A tendência de aumento de internações por Covid 19 já registrada em alguns hospitais privados de São Paulo começou a ser observada também na rede pública municipal nesta última semana.
Segundo a Info Tracker, uma ferramenta desenvolvida por pesquisadores da Unesp e da USP que monitora o avanço da pandemia no estado, entre 7 e 13 de novembro, hospitais municipais de São Paulo tiveram alta de 9% nas internações (de 556 para 604).
Na Baixada Santista, o aumento foi de 23% (de 180 para 222), e na região norte da Grande SP, de 37% (19 para 26).
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Segundo os pesquisadores, além do aumento das internações, observa-se também uma alta de 50% de casos suspeitos e da taxa de aceleração do contágio do coronavírus.
Os dados vêm dos boletins epidemiológicos municipais e são processados por meio de modelagem matemática e inteligência artificial.
"Não é uma pequena oscilação. É uma alta consolidada, que envolve uma análise desde agosto. Pode ser um indício de que vamos acabar emendando [uma onda da Covid com a outra]", diz Wallace Casaca, professor da Unesp e pesquisador do CeMEAI-USP (Centro de Ciências Matemáticas Aplicadas à Indústria).
Em relação às internações na capital, ele afirma que entre setembro e o meio de outubro havia uma tendência de queda, depois ocorreu estagnação, mas nos últimos dias foi observada uma pequena alta."Não está aumentando muito ainda, mas os gráficos já mostram essa tendência [de alta]", explica.
Cidades do interior como Presidente Prudente e Piracicaba também registraram aumento de internações: de 35 para 45 internados (29%) e de 41 para 51 pessoas (24%), respectivamente.
Já Campinas e São José do Rio Preto tiveram queda de 6% (396 para 372) e 12% (241 para 211), respectivamente.
Para o epidemiologista Paulo Menezes, professor da USP e que integra o centro de contingência do governo paulista, olhando o conjunto de hospitais públicos municipais e estaduais ainda não é possível afirmar que haja aumento consistente de internações na capital–ou apenas uma oscilação sazonal.
Nas últimas três semanas, porém, ele diz que os dados mostram aumento discreto no número de casos leves e redução na velocidade com que vinham caindo as internações no estado.
"É possível um aumento sim e talvez seja consequência da mudança de comportamento da classe média e média alta."
Mas, para ele, ainda não dá para inferir que o aumento de casos verificado nos hospitais privados seja prenúncio do que pode vir a acontecer nos públicos. "Os hospitais privados recebem muitos pacientes de outras regiões."
O também epidemiologista da USP Paulo Lotufo considera que essa alta na rede pública ainda não seja tão nítida pela falta de acesso e demora do diagnóstico, mas diz que nas UTIs municipais aumentou a ocupação.
A Secretaria Municipal de Saúde informou que não é verídica a informação de que haja alta de internações e de ocupação de UTI na rede municipal paulistana, e que a pandemia está sob controle na cidade.
Na rede privada de São Paulo, ao menos seis hospitais (Sírio-Libanês, Albert Einstein, Vila Nova Star, Oswaldo Cruz, HCor e São Camilo), também registraram aumento de internações nas primeiras semanas de novembro, em diferentes proporções.
Na rede de hospitais São Camilo, por exemplo, a média diária de internação de pacientes Covid em setembro e outubro foi de 6,83 e 6,58, respectivamente. Em novembro, está em 8,92.
No Einstein, pacientes confirmados e internados por Covid passaram de 54 na primeira semana de novembro para 72 no último sábado (14), sendo que 26 estão na unidade semi-intensiva e na UTI.
Atualmente, o hospital tem um total de 73 leitos para Covid, ou seja, está quase com lotação máxima. O Einstein abriu mais 16 leitos de reserva caso a demanda de outros estados aumente. Hoje ela oscila entre 20% e 25% do total.
Esses leitos que já tinham sido destinados a outras especialidades e voltaram a fazer parte do fluxo Covid na última semana.
"Teve um aumento, mas não dá para falar ainda que se trata de uma curva crescente exponencial como foi na primeira fase da pandemia", diz o cirurgião Sidney Klajner, presidente do Albert Einstein.
Ele afirma que o hospital trabalha hoje com quase 100% de ocupação de leitos destinados a outras doenças que não a Covid, mas diz que, se necessário, conseguirá remanejá-los de acordo com a demanda Covid ou, em último caso, até mesmo postergar procedimentos eletivos.
Esse aumento de internações de pacientes Covid preocupa os hospitais privados porque ocorre em um momento de retomada das cirurgias eletivas que ficaram represadas no auge da pandemia.
Segundo Fernando Torelly, superintendente executivo do HCor (Hospital do Coração), em abril e maio, a instituição chegou ter 140 dos seus 260 leitos destinados à Covid, sendo 98 ocupados de fato por pacientes infectados.
Com o passar dos meses, esse número começou a cair e chegou em 17 de outubro a 18 pacientes. Em novembro, houve um aumento gradativo e, na quinta (12), 38 dos 40 leitos para Covid estavam ocupados.
Na mesma semana, houve um dia em que os 13 leitos da UTI Covid estavam ocupados. No sábado (14), no entanto, o número caiu para 9. "Ele aumenta e desce. Não é um processo de aumento contínuo como acontecia no pico da pandemia."
Ao mesmo tempo, os leitos não Covid também estão hoje com 90% de ocupação. "Nós nunca enfrentamos um aumento de Covid com um grande aumento de pacientes de outras especialidades que passaram meio ano sem tratamento", afirma.
Torelly diz que o temor do setor é que haja novamente uma grande alta de pacientes Covid. "O fato é que se tiver 50 pacientes amanhã com Covid eu não tenho como fechar leitos dos não Covid porque estão todos ocupados por pacientes de outras especialidades."
Segundo ele, embora tenha aumentado o número de atendimentos e internações relacionadas à Covid, a taxa de mortalidade se mantém estável. "Estamos muito mais bem preparados do que estávamos em fevereiro."
Francisco Balestrin, presidente do SindHosp (sindicato paulista dos hospitais, laboratórios e clínicas), diz que, embora haja um pico de aumento em alguns hospitais privados da capital, no setor como um todo ainda se observa um equilíbrio. "Precisamos ver se isso vai se manter."
Além da competição por leitos Covid e não Covid, o setor também se preocupa com uma eventual nova busca desenfreada por materiais, com os EPIs (Equipamentos de Proteção Individual) e medicamentos (como relaxantes musculares e anestésicos). No auge da pandemia, houve escassez e aumento abusivo de preços.