A decisão do governo de criar uma linha de crédito do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para operadores de saúde ampliarem a rede de assistência foi criticada por especialistas do setor. A professora Lígia Bahia, do Núcleo de Estudos de Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) classificou como "um escândalo".
O financiamento deverá ser lançado até o fim de 2013. Planos de saúde interessados poderão usar como garantia a parte da reserva técnica, uma espécie de fundo que até hoje tem como função assegurar o atendimento dos consumidores, caso a empresa apresente alguma dificuldade de caixa.
"Como um banco de desenvolvimento vai financiar um setor que, historicamente, resiste em fazer pagamentos para o setor público?" Dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) mostram que 862 operadoras de saúde estão inscritas na dívida ativa. Juntas, elas devem R$ 111 milhões.
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Lígia critica também o fato de a reserva técnica ser usada como garantia. "É uma distorção. Esse fundo servia como segurança para os consumidores, obviamente que esse dinheiro nunca mais será visto." O professor Mário Scheffer, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), tem avaliação semelhante. "O governo está claramente formatando um pacote de socorro para operadoras", observa. Além da linha de crédito do BNDES, a administração federal chancelou, nos últimos dias, o perdão de uma dívida bilionária do setor pelo não pagamento do Programa de Integração Social (PIS)/Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins).
Scheffer enxerga um movimento da gestão federal para expandir o mercado de planos de saúde, deixando de lado o financiamento do setor público. "A Agência Nacional de Saúde Suplementar acompanhou, imóvel, a expansão das operadoras sem que houvesse uma rede credenciada compatível", diz. "Agora, o socorro virá com recursos públicos."
De acordo com os professores, as últimas decisões indicam que a ideia de o Poder Executivo ajudar o setor privado, lançada no início de 2013, não foi abandonada. "Diante das críticas, o governo apenas passou a agir em silêncio. Mas mantém firme essa meta", disse o professor da Faculdade de Medicina da USP.
O conselheiro do Conselho Nacional de Saúde Ronald Ferreira também criticou a linha de crédito. "É preocupante essa tendência. Enquanto estamos aqui nos mobilizando, reivindicando mais recursos para o Sistema Único de Saúde (SUS), somos surpreendidos com uma medida como essa." Ferreira lembrou que mais de 2 milhões de assinaturas foram coletados para a proposta da lei de iniciativa popular que prevê que o Executivo invista, pelo menos, 10% da receita corrente bruta para a saúde. "O governo propõe um ajuste orçamentário, um aumento acanhado. Essa mesma contenção, no entanto, não se repete com o setor privado."