Damasco, capital da Síria, é considerada uma das cidades constantemente habitadas mais antigas do mundo. Existem evidências arqueológicas de ocupação a partir do quarto milênio a.C., segundo informações da Enciclopédia Britânica. Durante esses milhares de anos de história, várias civilizações se estabeleceram por aqui, desde os arameus, passando pelos romanos, bizantinos, árabes - que ocuparam a região no século 07 da Era Cristã -, otomanos, europeus e, por fim, os sírios atuais.
Todos esses povos, e outros, deixaram marcas de suas passagens que podem ser vistas até hoje. Muitos monumentos antigos não são apenas atrações turísticas, mas construções utilizadas cotidianamente pela população local. A Cidade Velha, centro histórico da capital, reúne boa parte desses marcos e, apesar do nome, é cheia de vida.
A Damasco antiga é demarcada pelas ruínas de muralhas construídas na época do Império Romano. A cidade tem sete portões de entrada, existentes até hoje, que dão acesso ao labirinto de vielas estreitas. É aquele tipo de lugar em que é fácil se perder, e onde dobrar a esquina pode revelar uma surpresa: um arco romano, uma igreja antiga, uma mesquita histórica ou um palácio otomano.
A Cidade Velha pulsa. Lá ficam os mercados, ou "souqs", mais tradicionais da capital, os mais charmosos restaurantes, cafés e hotéis, além de residências particulares. As casas, simples por fora, se revelam amplas no interior, muitas vezes incluindo belos pátios a céu aberto. A agitação é garantida tanto de dia, quanto de noite.
Um dos passeios mais populares para quem visita Damasco começa por entrar na Cidade Velha pelo Souq Al-Hamidiyeh, mercado coberto e amplo, repleto de lojas que vendem todos os tipos de mercadorias, como roupas, tecidos, jóias, artesanato e souvenires.
Não deixe de provar o tradicional sorvete de pistache vendido por lá, na verdade um sorvete de baunilha que o sorveteiro passa com as próprias mãos num recipiente cheio de pistache triturado. Outra iguaria servida nas ruas de Damasco é o faláfel enrolado em pão folha, com molho, tomates, picles e, se o cliente quiser, pimenta. Boa pedida para um lanche rápido.
Encontro de civilizações
O souq segue quase em linha reta até a o muro da Mesquita Umayyad, ou Omíada, construída no início do século 08 d.C. durante o califado dos Omíadas, quando Damasco era a capital do império árabe-muçulmano. A obra-prima arquitetônica é, em si, um resumo da história da cidade. Ela foi erguida onde originalmente havia um templo dos arameus, povo que falava o aramaico, dedicado ao deus Hadad, posteriormente transformado num templo de Júpiter pelos romanos.
Mesquita Umayyad, com o Minarete de Jesus ao fundo
No período bizantino, o local foi transformado na Igreja de São João Batista, antes da construção da mesquita, entre 705 e 715 d.C. Colunas e arcos romanos do templo de Júpiter ainda estão de pé no espaço que separa a saída do souq e a entrada da mesquita.
A imponente construção, que inclui um belo pátio interno, é local de adoração para cristãos, muçulmanos sunitas e xiitas. Dentro do amplo salão de orações há o túmulo de São João Batista que, segundo a tradição cristã, batizou Jesus. Lá, acredita-se, está sepultada a cabeça do santo, reverenciado pelos muçulmanos como o profeta Yahya. Em 2001, o Papa João Paulo II esteve por lá na primeira visita de um Papa a uma mesquita.
Túmulo de São João Batista
Na lateral oposta à entrada da mesquita, outra sala contém mais um relicário, onde supostamente está enterrada a cabeça da Hussein, filho de Ali e neto do profeta Maomé. É um local de adoração dos xiitas, por quem Hussein é considerado o terceiro imã e um mártir. Ponto de visitação de devotos iranianos, é possível ver pessoas bastante emocionadas em frente à pequena capela de metal.
A parte externa da mesquita que dá para o pátio é decorada com afrescos que representam cenas da natureza. É possível ver vários dos desenhos, embora muitos estejam apagados. Ela tem três minaretes, sendo que o mais alto deles é chamado de Minarete de Jesus, reverenciado pelos muçulmanos como profeta. De acordo com a tradição local, é ali que o Cristo vai aparecer no dia do Juízo Final.
Fora da mesquita, mas próximo aos seus muros, está o túmulo do herói árabe Saladin, que liderou os muçulmanos contra os Cruzados. Foi ele que retomou Jerusalém para os árabes e quem derrotou o exército do rei britânico, Ricardo Coração de Leão, na Terceira Cruzada.
Palácio Azem: exemplo de arquitetura damasquina
Nas proximidades da mesquita uma outra construção histórica chama a atenção. Trata-se do Palácio Azem, construído em meados do século 18 d.C. pelo então governador de Damasco, Asaad Pasha Al-Azem, e considerado um exemplo clássico da arquitetura local.
Em excelente estado de conservação, o palácio é hoje um museu, e seus cômodos, arrumados com manequins, móveis e utensílios, mostram como era a vida cotidiana na época, quando a Síria era parte do Império Otomano.
A Cidade Velha guarda outras atrações históricas como antigas hospedarias (khans), hoje ocupadas por lojas como apêndices dos souqs, banhos públicos, escolas (madrassas), além, é claro, de muitas mesquitas e igrejas.
Fora dos muros, entre as colinas
Madrassa otomana é hoje mercado de artesanato
Fora dos muros, Damasco é uma metrópole com mais de 1,6 milhão de habitantes e que está em crescimento. Nos limites da cidade existem bairros residenciais inteiramente novos ou ainda em construção. Ela é cercada por colinas, sendo que a mais famosa é o Monte Qassioun, local de encontro de casais de namorados. Do alto é possível ter uma bela vista da capital.
Mesmo em meio ao trânsito caótico, o comércio pujante e o vai-e-vem das pessoas, é possível encontrar marcos históricos importantes. É o caso do complexo de mesquita e madrassa Sulaymaniyyah, construído em 1566 d.C. pelo sultão Suleiman Al-Qanoui. Trata-se de um belo exemplo de arquitetura otomana, hoje em restauração com apoio do governo turco. O local abriga um mercado de artes e artesanato aberto ao público em geral.
O convento milenar de Seydnaya
Nos arredores de Damasco existem pequenas cidades que guardam grandes surpresas. Uma delas é Seydnaya, cerca de 30 quilômetros da capital. Lá a grande atração é o convento ortodoxo de Nossa Senhora de Seydnaya, construído no topo de uma colina em meados do século 06 d.C. O convento continua em plena atividade e é local de moradia de cerca de 50 freiras.
Em uma capela escura, onde para entrar é preciso tirar os sapatos, a exemplo das mesquitas muçulmanas, está guardada em um pequeno nicho na parede uma pintura da Virgem Maria feita por São Lucas, dizem os religiosos locais. É um lugar de pagamento de promessas que, além de objetos do próprio convento, contém ex-votos deixados pelos fiéis.