Boa parte dos líderes concorda que as pessoas são o maior ativo de suas empresas. A imensa maioria deles diz que faz de tudo para que o clima organizacional seja o melhor possível e se julga um bom exemplo para seus colaboradores diretos. As pesquisas mostram isso.
Daí vem a pergunta: então por que alguns desses mesmos gestores não conseguem enxergar que a forma com que conduzem seus colaboradores é mais parecida com um campo de concentração do que uma empresa que precisa de gente comprometida racional e emocionalmente?
Alguns anos atrás fui convidado para atender uma indústria em franco crescimento. Segundo o diretor geral da unidade na qual o projeto seria desenvolvido, os cinquenta gestores apresentavam inúmeros problemas de desempenho, incluindo: vitimização diante dos problemas, um péssimo relacionamento com os liderados e a desmotivação para fazer qualquer coisa além do mínimo exigido pela empresa.
Eu reuni todas aquelas informações após a nossa reunião e logo elaborei uma proposta de trabalho. Na sequência, já recebi um retorno positivo e agendamos a primeira reunião com as duas turmas para darmos início ao projeto. O diretor geral da unidade, sempre solícito, disse que gostaria de participar de alguns dos eventos a fim de aprovar as sugestões em tempo real e só pediu para se sentar no fundo da sala a fim de não inibir os participantes.
Durante o primeiro dia de trabalho, chamou atenção um fato: ninguém perguntava absolutamente nada. Até mesmo nas atividades em grupo, percebi que as pessoas falavam baixinho e sempre olhavam para o diretor para ver o que ele estava fazendo. O treinamento seguiu arrastado o dia todo.
Na manhã seguinte, antes de continuarmos o curso, pedi ao diretor que não participasse, pois eu precisava realizar algumas atividades com o grupo e provavelmente as pessoas ficariam desconcertadas se ele estivesse por perto observando-as. Prontamente, ele concordou comigo e segui para a sala. Lá dentro, após uma ou duas horas, daí sim descobri o que realmente prejudicava a performance dos gestores.
Para encurtar a conversa, o diretor era um verdadeiro ditador. Centralizava toda e qualquer decisão, xingava os gerentes durante as reuniões internas, "castigava" quem discordasse de suas ideias e sempre procurava flagrá-los fazendo algo errado. Em vez de liderá-los, atuava como um capataz e isto causava ressentimento em quase todos eles.
Um fato que pude acompanhar por aquelas semanas iniciais de trabalho já diz tudo. Ao fazer uma de suas rondas diárias, o diretor encontrou alguns palitos de dente jogados no chão, convocou todo mundo para o auditório e comunicou que a partir dali não teriam mais este "benefício", segundo suas próprias palavras. Resultado: as pessoas passaram a "traficar" palitos de dente pela empresa com o objetivo de confrontá-lo. Daí ele foi além: implantou uma revista na portaria da fábrica para descobrir quem eram os "delinquentes" que estavam tentando derrubá-lo.
Ao perceber que a situação já estava ficando insustentável, decidi ter uma conversa franca com o diretor com o propósito de fazê-lo perceber que havia outros caminhos. Procurei ser o mais assertivo possível para que ele reagisse bem a tudo o que precisava ser discutido, mas infelizmente nem ele e nem o superintendente corporativo acreditavam que aquele modelo de gestão estava ultrapassado e poderia trazer riscos ao futuro da organização. O próprio superintendente chegou a me dizer: "Como vamos pedir para que ele mude a forma de agir se esta é uma das unidades mais lucrativas do grupo?". Preferiram não fazer nada a não ser, é claro, mudarem o consultor.
Dois meses atrás, a unidade fechou as portas porque não conseguia ser competitiva e mais de 300 empregos de uma pequena cidade do interior agora não existem mais. Como já lembrava Jack Welch duas décadas atrás, quando uma empresa alça ao pedestal pessoas que alcançam resultados, mas desrespeitam seus valores, seu futuro não é nada bom. Uma pena.
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