Dez anos de salário, mensalidade da educação dos filhos e plano de saúde foi o pacote oferecido pela Americanas aos dois executivos que fizeram delação no caso do escândalo da varejista, Flávia Carneiro e Marcelo Nunes. O acordo também incluiu o pagamento dos honorários do advogado de ambos.
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Conforme a Folha de S.Paulo revelou, o benefício foi mantido em sigilo pela empresa, sem divulgação da ata da reunião do conselho de administração que aprovou o pagamento. Os valores começam a ser questionados pela defesa de ex-diretores investigados, com pedidos na Justiça para a publicação de detalhes do acordo.
Celso Vilardi, advogado do conselho de administração e também da empresa, disse à reportagem que o fato "não foi divulgado porque, nos termos da lei, qualquer colaboração deve permanecer sigilosa até determinação em contrário do Ministério Público Federal e o nome dos possíveis colaboradores não poderia ser revelado, sendo certo que as delações só foram conhecidas por ocasião da operação efetivada pela Polícia Federal".
Procurada pela reportagem, a Americanas não revela o valor da remuneração anual bruta que foi usado como parâmetro para o acordo. Segundo pessoas que acompanharam o processo, o salário anual fixo de Nunes antes a rescisão do contrato de trabalho girava em torno de R$ 1 milhão, fora o bônus.
Os valores pagos aos delatores são depositados mensalmente. O pacote de benefícios abrange a mensalidade de instituições de ensino do mesmo padrão frequentado por seus filhos antes da rescisão do contrato, incluindo ensino superior, além da manutenção do plano de saúde estendido para filhos e cônjuges.
De acordo com o advogado da varejista, a decisão de firmar o acordo com os delatores "foi tomada com base em inúmeros casos do passado aprovados por empresas de grande porte e, também, porque era necessário reconstituir o balanço da companhia, sem o que a própria sobrevivência dela poderia estar em risco".
Formalmente chamado de PIC (Programa de Incentivo à Colaboração), esse tipo de acordo é tratado como uma indenização ao delator. O modelo ficou mais conhecido no Brasil a partir da Lava Jato, sendo apelidado de bolsa delação ou salário pós-delação.
A prática gerou polêmica desde as primeiras experiências e foi criticada, na época, por acionistas e por defesas, como a do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que questionava a credibilidade desses depoimentos de ex-executivos que recebiam repasses milionários.
Uma das empresas que fez uso do PIC foi a CCR em 2019, que aprovou um pacote de indenizações para 15 executivos que cooperaram com as investigações, no valor total de R$ 71 milhões. Na ocasião, no entanto, a concessionária havia firmado também acordos de leniência com promotores de São Paulo e com a força-tarefa da Procuradoria da República no Paraná, em que reconheceu ter pago propina para alcançar vantagens em seus negócios e se comprometeu a colaborar com as investigações. No caso da Americanas, por sua vez, não houve acordo de leniência.
A questão do pagamento de delatores por empresas chegou a ser levada a discussão em um órgão da Procuradoria-Geral da República na época, sem deliberações. Segundo o MPF, "a 5ª Câmara de Combate à Corrupção informa que não existe nenhum normativo sobre o tema".
Procurada pela reportagem, a assessoria de imprensa da Americanas não quis comentar o caso. O advogado dos delatores, Davi Tangerino, também não se manifestou.