Outro dia eu lia a história de um terapeuta americano. Ele contava sobre sua esposa de muitos anos, que teve um diagnóstico de câncer no ovário. Ela ficara sabendo que teria menos de um ano de vida e decidira viver, independente do que acabara de ouvir. E eles ficaram juntos, aprendendo a amar, das mais profundas maneiras, e cresceram num tempo que se transformou em cinco anos. Eles combateram o bom combate.
A esposa pediu a ele que fizessem terapia. Disse que o amor que tinham um pelo outro era maravilhoso, que o apoio que ela recebia dele permitia continuar a lutar pela vida. Mas que eles precisavam de ajuda para permanecer ''despertos um para o outro''. O que aconteceu com este amor? Será que este sentimento, que encontrávamos com tanta frequência nos casais do século passado se extinguiu? O que os nossos adolescentes tem buscado nos seus namoros?
Como fazer para que esta geração possa resgatar a essência das relações duráveis e não o ''seja eterno enquanto dure'' ? Como nós, pais, podemos semear novamente valores que parecem ultrapassados, mas não são? ''O amor é paciente, é bondoso; o amor não arde em ciúmes, não se orgulha, não é soberbo, não se porta com indecência, não busca seus próprios interesses, não se irrita, não suspeita mal. Não se alegra com a injustiça, mas se alegra com a verdade; tudo tolera, tudo crê, tudo espera, tudo suporta''. 1 Coríntios 13:4-7
Em um de seus livros, o também psiquiatra Irvin Yalom conta a história de uma paciente que tinha um relacionamento difícil com o pai. Quase nunca conversavam, mas surgiu a oportunidade de viajarem juntos de carro e ela imaginou que seria um bom momento para se aproximarem. Durante o trajeto, o pai, que estava na direção, comentou sobre a sujeira e degradação de um córrego que acompanhava a estrada. A garota olhou para o córrego a seu lado e viu águas límpidas. E teve a certeza de que ela e o pai realmente não tinham a mesma visão da vida. Seguiram a viagem sem trocar mais palavras.
Muitos anos depois, esta mulher fez a mesma viagem, pela mesma estrada, desta vez com uma amiga. Estando agora ao volante, ela surpreendeu-se: do lado esquerdo, o córrego era realmente feio e poluído, como seu pai havia descrito, ao contrário do belo córrego que ficava do lado direito da pista. E uma tristeza profunda se abateu sobre ela por não ter levado em consideração o então comentário de seu pai, que a esta altura já havia falecido. Segundo Marta Medeiros, acontece todo dia: a gente só tem olhos para o que mostra a nossa janela, nunca a janela do outro.
Vamos despertar esta juventude para dar uma espiada no ângulo de visão do vizinho. Dependendo de onde se esteja posicionado, a razão pode estar do nosso lado, mas a perderemos assim que trocarmos de lugar. Só possuindo uma visão de 360 graus para nos declararmos sábios. E a sabedoria recomenda que falemos menos, que batamos menos o martelo e que sejamos menos enfáticos, pois todos estão certos e todos estão errados em algum aspecto da análise. É o triunfo da dúvida.
O namoro, como tantas outras relações, funciona para isso. Aprendermos a olhar para outro com amor, tolerância e compreensão. Descobrir que o diferente é bom e pode ser complementar. O que para uns é deficiência, para outros pode ser eficiência. ''Seja quem você é e diga o que você sente, porque os que se incomodam não importam e os que importam não se incomodam.''
Margareth Alves - psicóloga e terapeuta familiar (Londrina)