Visitar ruínas de uma igreja do século 16 do Guarujá, conhecer o forte São João, em Bertioga, e deitar na cama do padre José de Anchieta, um conjunto de pedras em que ele descansava, em Peruíbe. Esses lugares datam da época em que os padres jesuítas vieram para catequizar os índios, pouco depois do descobrimento do Brasil, e agora podem ser conhecidos em um único roteiro de peregrinação. Por meio do programa "Passos dos Jesuítas-Anchieta", lançado no último dia 14 pela Secretaria Estadual de Turismo de São Paulo, é possível percorrer a pé ou de bicicleta todo o litoral paulista e visitar locais por onde os jesuítas passaram.
O percurso completo do passeio tem cerca de 340 quilômetros. Começa em Peruíbe, no litoral sul, e acaba em Ubatuba, no litoral norte, e passa, também, por Itanhaém, Mongaguá, Praia Grande, São Vicente, Cubatão, Santos, Guarujá, Bertioga, São Sebastião, Ilhabela e Caraguatatuba. Ninguém é obrigado a fazer todo a extensão. A turma inaugural, de 25 pessoas, partiu de Peruíbe no último dia 14 e chegou no dia 20 a Bertioga. Eles percorreram 140 quilômetros neste trecho, uma média de 23 km por dia de caminhada. O trecho entre Bertioga a Ubatuba deverá ser aberto até novembro.
Ruínas do abarebebê, ficam em Peruíbe
Em Peruíbe, no litoral sul, começa a viagem pelo Brasil colônia. A cidade ainda guarda as ruínas da Igreja de São João Batista, também conhecidas como ruínas do Abarebebê. Na linguagem dos índios peroibe, abarebebê significa "padre voador". Foi o apelido que eles deram ao padre Leonardo Nunes, jesuíta enviado à cidade. Itanhaém também tem preciosidades. Entre as praias da Gruta e do Sonho há uma formação rochosa conhecida por "cama do Anchieta". Era lá que o padre descansava quando não se dedicava à alfabetização de índios.
Mongaguá era utilizada como ponto de descanso nos percursos percorridos por jesuítas. O Guarujá ainda conserva as ruínas da Ermida Guaibê. Nesta pequena igreja, que fica no caminho para a Prainha Branca, o padre José de Anchieta fazia suas orações. A história dos jesuítas continua no caminho para o litoral norte. No Forte São João, em Bertioga, os jesuítas Manoel da Nóbrega e José de Anchieta descansaram por diversos dias, em 1554, antes de viajar para Ubatuba e negociar a paz com a confederação dos índios Tamoios.
Ubatuba no trecho final da viagem também tem suas referências à época dos jesuítas. Foi lá, por exemplo, que o padre José de Anchieta escreveu o Poema à Virgem na praia de Iperoig quando se entregou como prisioneiro dos índios durante as negociações de paz entre tamoios e colonizadores. A "Paz de Iperoig", como o acordo ficou conhecido, encerrou a guerra entre portugueses e índios.
Todo o percurso, segundo a secretaria estadual de Turismo, é indicado por placas e avisos. Há trilhas alternativas que permitem aos peregrinos também desfrutar das belezas naturais das cidades e conhecer de perto a fauna e a flora da Mata Atlântica. Dá até para "escapar" da caminhada diária para colocar os pés na areia ou mergulhar no mar.
Quando se inscreve e faz cadastro no site www.caminhasaopaulo.com.br, o peregrino imprime um código de barras, que deve ser trocado por um cartão magnético em quatro postos durante a viagem, localizados em Peruíbe, Mongaguá, São Vicente e Santos. Este cartão garante descontos em hotéis e pousadas das cidades que estão na rota dos jesuítas. Ao aproximá-lo de cada um dos 22 totens eletrônicos distribuídos no caminho, o peregrino registra sua passagem por um trecho da rota. Seus parentes e amigos poderão acompanhar o caminho do peregrino no site.
Antiga igreja, em que Anchieta rezava
Depois de registrar sua passagem por pelo menos 12 das 22 centrais eletrônicas do caminho, o peregrino ganha um certificado de participação. Cada pessoa tem um ano para preencher pelo menos 12 trajetos. Também é possível utilizar o portal Caminha São Paulo para colocar suas fotos, relatos e surpresas de viagem. Quem percorrer os 340 quilômetros do percurso vai concorrer a uma viagem para Santiago de Compostela, na Espanha, uma das principais rotas de peregrinos do mundo.
"Eu não conhecia a cama do Anchieta, nunca tinha ouvido falar no Poço das Antas (outro ponto turístico da região). Esse projeto é uma chance de resgatar a nossa história e valorizar a saga dos jesuítas", afirma o consultor técnico do projeto, José Palma. Ele calcula que em um ano dez mil pessoas devem participar do passeio. O governo estadual pretende ampliar o projeto e criar mais sete rotas. Outras três de jesuítas e quatro, no interior do estado, feitas pelos bandeirantes.