Um documento da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) afirma que o presidente em exercício da CBF (Confederação Brasileira de Futebol), Ednaldo Rodrigues, entrou em contato com o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, para que a partida entre Brasil e Argentina, interrompida no último domingo (5) em seus minutos iniciais, pudesse ser retomada.
De acordo com o documento, Rodrigues queria que Yunes Eiras Baptista, fiscal do órgão responsável por paralisar o confronto, falasse com o ministro e liberasse os quatro argentinos vetados por descumprimento de quarentena de 14 dias, obrigatória para estrangeiros que chegam ao Brasil de lugares como o Reino Unido (caso do quarteto), em razão da pandemia do novo coronavírus.
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O funcionário havia ido à Neo Química Arena para entregar notificações aos atletas adversários da seleção brasileira. Com a impossibilidade de contar com os jogadores, a Argentina deixou o campo de jogo.
"Por volta das 16:45, fui abordado pelo senhor Ednaldo Rodrigues, presidente da CBF, informando que estava em contato com a Casa Civil e se eu poderia falar com o sr. Ministro Ciro Nogueira. Neguei o contato e informei que se dirigisse à diretoria da Anvisa, a qual me encontrava subordinado, visto que se tratava de ação sanitária e legal", escreveu Baptista em trecho do documento.
A CBF negou, por meio de nota, que o presidente em exercício da confederação tenha feito contato com servidores da Anvisa nos termos relatados. E afirmou que o cartola não autorizou nenhuma pessoa a falar em seu nome.
"O presidente da CBF não falou sobre esse ou qualquer outro assunto com o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, [nem] sequer tem seu contato telefônico. A versão é fantasiosa", diz o texto.
O Palácio do Planalto e a Conmebol foram procurados pela reportagem, mas não se manifestaram até a conclusão do texto.
O fiscal da Anvisa disse que, além do presidente da CBF, outros dirigentes questionaram se seria possível uma negociação. Segundo Baptista, Sergio Ribas, vice-presidente da Comissão de Governança e Transferência da Conmebol, solicitou o telefone para contato com algum diretor da Anvisa ao qual ele estaria subordinado.
O fiscal acrescentou que a intenção da Anvisa era o cumprimento da medida sanitária, devendo se limitar à notificação dos quatro jogadores. Assim sendo, eles não deveriam participar da partida em razão do desrespeito à legislação sanitária e à saúde pública.
No entanto, desde que chegou ao estádio, com a ajuda de policiais federais, Baptista relatou dificuldade de colaboração dos envolvidos na partida no cumprimento das medidas sanitárias. Ele citou a CBF, a Conmebol, a AFA (Associação do Futebol Argentino) e os próprios jogadores.
Inicialmente, fiscais e policiais foram orientados a aguardar em um camarote. "O fato de não ter sido direcionado a um interlocutor com poder decisório (dirigentes e ou organizadores da instituição) em uma área específica (mais privada), sendo direcionado para uma área de exposição pública (camarote), em meu juízo indicava tentativa de constrangimento", escreveu Baptista.
Ele disse que se retirou do camarote de forma a forçar uma definição. Uma pessoa o orientou a seguir para o vestiário da seleção argentina e informou de que a partir daquele ponto não poderia haver fotos ou filmagens em virtude de questões de segurança e comerciais.
"A impressão pessoal foi que o respectivo deslocamento foi propositadamente lento e desorganizado para ganhar tempo e uma forma de direcionar (através do constrangimento) uma possível negociação."
Na chegada ao vestiário, o fiscal diz ter sido direcionado a uma sala adjacente. Ele aponta que em vários momentos perguntou se algum dirigente poderia assinar pelos jogadores, o que foi prontamente negado. Por conta disso, os delegados da Polícia Federal iniciaram uma conversa no intuito de chegar a um acordo, o que também não ocorreu.
"Por volta das 16:00, não sendo possível confirmar o horário, escutei a execução do hino nacional (momento em que ficou clara a obstrução). Imediatamente iniciei um movimento em direção à porta e encaminhamento ao túnel de acesso ao campo. Mais uma vez houve uma tentativa desorganizada de evitar a ação, porém os policiais da PF seguiram junto abrindo caminho", diz Baptista, em outro trecho do documento da Anvisa.
Quatro jogadores da seleção argentina deram informações falsas e ocultaram que estiveram no Reino Unido nos últimos 14 dias: Emiliano Martínez, Emiliano Buendia, Giovani Lo Celso e Cristian Romero. Eles jogam em equipes de futebol da Premier League.
O Ministério da Saúde negou um pedido de autorização excepcional para que quatro jogadores argentinos pudessem ser liberados do período de quarentena, previsto nas atuais normas sanitárias do país, e atuassem contra a seleção brasileira.
O requerimento foi rejeitado 51 minutos antes de o jogo entre Argentina e Brasil começar. A partida foi interrompida com seis minutos de bola rolando.
O pedido dos argentinos foi feito no sábado (4). O ofício do secretário-executivo adjunto da Saúde, Alessandro Glauco dos Anjos de Vasconcelos, que rejeitou a solicitação, foi assinado eletronicamente às 15h09 de domingo.