Estreias

Os planos de mamãe aos 80

11 mai 2006 às 16:58

Intimista, terno e decididamente emotivo é o que se pode dizer logo de saída a título de pré-definição deste ''Conversando Com Mamãe'', comédia agridoce argentina que entra no circuito local.

Modesto no formato, mas muito ciente de sua proposta humanista, o filme saiu do roteiro do veterano realizador portenho Santiago Carlos Oves, que adaptou peça teatral também escrita por ele há muitos anos. A novidade é que o autor incorporou à história algumas referências extraídas da difícil conjuntura sócio-econômica de seu país nos últimos tempos.


Assim, a estréia de ''Conversaciones com Mamá'', em Londrina, não é apenas homenagem do exibidor à data que se comemora domingo, mas também o convite a uma oportuna e tranquila reflexão sobre dois subtemas que permeiam o filme: a terceira idade, ou a ''melhor idade'', como vem sendo cada vez mais caracterizada esta fase da vida, e a ingerência da sempre vertiginosa montanha russa econômica desta América Latina nas relações entre pessoas, inclusive as familiares.


Os desmandos políticos e seus efeitos econômicos perversos na Argentina afetam também a vida do executivo Jaime (Eduardo Blanco). Uma pessoa correta, mas desorientada quando perde o trabalho. Ele percebe também que o casamento esfriou e que os filhos vivem um mundo bem diferente do seu.


Em busca de solução para sua crise profissional e pessoal, e como medida extrema, ele se vê obrigado a vender o apartamento onde mora a mãe octogenária (China Zorrilla), viúva, sozinha e apresentando os primeiros sintomas de Alzheimer, alguém que só quer a companhia e o carinho de quem queira sentar-se à mesa com ela.


E a mãe tem outros planos. Não só está vivendo uma grande paixão outonal com um aposentado idealista e revolucionário da melhor safra (Ulisses Dumont), como não pensa em deixar o imóvel. Retomando o aprendizado, agora com a velha mãe de coração jovem e no melhor da capacidade de ensinar, Jaime tem novas lições pela frente.


Apoiado em especial nas interpretações do trio de protagonistas e com uma direção que não despreza as origens teatrais do texto mas sem aprisionar a ação a um palco , ''Conversando com Mamãe'' coloca na mesa temas como crise pessoal, solidão e morte com sentido otimista e sempre em tom de esperança.


É uma pequena grande obra (apenas 80 minutos) que sabe afrontar temas sérios da vida sem ares solenes e, o que é melhor, sem perder o humor. Com a frescura que oferece boa parte do novo cinema argentino e com a esperta despretensão (e um orçamento visivelmente reduzido) de quem sabe exatamente o que quer, o diretor Santiago Oves realizou um filme que no entanto tem lá seus pequenos deslizes.


Como por exemplo, certa previsibilidade e certa complacência simplista quando se busca reforçar os nobres sentimentos dos personagens. São, de qualquer modo, desencontros a se relevar diante do conjunto amável e de fato comovente, que humaniza os personagens sem pieguice e adiciona à narrativa uma pertinente crítica à sociedade que segrega seus idosos e impõe a solidão como mal maior.

E uma palavra para estes atores estupendos. Ícones do teatro e cinema na Argentina e Espanha, e conhecidos no Brasil apenas pelos frequentadores do circuito alternativo, Eduardo Blanco, Ulisses Dumont e particularmente a veteraníssima atriz uruguaia China Zorrilla, que transborda humanidade.


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