Curitiba - Sentada em um banquinho da praça, a moça resolve fazer movimentos sensuais com sua curta saia para provocar os transeuntes. Em outro lugar, Valentina, dominatrix fetichista, sugere sodomizar uma inocente virgem. Um pouco mais distante, no espaço e tempo, Druuna castiga seus adversários de maneira cruel, lasciva e deliciosa. As três personagens e situações têm um ponto em comum: vieram das mentes criativas de três grandes autores italianos, que têm papel de destaque em ''Tentação à Italiana'', álbum de luxo lançado pelo jornalista Gonçalo Junior, através da editora Opera Graphica.
O pai de Valentina, Guido Crepax -que morreu no dia 31 de julho de 2003-, foi um dos pioneiros na arte de explorar a libido através dos quadrinhos. Influenciado pela incorrigível Barbarella, que deixara para trás a imagem frágil e inocente das mulheres, Crepax gerou Valentina, jovem nascida em um momento de revolução sexual e de questionamento, principalmente através da cultura, na efervescência intelectual dos anos 60.
Valentina era totalmente o oposto das outras manifestações femininas personificadas por garotas que precisavam ser salvas pelos heróis. Até então, eram meninas inocentes totalmente dedicadas a oferecer suporte e prazer aos homens, sem objetivos próprios que não tivessem relação à sobrevivência de seu par macho. A filha de Crepax era bem mais que isso: dominava, conseguia o que queria e era subjugada apenas quando fosse de seu interesse. Uma bomba para os padrões da época.
Assim, Guido Crepax uniu muito do universo literário erótico, com referências ao cinema (Valentina é baseada no visual de Louise Brooks e os ângulos de seus desenhos sempre recorreram à fotografia da sétima arte) e inovou com uma nova temática e narrativa nos quadrinhos. Mais precisamente há 40 anos, em julho de 1965, a personagem estreava na revista italiana Linus e, para reviver e comemorar esse momento, o jornalista Gonçalo Junior (autor de ''A Guerra dos Gibis'') reuniu uma série de ilustrações, fatos e reflexões sobre três autores que criaram uma escola própria na Itália.
Guido Crepax, com Valentina; Milo Manara e suas doces (e ao mesmo tempo pervertidas) mulheres provocantes; e Paolo Eleuteri Serpieri, ao lado da voluptuosa e insaciável Druuna. A publicação é uma das mais bonitas produzidas no Brasil, com o formato gigante, capa dura e papel especial, na gramatura correta para valorizar as ilustrações.
O jornalista reuniu cerca de 540 desenhos para mostrar a história e argumentar, com coerência, sobre como esses autores e a escola italiana de quadrinhos eróticos influenciaram a maneira de produzir, desde meados de 60 até hoje.
Eu Quero o Príncipe Encantado - Lançado pela editora Conrad, o material da quadrinista francesa Hélène Bruller não consegue deixar de lado a comparação com ''Mulheres Alteradas'', da argentina Maitena. Até porque ambas exploram o mesmo tema: insegurança, ansiedade, frustrações e medos de mulheres modernas que buscam, senão a igualdade com o sexo masculino, um pouco mais de compreensão dos companheiros.
Apesar da semelhança, até mesmo entre os traços, as produções de Hélène, no entanto, são diferentes das de Maitena. São menos sutis, um pouco mais agressivas e muitas vezes até com caráter feminista panfletário. Maitena busca a discussão numa visão mais ampla, com o humor de si próprio para refletir sobre assuntos numa panorâmica predominantemente feminina mas com objetivos de sensibilizar também os homens. Já Hélène, que está mais para uma riot girrrl, prefere ironizar os atos machistas através de um julgamento mais pessoal e poucas vezes unânime.
Serviço: ''Tentação à Italiana'' tem formato 26 x 35,5 cm, com 312 páginas e capa dura, ao preço de R$ 98. ''Eu Quero o Príncipe Encantado'' tem formato 22 x 29 cm, com 72 páginas coloridas, e custa R$ 30.
Todas as publicações citadas acima podem ser encontradas em Curitiba na Itiban Comic Shop: Av. Silva Jardim, 845. Fone: (41) 3232-5367.
Música+Quadrinhos: Morfine+Tentação à Italiana