Em um mundo anterior à pandemia, quando o cliente entrava em um estabelecimento comercial, atendentes mais atentos e experientes seriam capazes de fazer uma leitura rápida do perfil desse consumidor.
De objetivos a indecisos, passando pelos que estão sempre em busca de produtos singulares, essa identificação do comportamento sempre foi essencial para proporcionar uma experiência de compra alinhada à expectativa de cada comprador.
Em um cenário no qual as máscaras que protegem também escondem intenções e desejos de consumo, como lidar com essa nova realidade? O sorriso – parte do atendimento acolhedor tão valorizado pelo brasileiro – está comprometido. No entanto, será que o relacionamento de compra e venda ainda pode ser salvo? Stella Kochen Susskind, pioneira na metodologia mystery shopping, acredita que sim.
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"Há mais de três décadas atuo com pesquisas conduzidas por clientes ocultos. Com eles, aprendi que a expectativa de compra, sempre está condicionada à personalidade do consumidor. Ou seja, a forma de comprar é uma extensão da personalidade do comprador. Hoje, não conseguimos sequer nos nortear pelo estilo de roupa, já que estamos todos de moletom! Nessa perspectiva e diante da impossibilidade de ler a expressão do cliente e identificar o perfil de consumo dele, penso que temos uma outra forma de leitura", explica a especialista.
Para Susskind, a máscara, que se tornou o símbolo da pandemia e que se correlaciona com os sentimentos que as pessoas têm nesse momento. "Tenho visto que a escolha da máscara facial que nos protege da Covid-19 aponta a 'identidade secreta' desse consumidor. Nesse exercício de revelar e classificar o humano por trás da máscara, elaborei cinco tipos de clientes que mostram o aspiracional de personalidade", conta.
Abaixo você confere os cinco tipos de clientes percebidos por Susskind:
Perfil 1 | Muito preocupado
Esse consumidor estará usando uma máscara de tecido branca ou de cor clara. Por cima dessa, uma segunda proteção acrílica transparente ou a máscara profissional N95.
"A leitura que temos é de uma grande preocupação em se contaminar ou contaminar alguém. Essa pessoa tanto pode ser um trabalhador da área da saúde, como uma pessoa que está muito assustada com a possibilidade de contrair o vírus. Sair de casa para fazer uma compra é um exercício complexo para esse consumidor, portanto, cada minuto é precioso no atendimento", explica a especialista.
Dica: o atendente tem que ser bastante objetivo, optar por um cumprimento simples (bom dia, boa tarde, olá) e ir direto ao ponto. "Não procure fazer vendas casadas distantes do produto que esse cliente pediu ou iniciar conversas sobre a pandemia. A expectativa desse cliente é sair do estabelecimento o mais rápido possível para não se expor tempo demais a um vírus mortal – e a boa experiência de compra dele depende dessa capacidade da equipe da loja."
Perfil 2 | Engajado
Esse consumidor opta por uma máscara associada a alguma campanha ou mobilização. Produzida por alguma comunidade específica ou comprada para auxiliar alguma causa socioambiental, a máscara representa a sua adesão a algo maior, à resistência humana a um vírus.
"Claro que esse consumidor está atento e engajado em cumprir todas as normas de segurança, mas ele está preocupado em auxiliar a retomada da economia. Voltar a comprar de maneira presencial é a forma de mostrar esse compromisso com a vida, a economia e a humanidade", conta.
Dica: o atendente deve passar otimismo na voz, já na hora do cumprimento. É importante mostrar que a loja está atenta a todas as normas sanitárias e pronta para oferecer a maior segurança possível para que a experiência de compra seja segura.
Se a loja tiver algum produto ou campanha social, é muito importante que o vendedor fale sobre a iniciativa, de maneira rápida e assertiva. Esse cliente está aberto para uma venda adicional, desde que faça sentido – que seja mais do que a aquisição de um produto, mas que seja um item que dialogue com o momento.
Perfil 3 | Desencanado
Esse consumidor opta pelas máscaras de tecido com temas fofos ou divertidos ou neutros (bege, branca). Ele está informado sobre o risco e – por uma demanda social e por acreditar na lógica por trás da orientação de uso –, está usando a máscara.
O que isso significa? Esse consumidor não quer que uma máscara defina um estado de espírito abalado e amedrontado. Ele quer dizer ao mundo que está tranquilo, consciente e à altura do desafio que enfrentamos. Está muito interessado em retomar, na medida do possível, uma rotina anterior à pandemia, acredita na transitoriedade da situação.
"As compras não terão tanta ligação com os itens mais comprados na fase de distanciamento social. Ele está propenso a comprar itens de moda, por exemplo. Vai reagir bem à oferta de um item adicional – que não tenha necessariamente nada a ver com a compra principal – e topa uma conversa descontraída enquanto compra", pontua Susskind.
Dica: não direcione o assunto para o medo da Covid-19 ou faça questionamentos sobre a vacina. Fale sobre o produto, pergunte sobre cores e modelos. O vendedor tem que estar sensível ao estado de espírito do desencanado. Para ele, sair de casa e comprar é retomar a vida que tinha. É essa experiência que ele espera ter.
Perfil 4 | Poderosa
Essa consumidora – sim, elas são a maioria desse perfil – opta por olhos bem marcados, milimetricamente maquiados e ressaltados com sombras e esfumaçado. Estará com uma máscara de grife, ostentando uma marca e mostrando sedução no olhar e no gestual.
Embora sejam facilmente encontradas em lojas de luxo, esse perfil não está atrelado à classe social, mas ao comportamento resistente e sedutor. Aceitam que têm que usar a máscara para a dupla proteção – proteger a si e aos outros –, mas adota essa prática de maneira fashion e personalizada. Ou seja, não quer que a máscara esconda a sua forma de enfrentar a vida.
Dica: elogie a máscara ou o olhar – claro, se for genuíno – antes de qualquer coisa. A proposta é mostrar que você percebe a pessoa que está por trás da máscara, que esse consumidor conseguiu expressar a sua individualidade em cada detalhe. Não tenha pressa, nem force um atendimento descuidado, rápido. Dê a esse consumidor o tempo que ele precisa, porque essa pessoa está profundamente interessada em ter uma experiência de compra – não apenas comprar um item.
Perfil 5 | Negacionista
Esse consumidor estará com a máscara no queixo ou pendurada no bolso. Quer dizer ao mundo que não é vulnerável e que não está com medo do vírus. Então, o lojista ou gerente – preferencialmente, aliás – tem que ser muito firme e solicitar a colocação da máscara. É bem possível que esse cliente se negue. Então, é a sua vez de entender que nem todas as vendas podem ser feitas. Mas, que todas as vidas devem ser preservadas.
Dica: peça, delicadamente, que esse possível cliente saia da loja.
"Uma última dica que dou aos vendedores e gerentes é que pensem no espaço da loja como um ambiente que precisa passar segurança e harmonia. Então, não basta adotar as diretrizes sanitárias previstas por lei, precisamos mostrá-las. Faça com que essas normas e equipamentos sejam visíveis, que haja organização e beleza no ambiente. Flores e pequenas delicadezas que tornem a loja acolhedora. Uma excelente experiência de compra, hoje, depende de pequenos detalhes que fazem grandes diferenças", finaliza a especialista.