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A mãe de todos os absurdos

Carlos Eduardo Lourenço Jorge - Folha de Londrina
06 jan 2006 às 10:02

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- Divulgação
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Entra em circuito nacional um filme a ser visto com atenção e cuidado. É ‘Soldado Anônimo’, terceiro e mais uma vez bem sucedido exercício de Sam Mendes como diretor, depois da estréia consagradora com ‘Beleza Americana’ e do ainda melhor ‘Estrada para Perdição’.

Parte da crítica mundial não tem gostado do filme. A alegação é de que ele não faz muito sentido, e que por isto não teria razão de existir. Mas o que parece falha na verdade é virtude, uma entre outras que o filme oferece.

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Em 1989, o jovem Anthony Swofford (Jake Gyllenhaal) se alista nos Marines seguindo o exemplo do pai, veterano da guerra do Vietnam. Após um período de treinamento puxado e humilhante, Swofford e outros recrutas são enviados à Arábia Saudita para combater as tropas de Saddam Hussein que invadiram o Kuwait.

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Estacionados do deserto, os soldados esperam com impaciência o início das hostilidades. Para matar o tempo, jogam futebol sob sol escaldante e debaixo de máscaras contra gás, se entregam a discussões intermináveis sobre nada em particular ou então organizam combates entre escorpiões.

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‘Jarhead’ começa com a tela em negro e com a voz de Gyllenhaal expressando os sentimentos do personagem que é real: o filme é baseado no best-seller homônimo que Swooford escreveu sobre suas experiências no Oriente Médio, sobre a Guerra do Golfo.


Ele explica o significado da palavra ‘jarhead’, como os marines chamam uns aos outros. É cabeça de jarra, no sentido de que uma jarra está vazia e porque os soldados devem ficar assim, vazios de sentimentos. Para que nenhuma saudade ou nenhum abuso dos superiores ou nenhum castigo do meio ambiente hostil possa virar uma enfermidade mental.

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Aqui, a vida no acampamento não provê o idílico microcosmo da América mostrado nos velhos filmes sobre a Segunda Guerra Mundial. O que há é uma coleção de jovens confusos, irados e sexualmente frustrados, que não entendem nada do que vêem enquanto assistem ‘Apocalypse Now’ e morrem de tédio antes de morrer na batalha.


Raramente trabalhada nos filmes de guerra, a jovialidade destes marines é enfatizada a tal ponto que, quando os superiores se dirigem a eles – o sargento sardônico (Jamie Foxx) ou o belicoso coronel (Chris Cooper) – é facilmente reconhecível o enorme esforço de adultos tentando fazer-se entender por crianças.

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‘Soldado Anônimo’ assume estranha neutralidade, enganosa neutralidade em relação ao conflito bélico – ou a qualquer conflito, a qualquer tempo – que relata. Trata-se de uma extremada apresentação de fatos, ou não-fatos, tão estranha e aparentemente tão inexpressiva que tudo parece à beira do surreal.


Diante dele, o espectador vai entender porque livros e filmes são, com tanta freqüência, satíricos ou fantásticos. Justamente porque a experiência por que passa Swofford não tem uma lógica interna, o filme avança em uma série de incidentes que levam à guerra. A perspectiva do filme é a de Swofford – confusão, ambivalência. E qualquer guerra não é a um só tempo confusa ou ambivalente?

‘Soldado Anônimo’ explode com o mito do guerreiro nobre. O filme também sugere que uma nação depende deste mito e de seu apelo para certas pessoas mais impressionáveis. Há momentos de humor, referências ao ‘Franco Atirador’ de Michael Cimino e a ‘Nascidos para Matar’ de Kubrick, mas ‘Jarhead’ não é criticamente antibelicista naquela medida, já que Sam Mendes prefere trilhar a surrealidade. No que também está certo, na lógica da insanidade.


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