Em Tipos Psicológicos Jung inicia com a dualidade, feito o símbolo do Ying e Yang, o preto e o branco. Assim discrimina as quatro funções da psique em racionais que são SENTIMENTO E PENSAMENTO que perfazem as formas de julgamento, ou seja, como se julga o mundo e as coisas do mundo e as funções irracionais ou instintivas que são SENSAÇÃO E INTUIÇÃO que perfazem a capacidade de perceber o mundo e as coisas do mundo.
Comumente as pessoas não se dão conta de que sentimento é uma função racional e que as funções irracionais são compartilhadas com os demais animais como: cachorro, gato, leão, cobra, gaivota, coruja e etc. Esses não são racionais, são irracionais e as suas funções sensação e intuição funcionam para sua percepção e condicionamento, daí serem eles domesticáveis e até mesmo dóceis.
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Os animais irracionais não possuem as funções de julgamento que são próprias de nossa orientação que provem das funções do sentimento e do pensamento, possuem apenas as funções irracionais.
Mas como então são tão amorosos como o gato e o cachorro? Por que não é a função sentimental que faz isso acontecer posto que ela seja uma função de julgamento, são os instintos. Instintivamente os bichos compreendem, se apegam, se domesticam e demonstram variadas sensibilidades. Sensibilidades são instintuais e fazem parte das funções sensitiva e intuitiva.
De maneira que, os animais se orientam através das funções sensação e intuição e nós, animais racionais, nos orientamos pelas quatro funções já descritas. E, ao que parece, a humanidade ainda está em franca aprendizagem sobre se orientar e se conduzir tanto pela sensibilidades dos instintos quanto pela sensibilidade da razão.
Na sequência observa-se que Jung diz que cada pessoa utiliza mais uma função do que a outra por haver se adaptado melhor àquela devido ao meio em que vive e viveu. E temos assim que há sempre uma função mais utilizada que as demais e há sempre uma das funções menos utilizada que as demais.
A essa função menos utilizada Jung chamou de função inferior e por ser a mais reprimida pelo sujeito usualmente surge de modo desproporcional quando se encontra em conflito. Do mesmo modo que o branco do Yang tem uma semente negra do Ying e vice-versa.
Mais adiante, nessa evolução de pensamento, Jung percebe que o sujeito, por vezes, sai de sua dicotomia e entra num estado plural em relação às funções o que origina a quinta função da psique chamada de função transcendente porque ela, embora seja a união das quatro funções, transcende as quatro e proporciona ao sujeito um momento de grande êxtase e certeza de percepção e orientação, um insight.
Outros autores como Clarissa Pinkola Estes, grande analista junguiana e já mais atualizada com as novas descobertas da ciência em psicologia, chama essa mesma função de percepção instintual porque a quinta função é mais que um insigth é um ângulo de visão e de percepção absolutamente correto.
O símbolo do Ying e Yang é estático quando parado na dualidade, na dicotomia, mas quando esse mesmo símbolo em forma circular é girado, ele então adquiri sua forma mais dinâmica e nos faz compreender a união dos opostos gerando a multiplicidade e a transformação, o próprio fluxo da vida. Já não é mais preto e branco, agora é cinza.
Poucas vezes ocorre, em cada indivíduo, a união das quatro funções (que representam a dicotomia) e esse despertar para um fluxo dinâmico, completo, cheio em si mesmo: a pluralidade e a visão e percepção ampla e magnífica da existência ou do fato observado.
A emoção, a sensação e a lucidez que se experimenta nesses estados é a espiritualidade que advém de um corpo em sua melhor forma. Advém do encontro e interpenetração entre as funções racionais e as instintuais, posto que ao se juntarem as funções todas ocorre que o pensamento diz o que é a tal coisa; o sentimento diz se convém ou não convém e se desejamos aceitar ou não aceitar; a sensação constata que aquilo é e a intuição me diz de onde ela veio e para onde ela vai, desse modo terei uma percepção arrazoada ou uma razão sensibilizada, por isso a quinta função é transcendente e assume um caráter espiritual.
Portanto, a espiritualidade é colocada no sentido de que a razão é e está sensibilizada pelos instintos, dando ao sujeito uma experiência singular de unidade de percepção, de sensação, intuição, de pensamento e de sentimento.
