Filmado no cenário agreste da Chapada dos Viadeiros, no Brasil profundo de Goiás, um filme pobre na aparência exterior, mas extremamente rico em ideias bem resolvidas, o western caboclo “Oeste Outra Vez” é lançamento nacional nesta quinta-ferira (27), em todo o país, e estreia simultaneamente em Londrina em exibição numa única sala, no Espaço Villa Rica.
Trata-se de uma trama existencial envolvendo homens nascidos em terra hostil e abrutalhados pelo entorno humano duro e sem arestas. E sem companheiras. São seres incapazes de amar as mulheres que fazem ou fizeram parte de suas vidas. E que escolheram não ficar com eles. Sem saber nem de longe como lidar com sua afetividade embutida sob a tosca armadura da alma, eles se voltam uns contra os outros e contra si mesmos, a partir da única fórmula de convivência que conhecem: a violência.
O MASCULINO EM CENA
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Tristes, amargurados, vulneráveis e contra a vontade/vaidade postos em disponibilidade, esses machos fundamentalistas não fazem coisa senão beber e pensar em meios e maneiras de se livrarem um do outro. O roteirista-diretor Erico Rassi promove uma revisão subversiva no gênero, e retira de cena o elemento feminino. Mas nem por isso as mulheres são excluídas ou perdem importância na trama: num recorte certamente feminino/feminista, elas saem empoderadas mesmo fisicamente ausentes da narrativa.
Minimalista na forma que, no entanto, procura os espaços abertos da natureza como reza a imortal tradição de um gênero que nasceu e permanece imortal quando os apelos viscerais da tragédia desenhada se tornam irrefreáveis, “Oeste Outra Vez” se agiganta na dramaturgia e cobra dos personagens masculinos explicações impossíveis sobre atos intempestivos que revelam a falência de suas emoções. Dois homens, Totó e Durval (Ângelo Antônio e Babu Santana), sob um sol inclemente, na sequência de abertura soltam seus demônios trocando socos e pontapés no meio da rua deserta e poeirenta por causa da mulher que eles disputam (Tuanny Araujo), mulher que aliás só é vista na cena inicial do filme, e mesmo assim dando as costas sem passar recibo para o espetáculo de fúria e danação.
Com extrema habilidade, sub-repticiamente, Rassi constrói sua história com rigorosa e definida economia de recursos materiais de cena, muito precisa em seus personagens (há figuras de pistoleiros/matadores que vagam pelo roteiro como lendas, fragmentos de outras tragédias semelhantes), comentários psicológicos, antropológicos e sociais. Lança mão de inteligentes flertes através da citação de clássicos como Freud, Beckett e mestres de westerns imortais; e dirige de maneira sublime um elenco feito de modesta majestade.
Tudo é lindamente posto em cena em “Oeste Outra Vez”. Essenciais na construção densa e acertada do universo do filme são o fotógrafo André Carvalheira e a diretora de arte Carol Tanajura, passando pela trilha musical de Guilherme Garbato, a sonoridade obtida por Ricardo Reis e a montagem de Leopoldo Joe Tanaka.
Quem se aventurar a fazer esta descoberta de (mais um) título precioso deste momento privilegiado de Brasil cinema não vai se arrepender. “Oeste Outra Vez”, com indiscutíveis méritos, foi consagrado pelo júri e pelo público com o Kikito de melhor longa-metragem da 52ª edição do Festival de Cinema de Gramado, em agosto do ano passado.
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