Apenas 22% dos brasileiros com dez anos de idade ou mais têm condições satisfatórias de conexão à internet, mostra estudo inédito do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), braço executivo do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br). No campo, o índice cai a 7%.
Para chegar à essa conclusão, o NIC.br avaliou quatro dimensões do acesso à internet: acessibilidade financeira, acesso a equipamentos, qualidade de conexão e ambiente de uso.
Dentro desses grupos, há nove critérios de avaliação: custo inferior a 2% da renda familiar; plano de celular pós-pago; uso diversificado de dispositivos; mais de um dispositivo com acesso à internet por pessoa no domicílio; computador no domicílio; conexão à fibra ótica; conexão a cabo; locais de uso diversos e frequência diária de uso de internet.
De toda a população, 57% não têm metade dos nove pré-requisitos que caracterizam uma conexão de qualidade.
Cada indicador conferia um ponto em uma nota final de 0 a 9. Quem pontua de 7 a 9 tem conexão satisfatória.
Ao todo, 33% dos brasileiros ficam no grupo de acesso mais precário, com zero a dois pontos. E outros 24% têm entre três ou quatro.
Dentre as quatro dimensões analisadas, os indicadores de acessibilidade financeira apresentaram o pior desempenho, seguidos pelos de acesso a equipamentos e de qualidade da conexão.
No estudo chamado Conectividade Significativa, pesquisadores analisaram dados coletados desde 2017 para o levantamento sobre acesso à internet TIC Domicílios -pesquisa que ouve todos os anos cerca de 20 mil pessoas e tem nível de confiança de 95%. Os questionários em condições normais são entregues de forma presencial, com exceção para o período da pandemia.
O estudo Conectividade Significativa é divulgado como parte do ciclo de atividades do NIC.br para o aniversário de dez anos do Marco Civil da Internet, que consolidou o acesso à rede mundial de computadores como um direito fundamental com vista à universalização.
Desde 2015, quando foi lançada a primeira edição da pesquisa TIC Domicílios sobre o estágio da conectividade do país, o acesso à internet avançou de 51% dos domicílios para os atuais 84%, embora esse crescimento tenha desacelerado depois de 2020.
Hoje, o debate da sociedade civil passou da universalização para a conectividade significativa, de acordo com a coordenadora do Comitê Gestor da Internet, Renata Mielli.
"Nas comunidades mais carentes, vemos o acesso à internet via dispositivo móvel, em planos que requerem a compra de franquia de dados a um valor incompatível com o salário mínimo e oferta de acesso gratuito a aplicativos específicos", diz Mielli, em referência aos planos conhecidos como zero rating.
A conectividade significativa abre portas para avanços nos estudos, desenvolvimento de habilidades digitais como adotar medidas de segurança ou instalar programas e a execução de atividades online de comunicação, entretenimento, informação e de trabalho.
A chance, por exemplo, de alguém com acesso satisfatório à internet usar a rede para trabalhar fica na casa dos 72%, contra 12% de alguém que tem o pior nível de conexão. Há vantagens também para se informar sobre direitos, serviços e oportunidades financeiras.
Desigualdade entre pessoas no melhor e no pior nível de conexão
Índice subtrai a chance de realizar determinada atividade entre um representante de cada grupo
Comprou produtos ou serviços - 64%
Realizou ativiades de trabalho - 60%
Realizou atividades financeiras - 57%
Procurou informações sobre produtos ou serviços - 56%
Procurou informações em enciclopédias virtuais - 53%
Estudou por conta própria - 50%
Realizou algum serviço público - 48%
Procurou informações em sites do governo - 44%
Procurou informações sobre saúde - 41%
Assistiu a vídeos, filmes ou séries - 39%
Ouviu música online - 29%
Usou redes sociais - 28%
Conversou por voz ou vídeo - 22%
Enviou mensagens instantâneas - 16%
Fontes: Cetic.br
Embora a maior parte da população ainda tenha conectividade precária, a situação melhorou desde 2017. A parcela de pessoas com conexão satisfatória subiu de 10% para 22%.
Ainda assim, a equipe do NIC.br considera o cenário brasileiro "desafiador". A desigualdade na qualidade de conexão tem como reflexo oportunidades desiguais para os usuários de internet.
Além disso, em termos geográficos, moradores de zonas rurais e das regiões Norte e Nordeste também vivem com conectividade pior.
Há também um crivo social: mulheres, pretos, desempregados, pessoas de baixa escolaridade ou das classes C e D/E lidam com conexão inadequada.
A pesquisa ainda avaliou as pessoas que não usam a internet e representam cerca de 16% da população.
"Mesmo não usuários diretos de internet podem apresentar algum grau de conectividade, caso convivam ou residam em local com conexão, por exemplo, o que aumentaria as chances de esse indivíduo ter algum aproveitamento da rede, ainda que de maneira indireta, por meio da ajuda de parentes ou conhecidos", diz Graziela Castello, coordenadora no NIC.br e responsável pelo levantamento.
"O levantamento oferece uma avaliação detalhada das lacunas existentes no acesso, no uso e na apropriação da internet no contexto nacional", diz o CGI, que apresentará o estudo em reunião do G20 neste mês.
A ideia do comitê é repetir a pesquisa nos próximos anos para aprimorar a medição e identificar áreas críticas para indicar intervenções.