Jung aponta um caminho para vivenciar mais essa forma de espiritualidade sem que se fique a mercê dos estados produzidos pela quinta função: fazer com que o ego se desmorone e passe a permitir e acolher os desejos e demandas instintuais, sem negá-los, mas também sem se deixar possuir por eles. Resultando daí, desse árduo trabalho, uma razão sensível. Ainda é a razão, mas atravessada pelos instintos e completamente liberta da cultura e de seus entraves que são os preconceitos e a mediocridade de se enclausurar, se engessar, numa idéia ou arquétipo coletivo.
A esse processo, feito no decorrer da vida, de acolhimento aos instintos e acolhimento à razão, e mais do que isso, a justa medida de interação entre racional e irracional, Jung chamou de individuação.
Para seguir tal processo, o ego necessita, em primeiro lugar, de honestidade para com aquilo que realmente sente e em segundo lugar precisa confiar no self, nome dado à memória celular do indivíduo que implica em possuir na esfera do inconsciente todas as experiências de intensidade da humanidade em geral.
E em terceiro lugar, julgar tudo aquilo que lhe chega como categoria de força e não dentro da categoria moral e saber que esse centro regulador da psique propiciará ao ego todos os símbolos necessários para que esse ego compreenda racionalmente e emocionalmente os conteúdos que deverão ser trabalhados.
A simbologia se apresenta através dos sonhos, dos acontecimentos, dos delírios, dos devaneios e etc. Mas, é muito fácil se perder na simbologia se o ego não se utilizar tanto da razão quanto de sua sensibilidade instintual para fazer a sua interpretação e análise dos símbolos que se apresentam.
A cultura em que vivemos nos ensina o contrário, que devemos esperar a solução divina e que devemos reprimir e negar os sentidos do corpo e para isso criamos uma série de mecanismos neuróticos. Os mais atuais e eficientes são o relativismo, a síndrome de Poliana e a atitude piedosa, bem como a vitimização.
Sem citar que por existir tal repressão moral contra os sentidos do corpo, a sociedade gera o seu contrário de modo exacerbado e totalmente desarrazoado.
Atualmente temos dois novos fatores que vem de encontro ao processo de individuação, porque raspa a moral adquirida pela cultura e eleva o indivíduo a outro tipo de moralidade e ética.
São eles: a ciência e o conceito de secularismo. Ambos mesclam razão e instintos, elevando o conceito de espiritualidade para longe e livre da religiosidade, assim como queria o Dr. Carl Gustav Jung que por tantas e tantas vezes demonstra em seus textos que a espiritualidade é instintual e que a instituição religiosa é uma forma adoentada desse mesmo instinto, porque não se deixa penetrar pela razão, fazendo com que o ego seja possuído pelo arquétipo espiritual.
O conceito de espiritualidade para a psicologia analítica abarca as quatro funções da psique e provoca certa embriaguez lúcida e controlada, me lembrando a palavra de Nietzsche "loucura controlada". Por isso que fazer ciência implica em se utilizar do espírito e da razão. Não é possível fazer ciência sem utilizar-se da sensibilidade.
Tudo aquilo que nos torna embevecidos e nos coloca num estado alterado de consciência embora com a lucidez produzida pela razão, trata-se de um estado espiritual, um estado instintivo e arrazoado ao mesmo tempo. Na justa medida, em que o ego não está possuído nem pelo instinto e nem pela razão, pelo contrário, está dando continente e continência a ambos, permitindo assim ser abarcado pela experiência da diferença e da multiplicidade.
Livros consultados:
C.G.JUNG – Memórias, Sonhos e Reflexões – reunidas e editas por Aniela Jaffé- tadução de Dora Ferreira da Silva – Ed. Nova Fronteira – RJ.
C.G.JUNG – Estudos Alquímicos – Tradução de Dora Ferreira da Silva e Maria Luiza Appy – Ed. Vozes – 2002 – Petrópolis – RJ.
C.G.JUNG – Tipos Psicológicos – Tradução de Lucia M. E. Orth – Ed. Vozes – 1991 – Petrópolis – RJ.