A Belagrícola protocolou, na madrugada desta quinta-feira (11), um pedido de recuperação extrajudicial, um dia após o fim do prazo de 60 dias de suspensão de pagamentos obtido em decisão anterior da Justiça. O processo volta à análise do juiz Emil Tomas Gonçalves, da 11ª Vara Cível e Empresarial de Londrina, que agora avaliará se concede nova suspensão por 90 dias, período solicitado pela empresa para avançar nas negociações com credores.
A empresa, fundada em 1985 em Bela Vista do Paraíso como revenda de produtos agrícolas, cresceu e se tornou um dos maiores distribuidores de insumo agrícolas e comercializadores de grãos do Brasil. Em 2017, o controle acionário doi adquirido pelo grupo chinês Pendgu e, atualmente, tem 52 pontos de revenda e 58 unidades de recebimento, padronização e armazenagem, com capacidade de estocagem de mais de 1 milhão de toneladas.
Em outubro deste ano, a Belagrícola conseguiu a liminar na Justiça de Londrina para negociar uma dívida total estimada em R$ 3,8 bilhões. O pedido feito nesta quinta, entretanto, foca apenas na renegociação de parte das dívidas com credores quirografários. Esse grupo inclui os produtores rurais afetados na safra 2024/25 e soma R$ 2,2 bilhões em créditos sem garantia. O pedido foi feito extrajudicialmente justamente por ser direcionado a um grupo específico, e não a todos os credores
Em comunicado à imprensa, a empresa afirma que passa por seu “maior nível de inadimplência já registrado” e justifica o fato devido ao “ciclo excepcionalmente adverso vivido pelo agronegócio brasileiro, com quebras de safra, eventos climáticos extremos, juros elevados, retração de crédito e pendências
financeiras generalizadas”.
A Belagrícola afirma que a recuperação extrajudicial solicitada pretende “organizar de maneira estruturada e transparente as renegociações com credores, incluindo produtores rurais, financiadores e demais parceiros comerciais”. A medida não atinge funcionários ou unidades operacionais.
Para que o pedido seja processado, a legislação exige adesão prévia de pelo menos 33,33% dos créditos sujeitos. Segundo a empresa informou nos autos, esse patamar já foi alcançado: 35% do passivo teria aderido à proposta. Entre os credores que manifestaram apoio estão Província de Securitização (R$ 230,5 milhões), Basf (R$ 175,5 milhões), Santander (R$ 108,9 milhões), Citibank (R$ 72,1 milhões), Syngenta (R$ 40,3 milhões) e outras fornecedoras e instituições financeiras.
Se o juiz homologar o processamento, a Belagrícola terá mais 90 dias para ampliar esse apoio em ao menos 15 pontos percentuais. Ao alcançar 50% de adesão mais um, o plano poderá ser estendido aos demais credores, mesmo os que discordarem. Caso não consiga atingir esse percentual, a empresa poderá recorrer à recuperação judicial, mas, neste caso, terá de renegociar as dívidas com todos os seus credores.
Propostas de pagamentos
O plano proposto estabelece condições bastante distintas para produtores que aceitarem ou rejeitarem a negociação.
Os apoiadores terão direito ao pagamento integral dos créditos, sem deságio, corrigidos pelo IPCA e distribuídos em cinco parcelas semestrais. A primeira parcela será paga em maio ou outubro seguinte à homologação. Para isso, os produtores precisarão cumprir duas contrapartidas até a quitação total. A primeira é entregar ou originar grãos à Belagrícola equivalentes a 50% do volume negociado na safra 2024/25. A segunda exigência é comprar insumos da empresa também em 50% do volume adquirido na última safra.
Já os dissidentes, que optarem por não aderir, enfrentam condições mais duras: receberão apenas 25% do crédito, com deságio de 75%, início dos pagamentos somente sete anos após a homologação, também em cinco parcelas semestrais.
Representante de vários fornecedores de grãos da Belagrícola e do Sindicato Patronal Rural de Londrina, o advogado Raphael Condado considera que a proposta é ruim para os produtores porque atrela o produtor rural a uma confiança que já foi quebrada. “Principalmente para os que não aceitarem a proposta, que serão os mais penalizados, e devem ser a maioria. É muito difícil confiar em quem não paga ninguém”, avalia.
Ainda na visão do advogado, o que a empresa fez ao conseguir a cautelar em outubro e o que está fazendo agora é repassar os riscos do próprio negócio para o seus fornecedores.
Condado explica que o produtor rural tem, na prática, dois momentos de renda ao ano: na safra de soja, que é paga em maio, e a safrinha, que é paga em outubro. “Como teve gente que não recebeu pela safrinha, não conseguiu plantar e não terá sua renda no primeiro semestre do ano que vem”, afirma.
O advogado sugere que os fornecedores se unam e tentem negociar condições melhores do que as propostas no plano de recuperação extrajudicial. "Esta situação é um impacto de confiança que vai ecoar por muito tempo no agronegócio."