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'Nina' transporta drama russo para São Paulo

Redação Bonde
16 dez 2004 às 17:24

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- Divulgação
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Longa-metragem de estréia do pernambucano Heitor Dhalia, ''Nina'' chegando às telas paranaenses. Porém, antes mesmo da estréia nacional, em 05 de novembro último, o filme foi exibido em festivais nacionais recentes, como a Mostra Internacional de São Paulo e o FestRio, e levou prêmios importantes em certames no exterior (melhor direção no Festival de Nova York e melhor fotografia no Peru).

O roteiro de ''Nina'' é do próprio Dhalia, a quatro mãos com o escritor Marçal Aquino, roteirista de um dos ícones da retomada, ''O Invasor''. A história é uma livre adaptação (e põe livre nisso) de ''Crime e Castigo'', de Fiódor Dostoievski, clássico cativo nas listas de obras imortais da literatura mundial.

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No filme, o personagem principal do romance, o estudante Raskolnikov, foi transformado em Nina, garota pobre e talentosa que se considera exatamente o oposto das pessoas ''ordinárias'' que habitam a teoria do protagonista do livro. Para Raskolnikov, há os ''ordinários'' e os ''extraordinários'', estes obviamente superiores àqueles. Nina se coloca entre os últimos.

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Como o anti-herói russo, Nina, interpretada pela atriz curitibana Guta Stresser (a Bebel de 'A Grande Família', neste filme vivendo uma amargura oposta da personagem do seriado), vive num quarto alugado no apartamento de Eulália (Miriam Muniz, ícone do teatro nacional), mulher velha, avarenta e exploradora - e porque não dizer 'ordinária', na concepção de Nina.

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O cenário é o centro velho de São Paulo. Onde Nina não pára em nenhum emprego, vai a festa movidas a bate-estaca eletrônico e se droga. Sem dinheiro para o aluguel, ela é humilhada por Eulália. E esta rotina distorce a realidade na cabeça da moça. Subjugada ao extremo, com requintes de sadismo, Nina é levada ao crime, entre desequilíbrios e alucinações. E como Raskolnikov no epílogo do livro, ela é levada a uma boa ação, inesperada, quase inexplicável.


Com poucos diálogos, a realidade sombria atinge proporções quase surreais, alteradas pela percepção de Nina. É sempre o ponto de vista da personagem que prevalece, suas ações guiadas pela paranóia. A criação de uma atmosfera de opressão, solidão e amargura da personagem é um dos pontos altos do filme.

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O que o espectador vê na tela é um estado psicológico alterado e materializado num delírio de imagens à maneira do expressionismo alemão, com o reforço de animação em preto e branco típicas das histórias em quadrinhos de Lourenço Mutarelli, paulistano expoente dos quadrinhos nacionais que até poucos anos atrás tinha a morbidez e a melancolia como fontes de criação. Características estas que caíram como uma luva nos inserts feitos pelo artista para o filme.


O diretor Dhalia e o co-roteirista Aquino assumem a busca de referências visuais na primeira fase de Polanski, no ''Iluminado'' de Kubrick, em David Lynch e nos irmãos Coen.

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Filme que parece bem mais caro do que é (R$ 2,5 milhões), ''Nina'' tem na direção de arte e na fotografia seus pontos fortes. Tudo o que se vê em cena veio de demolições, ressaltando o aspecto gasto e decadente do apartamento de Eulália. Grandes espaços, pé direito alto, corredores amplos, escadas em caracol, cores quase ausentes.


De certa forma, a estética foi conduzida pelo terror, o que resultou em clima de melancolia profunda. No bom elenco de ''Nina'' foram reunidos quase todos os grandes nomes do cinema brasileiro atual, entre nomes em ascenção (Ailton França, Guilherme Weber, Milhem Cortaz), jovens atores com nome já consolidado (Selton Mello, Mateus Nachtergaele, Lázaro Ramos, Wagner Moura) até veteraníssimos como Renata Sorrah e Abrahão Farc.

É interessante citar que o filme conta com três atores paranaenses. O número pode não ser grande mas é digno de citação pois não é muito comum reunir mais de um nome do estado no mesmo filme. Além dos já citados Guta Stresser e Guilherme Weber, há ainda a presença de Anderson Faganello, na cena mais engraçada (ou talvez a única engraçada) do filme.


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