Estreias

Com grife, como o diabo gosta

22 set 2006 às 17:25

''O Diabo Veste Prada'' nasceu para ser exatamente o que é: uma sátira não muito cáustica e apenas amena à indústria da moda, um subproduto mais acessível do ''Prêt-à-Porter'' do diretor Robert Altman. Afinal de contas, a turma de criação por trás do filme reunia as credenciais para fazer exatamente isto, descartado qualquer rasgo mais forte de personalidade - vale dizer, independência - para transformar o filme num mordaz e apimentado desfile de críticas mais contundentes ao universo de passarelas e bastidores - é bom não esquecer que a louvação à grife já é parte do próprio título, cuja tradução mundial segue à risca o original.

O argumento é baseado no livro de Laura Weisberger (ex-assistente da poderosa Anna Wintour, editora da mitológica revista de modas Vogue), e por isso é de se supor que contenha, senão inteiras, pelo menos meias verdades sobre este império mundial de glamour comandado por criadores e infestado de criaturas. E para a direção foi escalado David Frankel, um veterano televisivo com extensa bagagem em séries como ''Entourage'', sobre o meio artístico, e ''Sexo e a Cidade'', uma sátira das relações modernas.


Andy Sachs (Anne Hathaway) é a jovem otimista que procura emprego como jornalista em Nova York. Apesar de desconhecer totalmente as engrenagens da feira das vaidades que é o mundo da indústria da moda - é ingênua, lerda e jeca para os padrões da ''haute couture'' é contratada como subassistente de Miranda Priestly (Mery Streep), fria, megera, ambiciosa, implacável editora da revista ''Runway". É da atribulada convivência entre ambas que o roteiro se nutre. É o conflito entre tolerância zero e a determinação de aprender. Este embate já rendeu coisa melhor, em outros contextos. Mas este não é o empenho do filme, portanto...


Há bons intérpretes em geral, como Stanley Tucci fazendo um dos editores de moda, mas Meryl Streep surge como o fiel que desequilibra a balança. Com impecável técnica, a melhor atriz do cinema americano só não oferece mais do melhor porque o roteiro não exige nada além da credibilidade emocional que ela empresta à personagem. É particularmente notável (e mais uma vez oscarizável...) este seu trabalho rico em filigramas de estudada e solitária sobrevivência num segmento onde estão todos à beira de um ataque de nervos e do abismo do descarte imediato.


O filme é de fórmula, claro, mas feito com inteligência e bom gosto acima dos padrões vigentes em Hollywood. E não é desprovido de charme. O roteiro às vezes é previsível e às vezes não, mas faz a coisa certa ao evitar a ''cinderelização'' da garota assistente e a conversão da editora em bom caráter. Cada uma, a sua maneira, prova o remédio da outra, mas ninguém cria dependência.

''O Diabo Veste Prada'' é filme para aquela tarde ociosa, com pipoca plenamente justificada.


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