Nada se compara ao conforto do lar. A frase que simboliza o imaginário popular sobre habitação nem sempre pode ser considerada uma verdade. As casas que não aplicam o conceito de funcionalidade no seu planejamento são verdadeiros fornos no verão e geladeiras no inverno. Quem nunca ouviu um conhecido se queixar que morre de calor durante os dias quentes, mas que congela dentro da própria casa nos dias frios?
Para evitar esses inconvenientes, arquitetos fazem um estudo minucioso sobre as condições climáticas, pluviométricas, de incidência dos raios solares, corrente de ventos, entre outros detalhes que auxiliam na elaboração de um projeto arquitetônico funcional.
De acordo com a arquiteta, Marize Cecato, é preciso realizar um levantamento profundo de todos os elementos que incidirão na obra para aproveitar cada um desses elementos naturais a favor do proprietário. ''Mediante uma análise completa detectamos as melhores formas de utilização da luz do sol, ventilação natural e vegetação local, reduzindo, por exemplo, o uso de climatização artificial'', explica.
No caso de Londrina, uma cidade que registra maior ocorrência de dias quentes do que frios, a arquiteta trabalha com a média predominante para conter o calor, diferentemente de Curitiba onde a predominância de dias frios é maior do que de dias quentes.
''Isso deve ser levado em consideração na hora de planejar uma obra. Enquanto em Londrina eu procuro não projetar os quartos para a face oeste para não receberem a maior incidência solar durante o dia esquentando os ambientes, em Curitiba já é recomendado utilizar esse recurso para mantê-los aquecidos por mais tempo'', evidencia Marize.
Quando a posição dos ambientes não atende prontamente à idealizada pela profissional, é possível conter o calor ou até mesmo o frio provenientes da parte externa apenas construindo paredes duplas que formam um colchão de ar como isolante térmico da obra. As construções mais modernas já lançam mão dessa técnica para não aquecerem ou resfriarem os ambientes de acordo com as oscilações climáticas. Dessa forma é possível conter o uso de ar condicionado e de calefação.
Os materiais priorizados nas construções modernas nem sempre colaboram para a climatização natural do ambiente. Porcelanato (piso frio), vidro, gesso e persianas, apesar de estarem no topo das preferências daqueles que investem em construções atualmente, não agem como isolantes térmicos. ''O Paraná possui grande oferta de madeira, um elemento que atua como isolante térmico em toda obra. No entanto, ela não tem sido muito requisitada devido ao trabalho da sua manutenção e também por estar fora da tendência atual, que preza pelo clean, uma casa que abre mão até mesmo do uso de tapetes'', comenta a arquiteta.
Como solução para esses projetos clean, Marize recomenda que nos dias de baixa temperatura os proprietários recorram a tapetes e cortinas de tecidos pesados que ajudam a conter o frio proveniente do ambiente. ''A tendência atual é muito bonita, enche os olhos, mas é muito pouco funcional. O segredo da arquitetura está em saber atender o pedido do cliente, apresentando-lhe as soluções para esses pequenos inconvenientes'', alerta, lembrando que ninguém quer investir grandes somas em uma obra para depois ficar refém de climatização artificial como ares-condicionados ou aquecedores.
A vegetação também é um elemento utilizado pela arquiteta para contribuir no controle térmico e isolamento acústico dos recintos. As árvores servem como barreira para os raios incidentes do sol, evitando o aquecimento dos ambientes. Já no inverno, ao perder suas folhas, as mesmas árvores possibilitam a passagem desses raios de sol permitindo o aquecimento natural do local. Biombos de árvores também auxiliam na vedação de ventos.
Sustentabilidade anda na contramão das tendências
Um projeto funcional tem como princípio a sustentabilidade da obra. Ao reduzir-se a utilização de luz artificial em favor da iluminação natural, de condicionadores de ar por ventilação natural, de aquecedores de água elétricos ou a gás pela energia solar se contribui para a preservação dos recursos naturais.
O mercado da construção civil disponibiliza uma infinidade de recursos sustentáveis propícios para transformar as obras em perfeitos santuários ecologicamente corretos. Os aquecedores solares e os coletores de água da chuva são apenas alguns dentre os inúmeros mecanismos existentes. No entanto, nem sempre a sustentabilidade caminha de mãos dadas com as tendências propagadas por alguns setores.
Enquanto a sustentabilidade prega pela economia de luz elétrica, há quem apresente ideias de ambientes que levam inúmeros pontos de luz meramente decorativos. ''Muitas vezes, um ambiente com vários pontos de luz não produz uma iluminação adequada para a leitura pois essa iluminação é difusa'', comenta a arquiteta Marize Cecato.
Hoje em dia são solicitadas, além da iluminação funcional para os ambientes, a dirigida para leitura, a decorativa e a de segurança. O que antes se traduzia em um único ponto de luz instalado bem ao centro dos cômodos, agora se divide em pontos de luz dispersos por todo ambiente. É a inovação andando na contramão da sustentabilidade.
Marize comenta que não é possível frustrar os planos de um cliente que idealizou o ambiente com diversas luzes presentes. No entanto, ela dá uma dica importante que contribui na hora da utilização consciente desta iluminação. ''É preciso separar os interruptores das luzes funcionais e das decorativas. Assim, a pessoa acende a luz de acordo com a sua necessidade e não precisa acender todas de uma vez pois não estão em sistemas interligados nem em interruptores próximos uns dos outros'', recomenda.
Um exemplo de projeto construído levando em consideração os fundamentos da sustentabilidade mas ressaltando as tendências atuais de designer é a obra presente no Resort Aguativa Privilege, desenvolvido por Marize. A obra em questão utilizou vidros e porcelanato, combinados com tijolos, madeira e telhas de cerâmica. Nas áreas sociais o vidro faz a comunicação com a vegetação externa.
''Colocamos cortinas pesadas para atuar como isolante térmico desses vidros em dias mais frios'', comenta. Os quartos possuem tapetes para amenizar a sensação térmica do piso frio e a janela do quarto leva um breeze (estrutura de madeira que reduz a incidência dos raios de sol). No deck externo foi projetada uma cobertura deslizante de policarbonato (vidro sintético) que permite a utilização do espaço mesmo em dias de chuva. Para completar, ainda foi implantado um coletor de água da chuva para reaproveitamento no próprio jardim do empreendimento.
Entre o que dita a tendência e o que prega o sustentável, os arquitetos vão projetando suas obras de arte, sempre atentos às solicitações de seus clientes. ''O exercício da arquitetura está em aliar o lado funcional ao estético, achando o equilíbrio perfeito entre esses dois meios. Se pendemos só para o sustentável não agradamos completamente. Se pendemos só para o estético, deixamos de aplicar conceitos fundamentais de preservação e interação com o ambiente. O equilíbrio é o mais indicado para agradar a todos os envolvidos'', reflete a arquiteta.