Estreias

'Gaijin - Ama-me Com Sou' é ponte afetiva

01 set 2005 às 10:31

Vem aí o centenário da imigração japonesa. 2008 será o ano ideal para 'Gaijin Ama-me Como Sou' sair em busca de novas platéias, fazer sua migração da tela grande para a telinha.

Esta idéia de Tizuka é antiga, ela apenas prefere não conversar agora sobre o assunto, neste momento em que o longa metragem está chegando para o julgamento do público, embalado por alguns dos principais prêmios obtidos no recente Festival de Gramado.


O lançamento em território nacional, uma semana antes do feriado da independência, é respeitável: são 120 cópias distribuídas em circuito de ponta, capitais e principais cidade do interior. Só depois de cumprida a trajetória nos cinemas é que será o momento de pensar na minissérie com carinho.


E o que agora deverá interessar ao espectador, especialmente o de Londrina, é estabelecer a ponte afetiva com esta saga que cobre um século difícil, de transições, passagens, lutas, perdas e conquistas. E que reconstitui momentos decisivos da curta história desta cidade.


Quando no ano passado Tizuka mostrou aqui seu filme ainda em estágio de ''work in progress'' e título provisório (''Gaijin 2''), faltavam complementos de pós-produção, retoques nas imagens, acabamentos diversos, acertos variados desde som até retoques de imagem.


Revisto agora há pouco em Gramado em sala lotada e no calor de uma competição acirrada, assim inteiro, acabado e afinal rebatizado como ''Gaijin Ama-me Como Sou'', o filme cresceu. Cresceu muito como produção que deixa sua marca de imponência e elegância, sua capacidade de explodir em imagens belíssimas captadas pelo sempre impecável Edgar Moura, mestre da iluminação.


O viés autobiográfico é evidente em ''Gaijin''. Mas não se trata de história de vida da cineasta. Ela não é personagem. Ou melhor, é também. Suas memórias de descendente direta dos primeiros imigrantes foram essenciais para a construção da trama e consequentemente para o resgate, para o seu acerto de contas.


A questão da afirmação da etnia em terra estrangeira, a forja da identidade, a força de uma tradição cultural reconhecidamente forte pesando como herança, o processo de adaptação em ambiente estranho e por vezes hostil, o papel social das mulheres issei, nissei e sansei esses os recortes propostos pelo roteiro de ''Gaijin Ama-me Como Sou''. Num certo sentido, Tizuka é um pouco Titoe, um tanto Shinobu, outro tanto Maria.


Este ''Gaijin'' é um enfático, generoso, emocionado às vezes até excessivo tributo às mulheres. Um tributo à condição feminina. Mas não é somente a questão feminina que está posta nesta história de ficção temperada pelo documento.


O filme constrói com afeto, perspicácia e inteligência a ponte entre o ontem e o hoje, entre as dificuldades daquele começo áspero e as aflições deste momento-recomeço, entre as primeiras e centenárias conquistas e a dura batalha de agora dos dekasseguis.


''Gaijin 2'' arma suas tramas familiares sem nunca perder de vista o contexto social e político das épocas que a narrativa atravessa. Identidade e cidadania, mesmo em circunstancias adversas e/ou conflituosas, são perseguidas (e afinal obtidas) como valores indispensáveis à plena realização individual e coletiva.


''Gaijin Ama-me Como Sou'' não está isento de problemas. Como dramaturgia, é evidente o ótimo andamento da primeira metade, especialmente apoiada pelo excelente elenco japonês. Tudo funciona a contento. É uma história poderosa, posta em cena com muita segurança e sensibilidade.


Mas progressivamente a narrativa perde o vigor e a credibilidade iniciais, e personagens essenciais à trama como Gabriel (Jorge Perugorria) e Maria (Tamlin Tomita) são com frequência flagrados em excessos acentuados por uma dublagem que artificializa os diálogos.


Mas há virtudes de sobra, entre elas o trabalho primoroso de Yurika Yamasaki na direção de arte. Ou a música sempre soberba de Egberto Gismonti, não inédita, aliás há muito composta. Mas é como se ela estivesse sempre ali, por longos anos à espera apenas das imagens de Edgar Moura.

''Gaijin Ama-me Como Sou'' não precisava de nenhum trunfo extra para se impor como um dos importantes lançamentos brasileiros de 2005. Mas se fosse preciso contar com uma carta na manga, uma coringa, ela atende pelo nome musical de Aya Ono e pelo apelido não menos sonora de dona Iaiá, tem quase 80 anos, delicados traços orientais, mora em Londrina, cultiva uma linda horta no quintal, é louca por karaokê, está estreando no cinema como atriz temporã e já colocou na cabeceira um dos mais cobiçados troféus do cinema brasileiro.


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