Realizar a vontade de ser mãe está levando cada vez mais mulheres a buscar métodos de reprodução assistida no Brasil. Em 2014 foram mais de 60 mil transferências de embriões para pacientes, um crescimento de quase 15% em relação a 2013, quando foram feitos mais de 52 mil procedimentos. Os números são do Relatório do Sistema Nacional de Produção de Embriões, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
Conseguir que a fecundação ocorra, mas evitar que a gravidez seja múltipla é um dos maiores desafios da reprodução assistida. Para a técnica de fertilização in vitro (FIV), por exemplo, aproximadamente 25% dos procedimentos realizados no País resultam em gêmeos, trigêmeos e até quadrigêmeos, de acordo com a Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida. Esse número é alto quando se considera que, de forma natural, apenas uma em 88 gestações resulta em gêmeos, 1,1% do total.
A preocupação dos pais com a gestação múltipla tem justificativas. Além de fugir do planejado e exigir muito mais trabalho depois do parto, ela representa riscos acrescidos para a saúde da mãe e dos bebês.
Nesse tipo de gravidez são frequentes os partos prematuros, o que pode levar à ocorrência de baixo peso para os bebês e uma maior chance de eles contraírem doenças. Já para a gestante, é normal que sofram mais com enjoos, havendo um risco aumentado de desenvolverem hipertensão, falta de ar, diabetes, anemia ou mesmo de apresentarem hemorragias e abortos espontâneos nos primeiros meses de gravidez.
Para diminuir as chances de gestação múltipla, o Conselho Federal de Medicina recomenda desde 2010 a limitação do número de embriões na reprodução assistida. Em mulheres com até 35 anos podem ser inseridos no máximo dois embriões. Já naquelas que têm entre 36 a 39 anos, a limitação passa a ser de três embriões. Para mulheres com mais de 40 anos, o limite estabelecido é de quatro embriões.
O limite varia de acordo com a idade porque em mulheres mais velhas as chances de os embriões efetivarem uma gravidez são menores. Entretanto, pode acontecer de todos serem concebidos, gerando dois, três ou quatro bebês.
Chances de ter gêmeos com tratamentos de fertilidade
"Tratamentos de infertilidade que promovem um aumento da ovulação podem conduzir ao nascimento de gêmeos, trigêmeos ou mais múltiplos. É importante dizer que nem todos os tratamentos de infertilidade ‘vêm com este risco aumentado’, mas a maioria pode expor o casal a este risco", esclarece o ginecologista Jonathas Borges Soares, diretor do Projeto ALFA, Aliança de Laboratórios de Fertilização Assistida.
A seguir, o médico enumera medicamentos e tratamentos que podem levar ao nascimento de gêmeos com mais frequência:
- Uso de medicamentos;
- Uso de Gonadotrofinas (também conhecido como injetáveis) como Gonal-F e
Follistim;
- Inseminação intra-uterina, quando utilizada junto com medicamentos para
infertilidade;
- Fertilização in vitro.
O emprego dos medicamentos tem a menor taxa de gêmeos, variando de 5% a 12%. A taxa de trigêmeos e de múltiplos de ordem superior é inferior a 1%.
Já as gonadotrofinas, se usadas com ou sem inseminação intra-uterina, têm a maior taxa de gêmeos. Segundo alguns estudos, até 30% das gestações concebidas com gonadotrofinas levam a múltiplos. A maioria destas gravidezes são gestações gemelares, mas até 5% são de triplos ou gravidezes de ordem superior.
Segundo o CDC (Centers for Disease Control), nos Estados Unidos, gêmeos oriundos da fertilização in vitro são relativamente comuns, com a taxa mais elevada para as mulheres com menos de 35 anos, algo em torno de 33%. Já a taxa de fertilização in vitro para gêmeos é menor para as mulheres com mais de 35 anos de idade, provavelmente devido à diminuição da taxa de sucesso global dos tratamentos de infertilidade, relacionada à idade da mulher.
Causas para o nascimento de gêmeos
Tratamentos de infertilidade não são a única causa para o nascimento de gêmeos. A seguir, Soares lista outros fatores que aumentam as chances de nascimento de múltiplos:
Idade da mulher: mulheres com mais de 30 têm um risco aumentado de ter gêmeos. Isso ocorre porque o hormônio FSH aumenta à medida em que a mulher envelhece. "O FSH, hormônio estimulante do folículo, é responsável pelo desenvolvimento dos óvulos nos ovários, antes de serem liberados. Níveis mais elevados de FSH são necessários quando uma mulher envelhece, pois os óvulos requerem mais estímulos para crescer do que em uma mulher mais jovem. Esta situação é um pouco ambígua, visto que os níveis de FSH aumentaram também devido à diminuição da fertilidade. Nestes casos, muitas vezes, os folículos reagem com mais agressividade aos níveis mais elevados de FSH, e dois ou mais óvulos são liberados, resultando em uma gravidez de gêmeos", explica.
