A jovem Thainá Bitencourt, de 23 anos, mulher trans, foi brutalmente agredida e estuprada na madrugada de segunda-feira (14) em Jacarezinho (Norte Pioneiro). O ataque ocorreu por volta das 5h30 da manhã, nas proximidades da estrada da Vila Rosa, enquanto a vítima retornava da Fetexas, evento tradicional do município.
Em entrevista ao Portal Bonde nesta sexta-feira (18), Thainá contou que tudo começou após recusar a carona de um motorista que oferecia um transporte alternativo, conhecido como "Uber de 10" - em referência ao valor pago pela viagem.
"Havia uma fileira de vans, mas uma perua [veículo de carga] insistiu em me levar, e eu recusei, porque ia na van da frente. Então, segui na van e desci na praça central da cidade, porque para chegar no sítio da minha mãe é um pouquinho mais longe. Essa mesma perua que me abordou lá em cima me abordou novamente. Acho que me seguiram. Eles me fizeram a mesma proposta, e eu aceitei", disse.
Prestes a chegar ao sítio de sua mãe, Thainá percebeu movimentações suspeitas que a fizeram pedir para sair do veículo. "Dentro da van havia outros dois homens. Depois de um tempo, começaram com a maldade. Um puxou o meu braço para trás e o outro a minha saia. Começaram a gritar que eu era homem, não mulher. Gritei e pulei da perua."
A emboscada foi concluída ainda na estrada. Os agressores abordaram a vítima novamente e exigiram a bolsa e o celular dela. Com a recusa, um deles a atingiu por trás na cabeça com uma pedra, enquanto os demais passaram a agredi-la violentamente com pedaços de madeira. Um dos homens a enforcou, enquanto o outro desferiu repetidos golpes pelo corpo. Em seguida, a arrastaram para uma valeta às margens da estrada.
"Gritavam 'mata que é homem'. Depois de apanhar muito e perder as forças para reagir, eu parei e fingi que estava morta. Então, começaram a gritar 'chega, já tá morta' e me jogaram na valeta", relata. Na fuga, os agressores abandonaram diversos objetos pessoais no local, como tênis, celular, blusa e boné. "Deixaram a minha bolsa e os meus pertences também. Eles não vieram com a intenção só de me assaltar, queriam me matar."
Mesmo com ferimentos graves, ela conseguiu se deslocar até as proximidades da casa da mãe, sendo encontrada no caminho por seu padrasto, que a levou ao hospital.
Polícia investiga
A reportagem entrou em contato com a Delegacia da Mulher de Jacarezinho, que atendeu a jovem após o crime. De acordo com a delegada Carolinne Fernandes, o caso está sendo investigado sob sigilo para que os suspeitos não sejam beneficiados com informações.
"A Polícia Civil já tem um suspeito identificado, mas não podemos dar mais informações para não atrapalhar as investigações. O procedimento está bem adiantado, mas dois ainda precisam ser identificados."
Fernandes reiterou que o crime chocou a população local pela violência e o ineditismo no município. Segundo ela, o ato foi tipificado em três crimes diferentes.
"A questão da transfobia sempre existiu aqui, mas tentativa de feminicídio não. Esse caso foi tipificado como tentativa de feminicídio, estupro e racismo, porque a jurisprudência decidiu que a prática de transfobia é equivalente à de racismo. E eu nunca tinha atendido um crime como esse aqui", afirmou Fernandes, explicando que o estupro também é entendido como qualquer ato libidinoso - com consumação sexual ou não - sem consentimento.
Amparo no momento certo
Thainá relatou à reportagem que se surpreendeu pelo tratamento dado pela polícia na ocasião. Ela garantiu que foi acolhida desde o princípio. A jovem também foi "abraçada" pela ONG (Organização Não Governamental) Núbia Rafaela Nogueira, que atua em Jacarezinho em defesa da comunidade LGBTQIAPN+ há 7 anos.
"A ONG foi maravilhosa e fez a principal parte para mim. Eles estiveram à frente e me deram voz. Me ajudaram com psicólogo e tratamentos. Eles têm que ser reconhecidos também, porque o acolhimento foi maravilhoso. Só fiquei calma depois de ouvi-los e receber ajuda. Percebi que não estou sozinha", salientou Thainá.
O fundador e diretor-presidente da ONG, Diego Babinski, que também é amigo íntimo da vítima, destacou que, ao longo de todo o período de serviços prestados, nunca viu um caso tão hediondo no município.
"Não esperávamos esse crime. Nós, LGBTs, sempre vivemos com medo, mas sempre tivemos boas relações aqui. Recebemos incentivos da prefeitura. A sede fica numa antiga unidade básica de saúde e é mantida pelo Executivo." Para ele, o crime reflete o preconceito que ainda é latente na sociedade. "Esse episódio nos pegou de surpresa, porque aqui as pessoas conhecem o nosso trabalho e sabem que a transfobia é equiparada ao crime de racismo. É um crime de transfobia porque não levaram nada dela. Ficamos perplexos com a brutalidade."
A instituição, agora, trabalha para levar Thainá de volta ao posto de que nunca deveria ter sido tirada, de mulher livre, independente e com direitos na sociedade, assim como qualquer cidadão. "Tudo isso trouxe um start para ela como indivíduo, porque ela reconheceu que precisa voltar para a escola. Fomos ontem fazer a matrícula dela no supletivo. Vamos tentar corrigir a falta de oportunidade", disse Babinski.
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