Desde 1996, as bolachas e tortas de Erica Zeilinger estão no Bosque Alemão, um dos pontos turísticos de Curitiba, no Deutsche Ecke (Canto Alemão). Mas sentar-se em uma das mesinhas dispostas ali e pedir um café acompanhado de uma fatia de torta ou de uma bandejinha de bolachas é mais que fazer um lanche rápido ou matar o tempo durante um passeio a turismo pela cidade.
Atrás do balcão de dona Erica estão preservadas décadas de história da confeitaria artesanal alemã. Muitas das receitas usadas por ela são raramente encontradas hoje na própria Alemanha por causa da industrialização das matérias-primas e da produção como um todo. ''O recheio do Strudel lá é enlatado. Já a gente, lava a maçã, descasca, corta, tira as sementes'', compara dona Erica.
A confeiteira, de 65 anos, costuma visitar feiras gastronômicas na Alemanha em busca de novidades para sua produção. Mas não adere às facilidades da indústria porque prefere manter o sabor original de seus doces, ainda que a produção artesanal exija uma dedicação maior. ''Como minha visão nunca foi crescer a gente quer manter aquilo mais artesanal. Não é para ganhar dinheiro, é o que a gente gosta de fazer'', justifica dona Erica. ''Lá é tudo lindo, maravilhoso mas você vai comer e já sente os conservantes. A gente não usa nada'', completa a confeiteira. Para ela, a maior recompensa é ouvir dos clientes antigos que o sabor continua o mesmo. ''O que a gente prima é a qualidade. O produto é caro mas a matéria-prima é escolhida a dedo. A gente gosta demais, faz pelo amor à arte'', conta.
A produção das bolachas e tortas começou caseira. As bolachinhas decoradas eram feitas para presentear familiares e amigos no Natal. ''Sempre fiz em casa e o pessoal gostava bastante. Sempre gostei de fazer coisas novas'', afirma. A fábrica, que durante 20 anos funcionou na cozinha de dona Erica, hoje opera em sede própria com dez funcionárias. O primeiro contato com a cozinha alemã, se deu ainda na infância, com os pais que emigraram da Alemanha para o Brasil. E mais tarde foi aprofundado no período em que dona Erica morou em Munique para um curso entre os 23 e os 25 anos de idade. ''Foi quando conheci mais a tradição'', lembra. Agora, quando volta à terra natal de seus pais, dona Erica vai em busca do que ainda restou das tradicionais receitas que conheceu há 40 anos. ''Não tem mais nada artesanal. Nas vilas do interior ainda se encontra um pouco. Mas, em geral, é tudo visando grandes indústrias'', explica.
A oferta das matérias-primas no Brasil melhorou muito nos últimos dez anos. E como não abre mão dos ingredientes originais em cada receita, quando não encontra aqui o que precisa, dona Erica manda trazer da Alemanha. Por isso, cada pedaço de torta e cada bolachinha são como um passaporte para a cozinha alemã tradicional preservada aqui em família. Antes de ter suas primeiras funcionárias contratadas, dona Erica contava com a ajuda dos filhos. Hoje Elizabeth Prestel, que aprendeu ainda criança os segredos dos doces feitos pela mãe, é sócia dela na fábrica, chamada Bolachas Erika. E além do gosto por confeitar, Elizabeth herdou o gosto pela pesquisa. ''Toda receita tem uma história. Então só fazer por fazer para mim não tem sentido'', justifica a filha.
Ela conta que no Brasil o Strudel também sofreu alterações tanto no recheio quanto na massa. ''Lá o Strudel é sempre feito de maçã, por isso ele é chamado Apfelstrudel, 'apfel' é 'maçã'. Aqui hoje se faz Strudel de tudo'', explica Elizabeth. Segundo dona Erica, a receita mudou devido ao novo contexto que os imigrantes alemães encontraram ao chegar no Brasil. ''Adaptaram pela necessidade. Não conseguiam os ingredientes. Quando eu era criança uma maçã era divida em quatro e cada filho ganhava um pedacinho. No lugar de amêndoas, nozes ou castanhas, usavam amendoim'', observa dona Erica.
Aqui também usa-se muito a massa folhada, que não é a massa original, observa Elizabeth. ''Usam a massa folhada por não conhecerem essa maneira de trabalhar a massa'', avalia. ''Lá dizem que ela deve ser tão fina que você tem que conseguir ler o jornal através dela'', completa Elizabeth. Em sua origem, o Strudel era uma opção simples de alimento para os mais pobres. Na Turquia era chamado de ''Baklava'' e chegou a Viena depois da conquista bizantina, em 1453. Adotado pela culinária austríaca, foi aperfeiçoado e levado a Munique, onde se consolidou como Apfelstrudel por causa da fartura de maçãs na região. ''Lá eles têm macieiras no quintal'', compara Elizabeth.
Serviço:
Deutsche Ecke - Bosque Alemão
Onde: Jardim Schaffer, no bairro Vista Alegre, entre as ruas Franz Schubert, Nicollo Paganini e Francisco Schaffer.
Horário de funcionamento: todos os dias das 12 horas até o anoitecer. Nos meses de julho, dezembro e janeiro, das 10 horas até a noite.
Informações: (41) 3338-8385.