História familiar: se você tem gêmeos fraternos (não-idênticos) na sua
família, suas chances de conceber gêmeos aumentam. Uma história familiar de
gêmeos idênticos não significa, contudo, aumento do risco de gêmeos. "Uma
história de gêmeos no lado feminino da família indica uma maior probabilidade de ovular mais de um óvulo por ciclo. Uma história de gêmeos fraternos do lado
masculino indica uma maior probabilidade do homem produzir espermatozoides
suficientes para fertilizar mais de um óvulo", esclarece.
Peso: mulheres obesas, com IMC acima de 30, são mais propensas a conceber gêmeos do que mulheres com IMC normal. "Esta é outra situação ambígua, uma vez que mulheres acima do peso também são mais propensas a apresentarem dificuldades para conceber. O excesso de gordura leva o corpo a produzir quantidades cada vez maiores de estrogênio. O aumento dos níveis de estrogênio pode levar uma maior estimulação dos ovários, que ao invés de liberar apenas um óvulo durante a ovulação, podem liberar dois ou mais", afirma o médico.
Altura: mulheres mais altas que a média têm um risco aumentado de conceber gêmeos. Um estudo descobriu que mulheres com média de 164,8 centímetros de altura tinham maior probabilidade de conceber gêmeos do que as mulheres com média de 161,8 centímetros. "Por que isso acontece? Ainda não sabemos, mas uma teoria é que uma melhor nutrição, o que pode levar uma estatura maior, pode estar por trás do aumento da taxa de gêmeos", diz o médico.
Número de filhos: gêmeos são mais comuns em mulheres que já
engravidaram mais vezes e têm famílias grandes;
Raça: mulheres negras são mais propensas a conceber gêmeos do que as mulheres brancas. As asiáticas são as menos propensas a conceber gêmeos.
- Amamentação: mulheres que engravidam durante a amamentação também são mais propensas a conceber gêmeos. "É verdade que a amamentação também pode afetar a fertilidade e prevenir a gravidez, especialmente nos seis primeiros meses de vida do bebê, caso ele se alimente exclusivamente de leite materno. No entanto, é possível engravidar durante a amamentação. E de gêmeos! Um estudo verificou que a taxa de gêmeos é de 11,4% entre as mulheres que amamentam, em comparação com apenas 1,1% em mulheres que não amamentam", revela o ginecologista.
Dieta: embora muitas pesquisas sobre este tema ainda estejam em curso, alguns estudos descobriram que mulheres que consomem mais produtos lácteos são mais propensas a conceber gêmeos. Uma teoria é que os hormônios de crescimento dado às vacas possam afetar os níveis hormonais em humanos.
Chances de ter gêmeos idênticos
A maioria das gestações múltiplas concebidas via tratamentos de infertilidade
são de gêmeos fraternos. Os tratamentos de infertilidade aumentam o risco de ter gêmeos idênticos. De acordo com um estudo sobre o tema, os gêmeos idênticos representam 0,95% das gestações concebidas após o tratamento. Isso é o dobro do risco da população em geral. Não está claro porque os tratamentos de infertilidade levam ao nascimento de mais gêmeos idênticos. Uma teoria é que os embriões colocados em cultura durante a FIV aumentam o risco de geminação de idênticos. Outra teoria é que os tratamentos com gonadotrofinas levem ao aumento do risco de gêmeos idênticos.
Suas chances de ter gêmeos
Como se vê, suas chances de ter gêmeos dependerão não apenas do uso de medicamentos para infertilidade, mas também da sua história familiar, raça, idade e de muitos outros fatores. Esses fatores "agem juntos". Em outras palavras: uma mulher alta com uma história familiar de gêmeos fraternos têm mais chances de conceber gêmeos durante tratamentos de infertilidade do que uma mulher mais baixa, sem qualquer história familiar de gêmeos.
"As chances de conceber gêmeos também são afetadas pela causa específica da sua infertilidade. Uma mulher jovem com óvulos mais saudáveis têm mais chances de conceber gêmeos que uma mulher com mais de 40 anos, cujos óvulos apresentam uma qualidade mais comprometida", observa o ginecologista.
"As taxas de gêmeos e múltiplos também variam em cada clínica de fertilidade. Taxas de gêmeos diferem com base em como cada clínica controla a estimulação da ovulação e de quantos embriões elas transferem durante a FIV. E mesmo que o seu médico decida tentar a transferência de um único embrião, você ainda pode conceber gêmeos idênticos", explica Soares.