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Não verás país nenhum.

31 dez 2009 às 10:45
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NÃO VERÁS PAÍS NENHUM


A Floresta Amazônica não existe mais; em seu lugar há um deserto. O
Ministro dos Negócios Imobiliários anuncia na televisão o que ele denomina de
‘nona maravilha do mundo’. O Esquema, que comanda o país, se orgulha de dar
ao Brasil um deserto maravilhoso, centena de vezes maior e mais belo que o
Saara, com planícies amarelas, dunas e leitos secos do que já foram rios
caudalosos. É o Governo transformando uma situação caótica em falácia.
Não há mais árvore alguma no país todo, que está dividido em dois por
uma fenda enorme; não há mais rios. Água limpa é uma raridade; cada cidadão
tem direito a um copo d’água por dia, ou de urina reciclada, se tiver uma ficha
autorizando-o a isso. Há também as fichas de circulação, que indicam por onde
se pode passar e quais lojas se pode frequentar. Caso não tenha as fichas, é-
lhe proibido circular pela cidade, e nem a um copo d’água tem direito, a não ser
que suborne alguém. "Segunda é o dia obrigatório de compras. O povo deve
consumir para que as fábricas possam fabricar e não haja a insidiosa recessão".
Quem não comprar, sofrerá as sanções do Esquema.

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Terra sem cultivo não produz; tampouco a mente.


O Norte e o Nordeste brasileiros transformaram-se em regiões inóspitas;
ser vivo algum resiste ao calor que lá impera. O sol é tão forte que queima,
literalmente, a pele e corrói a carne de quem se arrisca a enfrentá-lo. Mesmo no
Sul e no Sudeste já há os bolsões de calor, que surgem do nada, ressequindo
tudo o que atinge.
São Paulo parou. Aquilo que se esperava com extremo temor aconteceu: o
maior congestionamento de todos os tempos impediu que o trânsito fluísse;
ninguém conseguiu tirar seu automóvel de lá, e lá eles ficaram e ficarão
eternamente: quinhentos quilômetros de carros parados, que se transformaram,
com o tempo, em carcaças vazias. É o Notável Congestionamento. Alguns
chegaram a ficar duas semanas nos veículos, na esperança de poder retirá-lo de
lá. As famílias levavam-lhes roupas, água e comida. Quando descobriram que
não haveria condições de saírem de lá com seus carros, veio o desespero, a
histeria, como se perdessem um ente querido, não apenas um automóvel.

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ALIMENTOS FACTÍCIOS


Não há mais animais; não há mais plantas; não há mais alimentação
natural; tudo é produzido artificialmente: farinha, sucos, ovos, leite, massas,
tudo factício. Tudo com a mesma periculosidade: é grande a probabilidade de
intoxicação e de cancerização. A expectativa de vida do brasileiro é de trinta e
cinco, quarenta anos. Proibiu-se, porém, a imprensa de tocar no assunto. O
único tema, aliás, da imprensa são os benefícios proporcionados pelo Esquema:
"tempestades de areia dignas de países desenvolvidos. Não temos mais de
invejar os furacões norte-americanos".
"As tempestades dizimaram o Maranhão e o Piauí. O deserto avançou para
o mar. Sergipe sofreu duas tempestades de lama, Aracaju foi soterrada. O mar,
lá, tem ondas de trinta, quarenta metros".

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NÃO VERÁS PAÍS NENHUM


Essa é a realidade imaginada por Ignácio de Loyola Brandão em seu
fascinante livro Não verás país nenhum, editado pela primeira vez em 1981.
Naquela época, pouco se falava de aquecimento global e ainda se acreditava
que os mananciais eram inesgotáveis. Hoje, já se sabe que corremos um risco
enorme de termos o Planeta deteriorado.
É preciso passar a ter condutas ecologicamente corretas para tentar
diminuir o impacto ambiental. Cada um de nós pode ajudar com atitudes
simples, como não jogar lixo nas ruas, não desperdiçar água, não pegar o
saquinho plástico para carregar as compras em farmácias e lojas de
conveniência. Eu já deixei de pegar uns mil saquinhos desde que passei a não
aceitá-los. Se cada um de nós fizer isso, quanto deixaremos de poluir? Ou será
preciso enfrentar a realidade imaginada por Ignácio de Loyola para passar a
agir?


FELIZ ANO-NOVO!

Esta é a época em que todos desejam felicidade e bem-estar aos demais.
Faça-o também, mas, se quiser respeitar as normas ortográficas vigentes,
escreva "ano-novo", cujo significado é "a meia-noite do dia 31 de dezembro" ou
o "dia primeiro de janeiro", com hífen. Feliz ano-novo a todos.


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