Quando a trancista Esther Gomes viu a foto da funkeira Ludmilla usando uma lace, acessório parecido com peruca, com os fios lisos para a apresentação na festa do BBB 21 neste sábado (3), sabia que o fato de a famosa não aparecer com os cabelos naturais causaria burburinho nas redes sociais. De fato os comentários vieram à tona: depois de a cantora ter pedido respeito aos cabelos afro na apresentação no reality, algumas pessoas foram a seu Instagram questionar a escolha pelo acessório
Ludmilla rebateu as críticas dizendo que tem local de fala para pedir respeito aos cabelos crespos. "O fato de eu estar usando lace lisa não anula as minhas raízes, meu cabelo é crespo e meu local de fala sobre o racismo que eu sofro continua. Não sejam ignorantes", escreveu no Instagram.
Para Esther, que cuida de outras famosas, comentários sobre mudanças capilares em mulheres negras, seja com a colocação de lace ou tranças, são baseados em uma visão distorcida sobre a autoestima negra. "As pessoas acham que usar lace, peruca, é porque a gente quer se embranquecer. E não é isso, às vezes, a gente não quer danificar o cabelo natural ou mesmo só mudar de cabelo. Usar lace e trança não nos faz menos negras", afirma em entrevista a Universa.
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"Mudar o visual não anula gostarmos do nosso cabelo crespo"
Esther comenta que ela mesma faz modificações constantes no cabelo: já ficou com laces, tranças e careca em diferentes fases da vida. Ela começou a alisar os fios aos oito anos e só conseguiu parar os procedimentos químicos quando fez 18.
Para ela, o uso dos recursos estéticos é uma forma de mulheres negras experimentarem diferentes resultados na aparência e, por vezes, conseguirem proteger os fios naturais que, por serem crespos, podem exigir mais cuidados.
O lace e a trança, diz a especialista, ainda podem ser usados para que a mulher se sinta mais segura durante a transição capilar. A escolha, ela pondera, precisa ser de cada uma. "Isso não anula amarmos nosso cabelo crespo"
A mulher de Ludmilla, a dançarina Brunna Gonçalves, por sua vez, apareceu sem lace pela primeira vez em uma apresentação e comemorou o feito no Instagram. Para colocar as laces, as duas são atendidas, aliás, pelo hairstylist Vitor Malibu, que tirou dúvidas sobre o tema em reportagem de Universa no final de março.
"Comentário racista desvaloriza trabalho de profissional de beleza".
A trancista explica que passou a trabalhar na área por necessidade financeira, atendendo a amigas, e que o encontro com Ludmilla aconteceu depois de fazerem propaganda de seu trabalho para a artista nas redes sociais. "Minhas clientes começaram a marcá-la nas redes sociais para ela ver meu trabalho. E há três anos passei a atendê-la", conta a profissional, que é de Pavuna, zona norte do Rio de Janeiro.
Na opinião de Esther, as declarações que tentam rotular ou reduzir as possibilidades de mudança dos cabelos de mulheres negras, além de terem tom racista, também são uma forma de desvalorizar o trabalho de quem atua nesse ramo da beleza.
"Quando as pessoas falam que a trança é algo para esconder o cabelo ou porque alguém não está se aceitando não sabem que, por trás da colocação da trança, há uma história ancestral. Quando falam assim parece que nosso trabalho é algo banal, e não é. Nós, trancistas, nos sentimos muito desvalorizadas quando colocam esse tipo de frase, com racismo, em pauta."