívico fazer piada com políticos e com homens, porque eles são o poder na sociedade. Esse debate deve ser feito sempre com a razão e não com a emoção, porque é dever do humorista esticar alguns limites. Fazer piada com quem apanha é fácil, porque já apanham, e isso não é o meu foco."
No entanto, ela também elucida que o debate sobre com quem fazer piada não pode ser analisado em uma única perspectiva, já que as minorias também têm senso de humor e querem se ver incluídas nos shows.
"A gente precisa entender que essas pessoas também têm senso de humor. Aqui em São Paulo nós temos uma cadeirante que se chama Mel Risotino. Ela é maravilhosa, é cadeirante, tem hidrocefalia e é humorista. Nós já fizemos piadas juntas. Certa vez, ela me chamou e eu falei 'uma salva de palmas para o Hot Wheels da comédia'. Naquele ambiente ficou engraçado. Nós fizemos um corte e colocamos na internet e todo mundo gostou", relembra.
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