São Paulo - Comer com consciência e bem informado sobre o que está consumindo. Na busca por uma vida mais saudável e com alimentação regrada, estes dois fatores podem ser mais do que um diferencial: se tornam fundamentais. Ainda mais numa atualidade "bombardeada" por boatos, dietas e produtos que prometem grandes transformações em pouco tempo. Entender os rótulos dos produtos também é uma maneira de ficar mais esclarecido.
A nutricionista Vanderli Marchiori defende que a informação "liberta". Secretária-geral da Associação Brasileira de Nutrição Esportiva, a profissional afirma que a restrição alimentar não educa. "Se não educo em médio período de tempo, a pessoa vai voltar ao consumo anterior ou simplesmente vai ter uma dieta completamente equivocada e desbalanceada", elenca. "Posso escolher um alimento que me dá prazer e que não tenho frequência alta, mas posso incluí-lo se souber escolher", adverte ela, que junto com outros especialistas da área participou de encontro promovido pela Rede Rotulagem, em São Paulo, na semana passada.
Segundo Marchiori, o conceito do "você é o que você come" não se aplica mais de forma tão extrema em relação a quando surgiu. Hoje em dia, o equilíbrio soma-se a este ditado. "O ideal é que a pessoa tenha um consumo com frequências diferentes, porções adequadas, com ela entendendo o que pode ser consumido e não apenas achar, por exemplo, que castanhas são boas para diminuir problemas cardiovasculares. É preciso entender o quanto disso preciso para gerar resultados, quantos dias têm que consumir e quais os reais benefícios. Uma rotulagem mais clara ajuda para que cada pessoa aprenda e saiba escolher."
Para a bióloga Natalia Pasternak, muitos dos que optam por uma vida mais saudável fazem algumas confusões com a dicotomia correlação e causa e sobre perigo e risco quando o assunto é alimentação. No primeiro caso, destaca que o fato de deixar de consumir determinado produto e considerar que aquilo lhe trouxe benefícios não pode ser reconhecido como uma conclusão técnica. "Se constata isso a partir de pesquisas com animais, estudos controlados, divisão em dois grupos, estudo de população e prospectivo. É assim que vamos analisar causa e efeito", indica.
DOIS CONCEITOS
Na situação de risco e perigo, a pós-doutora em microbiologia de genética molecular de bactérias explica que existem diferenças entre os significados. "Perigo não é risco. Para correr risco tem que estar exposto e em grandes quantidades. Temos que tomar muito cuidado nestes dois conceitos, principalmente quando falamos de alimentos", diz, citando um estudo coordenado pelo Iarc (Agência Internacional de Pesquisa em Câncer), que faz parte da Organização Mundial de Saúde das Nações Unidas.
A pesquisa mostrou que a substância acrilamida, presente no café e liberada após o grão ser torrado, pode causar câncer. "Isso é uma análise de perigo. Já a análise de risco chegou à conclusão de que é preciso consumir 50 litros de café por dia durante um ano para apresentar risco mínimo de desenvolver tumor por este motivo. Ou seja, é impossível ingerir tudo isso. Em tempos de todos colhendo informação na internet, e com circulação de boatos, a atenção deve ser redobrada", exemplifica Pasternak.
EXERCÍCIOS
FÍSICOS
Além da alimentação, a prática de exercícios físicos ajuda a estimular uma consciência saudável, desde que também se empregue a consciência. O educador físico Marcio Atalla considera que faltam políticas públicas para ajudar a população a criar o hábito. "Se fala muito no alimento, mas se esquece da atividade física. Tem que se pensar em política de saúde pública como um todo, que envolva informação, empoderando as pessoas com o melhor poder de decisão e possibilitando que coloquem isso em prática", sugere.
Atalla lamenta que o caminho que vem sendo trilhado na saúde brasileira sobre a vida saudável não vem alcançando resultados satisfatórios em índices, como de obesidade. Em dez anos, a prevalência da doença passou de 11,8%, em 2006, para 18,9%, em 2016. Entre os jovens, a obesidade aumentou 110% entre 2007 e 2017.
Os profissionais alertam sobre a erroneidade de se classificar alimentos como "proibidos" no dia a dia. Eles sinalizam que procurar ajuda especializada é uma das maneiras de não entrar em dietas que acabam não fazendo bem para a saúde. "Decisões informadas são decisões melhores. Comer de tudo, com moderação, fazer exercícios. Não existe receita pronta e o consumidor, nos rótulos, precisa ter acesso à informação adequada", recomenda a bióloga Natalia Pasternak. (Pedro Marconi/Grupo Folha)
O repórter viajou a convite da Rede Rotulagem