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Quase obra-prima

Em 'A Qualquer Custo' bancos também têm um nefasto protagonismo

Carlos Eduardo Lourenço Jorge - Grupo Folha
01 fev 2017 às 17:19

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- Reprodução
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"A Qualquer Custo", um dos nove eleitos da safra 2016 para a noite das estatuetas, daqui a um mês, é uma delicia de ver. É um thriller contemporâneo, ágil, bem calibrado, um neo-western, um filme que fala do complexo mundo moderno, da injustiça e do crime que ela provoca através de uma história clássica de ladrões e polícia.

O ótimo roteirista Taylor Sheridan ("Sicario") se mostra muito lacônico em sua trama narrativa, tão econômico em explicações (de resto desnecessárias) como felizmente avarento ao descrever o território onde habitam seus personagens.

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Gente dura, almas empedernidas como os dois irmãos (Ben Foster e Chris Pine), cujos problemas que os levaram ao crime são descritos com conta gotas, a tempo e hora. E o mesmo ocorre com a relação temperada pelo humor negro entre os dois policiais, Marcus (Jeff Bridges) e Alberto (Gil Birmingham), respetivamente o veterano com olfato e quase aposentado e o fiel mas desiludidos mestiço cumpridor do dever. Quatro vidas que se cruzam e se enfrentam no Oeste do Texas.

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Os irmãos Tanner e Toby Howard traçam um plano de atacar agências do Texas Midland Bank. Eles se veem obrigados aos roubos para conseguir o valor da hipoteca quase vencida de sua falecida mãe, sob pena de perder o modesto rancho onde ela vivia. E que agora tem petróleo no subsolo, o que faz com que o banco queira executar imediatamente a hipoteca. O mais velho acaba de sair do presídio. O caçula está sem emprego e separado da mulher que ficou com os dois filhos. Os roubos ocorrem a trancos e barrancos; o dinheiro obtido é lavado num cassino localizado numa reserva comanche – obviamente o fato não é gratuito e é parte da metáfora.

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A ação do filme se situa numa região empobrecida e deprimida (nem podia ser de outra maneira, porque as reservas indígenas foram ali localizadas, em territórios paupérrimos). E os protagonistas se converteram em foragidos por causa de sua miséria econômica e situação social. Neste sentido, fazem lembrar aqueles gangsteres rurais dos tempos da Grande Depressão (Bonnie and Clyde e adjacências) que surgiram em grande número nos estados agrícolas onde os camponeses perdiam suas terras por não poderem pagar os empréstimos bancários. Evidentemente o filme busca estabelecer um paralelo entre aquela crise dos anos 1930 e a atual, na qual os bancos e suas práticas financeiras também tiveram um nefasto protagonismo.


Dirigida pelo escocês David Mackenzie, "Hell or High Water" se desenrola com invejável eficácia e rapidez narrativa, aquilo que chamamos de ritmo, com uma fluidez digna herdeira do cinema clássico, vale dizer, narra e descreve os personagens simultaneamente (o quarteto central se explica pelo que fazem, não pelo que dizem).

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A inspiração e a atmosfera vem muito da ambientação dos irmãos Cohen e da literatura de Cormac McCarthy. Assim, não sobra e nem falta nada no filme; e se há alguma coisa de menos talvez seja aquele plus que converte uma obra notável em obra-prima. Mas fica muito perto de ser.


Irretocável, a direção de atores, com foco privilegiado no veterano Jeff Bridges e no outlaw vivido por Chris Pine. E há ainda muito a desfrutar, como a atmosfera inundada pela luz dourada do sol ao nascer e nos últimos vestígios da claridade; a ação, que dosa violência previsível ou repentina, além do humor que não abandona a sugestão da tragédia iminente.


A trilha musical de Nick Cave e Warren Ellis, não nominada ao Oscar, é excelente, e com certeza uma das melhores partituras originais da temporada passada, mescla eclética e trepidante, casada de cama e mesa com o ritmo da narrativa.

Em tempo: mais uma cópia à disposição. E não nas salas da cidade.


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