Maravilhas arquitetônicas da cidade do Cairo, no Egito, estão sendo abandonadas ou demolidas para dar lugar a arranha-céus - uma nova realidade em uma cidade que já foi conhecida como "a Paris do Egito".
No subúrbio de Heliopolis, desenvolvido a partir de 1908, mansões e palacetes enchiam os olhos dos visitantes. Em outras áreas da cidade, como a elegante Ilha de Zamalek, no Rio Nilo, a ousadia e experimentalismo do período produziu construções que eram verdadeiros palácios, onde se reunia a alta sociedade egípcia.
O estilo arquitetônico, síntese de influências europeias e orientais, refletia a autoconfiança que o país vivia. "A abertura da vida comercial, a abertura da indústria, a abertura da própria cultura criaram este sonho nas pessoas, de construir essas obras", diz à BBC a arquiteta Mona Zacharia, envolvida em projetos de restauração na cidade. Muitas das joias arquitetônicas do Cairo, no entanto, se perderam para sempre.
Ruínas
Nagwa Shoeb, nascida no bairro de Heliopolis, aponta o local onde passou sua infância e juventude. "Este é o lugar, eu sinto vergonha em dizer, onde ficava nosso casarão, com um lindo jardim onde cresci com meus irmãos e irmãs." O que aconteceu desde a década de 1950 foi o crescimento do Cairo como uma cidade feia. E se uma cidade é feia as pessoas não tomam conta dela.
O tempo passou, os filhos se mudaram. A mãe de Shoeb, já idosa, também teve de deixar o casarão e o prédio foi demolido. Hoje, o que se vê no local é um arranha-céu feio, desfigurado pelos aparelhos de ar condicionado instalados nas paredes externas. No térreo, lojas de moda feminina exibem anúncios extravagantes. Essa história vem se repetindo em toda a cidade.
Angus Blair, um britânico que vive no Cairo há mais de quatro anos, acha que o declínio começou com uma onda de nacionalizações que sucedeu a revolução de 1952. "O que aconteceu desde a década de 1950 foi o crescimento do Cairo como uma cidade feia", diz Blair. "E se uma cidade é feia as pessoas não tomam conta dela". Assim, as famílias que viviam nos belos casarões foram aos poucos vendendo suas casas, geralmente por razões financeiras.
Ultimamente, o governo vem adotando medidas para conservar o patrimônio arquitetônico da cidade. Uma dessas medidas é proibir a demolição dos casarões. Como resultado, os que não conseguiram vender suas casas abandonam as propriedades, esperando que um dia desabem. Hoje, em um dos mais espetaculares palacetes de Zamalek, a vegetação chegou à altura do teto.
Samir Gharib, presidente da Organização Nacional para a Harmonia Urbana, uma iniciativa financiada pelo governo egípcio, vem trabalhando para persuadir a população a valorizar mais seu patrimônio. Mas ele admite que há grande questões financeiras em jogo.
"É muito mais lucrativo para os proprietários construir um prédio novo do que manter o velho. Temos de tornar as construções antigas lucrativas, economicamente, para os proprietários", ele explicou.
Mas ele diz que o governo não pode arcar com os custos financeiros desse processo. O britânico Blair acha que o problema é a falta de "imaginação e criatividade". Cerca de 20 milhões de pessoas vivem no Cairo hoje. Para a maioria, preservar o passado arquitetônico da cidade não é uma prioridade. Mas se o Cairo quiser redescobrir e se beneficiar do seu passado recente, construtoras privadas e o governo terão de trabalhar juntos.