O perfil abusivo é um padrão de comportamento, afinal, o processo de formação é construído ao longo da vida. Segundo o psicólogo Filipe Martin de Oliveira, a construção começa na infância e na adolescência já que os cuidadores são nossos maiores exemplos. "Se a criança teve um contato com um relacionamento abusivo de qualquer parte, ela vai ter um modelo a ser seguido, seja do agressor ou do agredido, e isso é reproduzido."
Nesse sentido, a estudante de psicologia Juliana Cestaro ressalta que relacionamento abusivo não se restringe apenas a relações afetivas, mas que os próprios pais, muitas vezes, podem ser abusivos.
"Um exemplo é o uso da chantagem em relação de pais e filhos, algo muito comum. Em questão de aprendizagem, se uma criança aprende a ser agressiva e impositiva, ela também aprende a ser passiva, introspectiva, afinal, são dois caminhos. Pessoas agressivas vão se relacionar da maneira que aprenderam, se conviveram com pais mais impositivos, ela tende a se relacionar com alguém que consiga desempenhar o mesmo papel de dominação."
Leia mais:
Mulheres não são governadas por hormônios, mas menopausa afeta o cérebro, diz pesquisadora
Entenda as diferenças entre perimenopausa e menopausa
Uma em cada quatro pessoas no Brasil conhece vítimas de violência doméstica, diz Datafolha
Mulheres lésbicas relatam negligência de médicos em atendimentos ginecológicos
"Não deixava eu me aproximar dos amigos dela por ciúmes e com o tempo não queria que eu frequentasse certos lugares". É com esse relato que a recém-formada em relações públicas Larissa, 23 anos, bissexual, descreve o último relacionamento que terminou.
Larissa conta que a ex-parceira conviveu a vida toda com um pai abusivo. "A mãe dela já havia sofrido por anos com o ex-marido. Além das traições, pressão psicológica e mentira eram algo frequente."
A história de Larissa era para ter sido diferente, afinal, ela já tinha vivido um relacionamento abusivo por quase dois anos com um homem que nunca a assumiu, mas cobrava um comportamento "exemplar" da parte dela. Dessa vez, ela, que havia conhecido a ex-parceira numa balada, achava que seria diferente.
O que era para ser um relacionamento saudável se tornou, como ela mesma diz, um "círculo vicioso". "Era um círculo vicioso de felicidade, briga, término, felicidade, briga e término. Por muitas vezes, percebia que era maltratada na frente de amigos e conhecidos e isso me deixava com muita vergonha."
A relação que durou pouco mais de oito meses teve vários altos e baixos, mas o ponto crucial foi o quadro de ansiedade que Larissa começou a desenvolver. "Terminei inúmeras vezes e voltava porque a companhia dela [ex-parceira] era agradável. Achava que sempre podíamos tentar de novo, mas o abuso continuou e ela sempre estava me cobrando, duvidando de mim e me deixando sempre muito ansiosa."
Larrissa destaca que percebeu desde o início que a relação era abusiva. "Me sentia controlada por ela, mas achava que outros fatores podiam compensar. A sensação de 'sempre pisar em ovos' nunca melhorou."
O fato de nunca melhorar foi o que fez com que Larissa chegasse ao término e evitasse qualquer contato. "Decidi cortar qualquer contato quando ela resolveu utilizar pretextos para mostrar que estava ficando com outras meninas e, de certa forma, me coagir. Me fazer pensar que ela me trocaria a qualquer momento porque as outras eram maravilhosas."
Depois do término, a relações públicas está seguindo em frente. Ela diz que vez ou outra a ex-parceira aparece inventando um motivo para puxar assunto, mas Larissa tem sido firme em sua decisão. "Seguir em frente está sendo ótimo. Maior sensação de liberdade e as crises de ansiedade diminuíram. O apoio de amigos e familiares foi muito decisivo e eu consigo seguir com meus projetos."