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714 mil mortos

Cinco anos após pandemia, falta de coordenação de dados da Covid deixou legado permanente

Folhapress
11 mar 2025 às 13:22

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Isaac Fontana / Arquivo Folha
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Em uma época que a relevância dos dados de Covid era diretamente relacionada à temporalidade, divulgar a quantidade de casos com atraso de um mês, ou mesmo uma semana, significava impedir o acesso ao cenário de uma pandemia, a mesma que, só no Brasil, deixou 714 mil mortos.

A falta de centralização de dados e de sua disponibilização de maneira acessível pelo governo do então presidente Jair Bolsonaro (PL) deixou um legado que perdura até hoje, conforme afirmam especialistas.

Com milhares de mortes por dia no auge da crise sanitária, as prefeituras divulgavam boletins diários de forma heterogênea, em geral com apenas duas informações: casos e óbitos até o dia anterior, sistema que gerava uma dificuldade no acesso à informação, afirma João Abreu, diretor-executivo da ImpulsoGov, organização sem fins lucrativos que apoia governos e profissionais de saúde a aprimorar políticas públicas de saúde por meio do uso de tecnologia.

Uma ausência de diretrizes claras por parte do governo federal em relação a quais dados deveriam ser coletados e mantidos pelas instâncias inferiores resultou em uma fragmentação nos protocolos de coleta e divulgação de informações, diz Wallace Casaca, pesquisador da Unesp (Universidade Estadual Paulista) e coordenador da plataforma SP Covid-19 Info Tracker.

"Cada ente federativo adotou os procedimentos que considerou mais adequados no início da pandemia, com base em comitês locais que, em muitos casos, não apresentaram convergência em diversos aspectos. Por exemplo, enquanto alguns municípios atualizavam diariamente o número de internados e a disponibilidade de leitos, outros não coletavam, ou, ao menos, não divulgavam essas informações, cenário que também se repetiu em âmbito estadual", acrescenta.

Segundo Abreu, foi a organização de civis para compilar os dados que permitiu responder como estava a evolução da pandemia no Brasil e o que isso poderia sugerir para os próximos dias e semanas. "Em um cenário ideal, a gente teria visto isso acontecer por parte do próprio governo federal e, quem sabe, tivesse melhorado nossa resposta à pandemia."

Em junho de 2020, em resposta à decisão do governo Jair Bolsonaro de restringir o acesso a dados sobre a pandemia de Covid-19, foi criado um consórcio de veículos de imprensa formado por Folha de S.Paulo, UOL, O Globo, G1, Estadão e Extra para coletar e divulgar as informações.

"Acabou matéria no Jornal Nacional", chegou a dizer o presidente Bolsonaro, em tom de deboche, ao comentar a mudança, em junho de 2020, dias antes do início oficial do consórcio.

Após 965 dias ininterruptos de trabalho, o consórcio de veículos de imprensa foi encerrado em janeiro de 2023.

A lacuna de dados é uma consequência de falta no plano estratégico de preparação, prevenção e resposta a surtos com potencial pandêmico, questão comum ao Brasil e também a outros países, inclusive de alta renda, de acordo com Thais Junqueira, superintendente geral da Umane, associação que apoia iniciativas no âmbito da saúde pública.

"Como resultado, as dificuldades de entendimento entre os diferentes setores do governo e da sociedade a respeito das prioridades estratégicas acaba dispersa e afeta a comunicação com a população em geral", afirma.

O cenário parece ter reverberado até hoje. Ainda é possível observar, sob o governo Lula (PT), discrepância nos critérios de coleta, periodicidade de atualização e lacunas nos tipos de informações disponibilizadas.

Segundo Fátima Marinho, médica especialista em medicina preventiva, houve um grande enfraquecimento da vigilância de doenças de notificação durante a gestão Bolsonaro, sucateamento da rede de vigilância e perda de pessoal qualificado. "Isso persiste até hoje, falta maior investimento na capacitação de pessoal e na estrutura de vigilância."

São exemplos disso a falta de dados abertos compilados sobre hospitalizações por Covid em 2025, a porcentagem da cobertura vacinal para o público-alvo, e a taxa de transmissão, índice epidemiológico importante durante o período mais severo da doença.

Hoje, estão disponíveis no DataSUS dados de ocupações de leitos até 2022, e o Ministério da Saúde disponibiliza informes semanais que mostram o acumulado de casos hospitalizados de Srag (síndrome respiratória aguda grave) neste ano com a porcentagem do predomínio de Covid, o que dificulta o acompanhamento gradual e a visualização do cenário.

O painel Coronavírus, da pasta, ainda é a melhor ferramenta para verificar a progressão de casos, óbitos e incidência da Covid. Já o painel Vacinação, embora também atualizado diariamente, só mostra os números de forma absoluta, tornando difícil entender a situação da cobertura vacinal contra a doença.

A reportagem questionou o Ministério da Saúde sobre as dificuldades atuais no acesso a informações sobre a Covid, que afirmou que os dados estão centralizados em sistemas de informação e disponíveis por meio de plataformas como o Painel Coronavírus, os boletins Infogripe da Fiocruz e os Informes Epidemiológicos semanais.

Segundo Junqueira, a cobertura vacinal é a melhor medida do quão eficiente e cooperativa uma sociedade consegue ser, evitando assim casos novos de uma doença prevenível, além de possibilitar ações de reforço em áreas ou populações com coberturas baixas, que predispõem o espalhamento desenfreado de potenciais surtos.

Já uma noção sobre hospitalizações também permite a identificação de padrões de aparecimento de novos casos, cepas ou desafios locais do acesso e assistência à saúde.

Também não é possível obter um recorte de óbitos por faixa etária em um determinado período por meio de plataformas oficiais, como a do governo federal.

Casaca resume o caso como um desinteresse no tema, sobretudo por parte do poder público, o que, segundo ele, torna "as plataformas de dados cada vez mais genéricas e com menos recursos para exploração de dados da Covid".

Para Luiz Reis, diretor de ensino e pesquisa do Hospital Sírio-Libanês em São Paulo, é importante, no entanto, dosar o benefício e os custos de montar plataformas de acesso público que possam viabilizar esse grau de detalhes à sociedade.

"Todo dado que puder trazer lucidez e informação útil, não vejo por que ele não ser público. O que eu acho que a gente precisa entender é como definir um conjunto mínimo de dados que poderiam ser públicos. A minha opinião é que o gestor público deveria ter talvez um comitê, um conjunto de pessoas que pudesse apoiar nessa decisão."

O projeto Saúde Pública tem apoio da Umane, associação civil que tem como objetivo auxiliar iniciativas voltadas à promoção da saúde

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