Com mais de 35 anos de pesquisas com populações na amazônia e uma consolidada carreira de publicações internacionais, o antropólogo brasileiro Eduardo Brondízio, 61, foi um dos vencedores da edição de 2025 do Tyler Prize, popularmente conhecido como o "Nobel" ambiental.
Professor da Universidade de Indiana, nos Estados Unidos, e da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), Brondízio divide o prêmio de US$ 250 mil (cerca de R$ 1,49 mi) com a ecóloga argentina Sandra Díaz. Esta é primeira vez, em 52 anos de história, que a láurea é concedida a indivíduos da América do Sul.
Embora tenham recebido indicações independentes, a dupla trabalhou em conjunto no comando de um grande relatório de avaliação de biodiversidade publicado pelas Nações Unidas. O levantamento, que teve liderança também do pesquisador Josef Settele (Alemanha), revelou que mais de 1 milhão de espécies estão em risco de extinção.
"Foi uma grande satisfação ser reconhecido e poder compartilhar isso com minha colega Sandra, com quem venho colaborando há mais de uma década", disse Brondízio à Folha. "Fico contente que tenham dado essa oportunidade para destacar os temas e problemas que trabalhamos, especialmente relacionados à região amazônica."
Nascido em São José dos Campos (SP), em uma família com forte ligação rural, o cientista conta que a questão da agricultura e das migrações para áreas urbanas sempre o interessou.
Os estudos na floresta começaram perto de casa, na mata atlântica, ainda na faculdade. O primeiro contato com a amazônia aconteceu em 1989 e nunca parou. Desde então, Brondízio participou de vários trabalhos de campo extensos com diferentes populações ribeirinhas.
As pesquisas do brasileiro adotam uma abordagem multidisciplinar, combinando ciências naturais, antropologia e outros domínios. Dados recolhidos nos trabalhos de campo são integrados a imagens de satélite e georreferenciamento, ampliando o escopo e as interpretações dos resultados.
"Isso permite analisar a transformação da paisagem ao longo do tempo e entender como as mudanças ambientais, econômicas e sociais se interconectam. Nós conseguimos mapear, por exemplo, áreas de produção intensiva de açaí, mostrando que elas não são simplesmente 'floresta nativa', mas sim sistemas produtivos sofisticados manejados pelas populações locais", detalhou.
Dar visibilidade a essas comunidades é um dos pontos centrais de sua atuação, explicou Brondízio.
"Categorias sociais foram impostas a esses produtores, posicionando-os em uma paisagem social desfavorável. O exemplo do açaí ilustra bem isso: produtores sempre foram chamados de 'extrativistas', mas, na realidade, os sistemas de produção de açaí são altamente manejados e sofisticados", afirmou. "A ideia de que o extrativista é apenas um sujeito passivo, que colhe o que a natureza dá, desvaloriza a complexidade do trabalho desses produtores."
O mercado de açaí, hoje bilionário, destacou ele, "cresceu graças à resposta da população ribeirinha à demanda urbana nos anos 70 e 80". "No entanto, esses produtores continuam sendo vistos como incapazes de atender a uma economia moderna."
Para Brondízio, a complexa realidade das populações urbanas da amazônia, que muitas vezes se movimentam entre o campo e cidade, também é frequentemente excluída do debate público.
O pesquisador defende que a inclusão do combate à pobreza e à precariedade da infraestrutura é fundamental nas iniciativas de proteção à biodiversidade e no combate das mudanças climáticas. Esses fatores, assim como as pressões adicionais trazidas pelo aumento da presença do crime organizado na amazônia, precisam ganhar atenção, de acordo com o antropólogo.
"Isso amplia as pressões ambientais de uma maneira sem precedentes, porque agora não são só as carências regionais, que sempre estiveram presentes. Há os extremos climáticos, que viraram normalidade e afetam zona rural, indígena e urbana de maneira muito impactante", afirmou.
"Há o crescimento da economia ilegal e do crime organizado, que conecta com outros países amazônicos e que transformou a região, nos últimos anos, em polo também no comércio ilegal de drogas", completou.
Além do trabalho direto com as comunidades brasileiras, o pesquisador também analisou a situação em outros países.
Brondízio é coautor de um trabalho, publicado na revista Nature, sobre a produção de alimentos em mais de 180 países. A pesquisa revelou que 200 milhões de empregos foram perdidos no setor desde 1991, havendo outros 120 milhões em risco até 2030. A maior parte dos afetados estará em comunidades indígenas e rurais em países em desenvolvimento.
A organização do Tyler Prize ressaltou as contribuições do cientista brasileiro para jogar luz sobre a importância de pequenos agricultores e da agricultura familiar no sistema global de alimentação.
"A pesquisa de Brondízio destacou o papel fundamental que os produtores rurais e de pequena escala desempenham na segurança alimentar global. Além de tornar essas contribuições invisíveis mais visíveis, ele tem sido uma voz ativa na defesa da preservação de empregos e conhecimento no setor, pedindo investimentos para combater a pobreza e a desigualdade", disse a comissão do prêmio.
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