No início de junho a besta apocalíptica invadiu as telas planetárias com o remake de ''A Profecia''. Desta vez chega ao circuito brasileiro ''Poseidon'', outra manifestação explícita da falta de oxigenação cerebral na maior indústria de entretenimento do mundo ou, na dúvida, vamos apostar na fórmula antiga travestida de século 21.
Há 34 anos, ''O Destino do Poseidon'' entrou para a história do cinema como o carro-chefe do filão catastrófico, o subgênero filme-desastre que por um bom tempo gerou preciosas divisas para o complexo de cinema californiano.
Naquele argumento, um grupo de personagens heterogêneos enfrentava imensa adversidade provocada por forças naturais em alto mar, onda gigante vira transatlântico de cabeça para baixo. Enquanto tentavam sobreviver como podiam, o publico ia conhecendo o drama pessoal de cada um, temperado com mais ou menos sentimentalismo à medida em que a morte chegava para um ou outro.
O mais impressionante daquela produção dirigida por Ronald Neame é sua razoável capacidade de sobrevivência ao longo destas três décadas revisto recentemente, permanece ainda com data de validade muito em função da consistência de seus personagens, já que os efeitos especiais, hoje risíveis, obviamente não resistiram aos muitos tsunamis tecnológicos.
A estrutura deste ''Poseidon'' não contraria a original. A história é conhecida. Logo de saída, o diretor Wolfgang Petersen (''O Barco'', ''Tróia'') introduz o grupo de personagens, que vão conviver com o espectador durante 99 minutos.
Kurt Russel é o ex-prefeito de Nova York que viaja com a filha e o noivo - os dois já estão casados mas o pai não sabe. Johs Lucas é o jogador que vem tentar a sorte no cassino no navio. Richard Dreyfuss é o arquiteto gay em crise afetiva, buscando o suicídio após desilusão amorosa. Jacinda Barret é a mãe que viaja com o filho pequeno. E a bela Argentina Mia Maestro é a latina que viaja para ver o irmão doente em Nova York.
Tudo isto importa muito pouco, porque logo aos dez minutos vem o desastre e a onda imensa já virou o navio. O grupo, que ainda inclui outros que vão morrer logo e cruelmente logo adiante, não confiará nas palavras do capitão e tentará chegar à superfície para buscar resgate, numa corrida de obstáculos que inclui água, fogo, travessias sobre abismos mortais e outras armadilhas que somente serão domadas por quem demonstrar força, engenho e pulmões à prova de tudo.
Não se pode poupar o diretor Petersen quanto à manipulação que faz de seus personagens, que aparecem e desaparecem de maneira tão caprichosa quanto arbitrária. Há uma evidente desconsideração para com os seres humanos, que vão sendo esvaziados pouco a pouco em sua dramaticidade, em nome de sequências meramente impactantes. A refilmagem resulta assim numa embalagem de luxo mas oca, pura casca sem recheio.