Polícia

OAB faz campanha para engajar homens na luta contra a violência de gênero

06 dez 2025 às 16:56


Os números de feminicídios tentados e consumados no Brasil estão em crescimento. No primeiro semestre de 2023 foram 1.457 casos, no mesmo período de 2024 aumentou para 2.527 ocorrências e entre janeiro e junho de 2025 saltou para 2.978. Em dois anos, a alta foi de mais de 104%, segundo levantamento feito pelo MBF (Monitor de Feminicídios no Brasil) e pelo Lesfem (Laboratório de Estudos de Feminicídios), da Universidade Estadual de Londrina.


Nos primeiros seis meses deste ano, em média 5,2 mulheres morreram e 11,2 sofreram tentativa de feminicídio em todo o país. No ranking que soma as tentativas e as mortes, o Paraná ocupa a quinta colocação, com 179 casos. O Estado fica atrás de São Paulo, que lidera com 529 casos, Minas Gerais (200), Bahia (199) e Rio Grande do Sul (187).


A maioria dos crimes praticados contra mulheres que resultaram em morte foi cometida por parceiros íntimos da vítima, atuais ou antigos, ou seja, namorados, maridos, casais em união livre ou ex-namorados, ex-esposos, ex-casais e ex-companheiros. Entre as mulheres assassinadas, 32,9% tinham entre 25 e 34 anos de idade.


O MBF registra os casos consumados ou tentados ocorridos em todo o território nacional por meio do levantamento de notícias veiculadas na internet e monitoradas pelo Lesfem, o que indica que os números reais podem ser ainda maiores, uma vez que nem todos os crimes dessa natureza ganham espaço nos noticiários.


O Lesfem não traz o recorte por município, mas um levantamento feito pela OAB Londrina (Ordem dos Advogados do Brasil) mostra que a cidade acompanha a tendência de crescimento dos casos de violência de gênero. Somente em 2025, 3.243 novas ocorrências desse tipo deram entrada na Justiça em Londrina até agora. Atualmente, há 6.432 processos em tramitação. Também neste ano, foram solicitadas 3.723 medidas protetivas e 2.035 foram concedidas. São quase quatro mil mulheres londrinenses que se sentiram ameaçadas por um homem e recorreram à Justiça para tentarem preservar as suas vidas, mas pouco mais da metade conseguiu a proteção. "São números mentirosos porque muitas mulheres sofrem violência e não têm coragem de denunciar, sofrem caladas", disse o presidente da OAB Londrina, Mário Sérgio Dias Xavier.


A legislação brasileira para punir os casos de feminicídio é rigorosa e reconhecida internacionalmente como uma das mais avançadas do mundo. A Lei Maria da Penha, que leva o nome de uma das vítimas sobreviventes e protagonista de um dos casos de tentativa de feminicídio mais bárbaros que se tem conhecimento no país, está em vigor desde 2006, mas não tem sido suficiente para impedir a violência de gênero, que vem escalando ano a ano.


No último domingo (30), os brasileiros ficaram estarrecidos com mais uma tentativa de feminicídio no qual Tainara Souza Santos, de 31 anos, foi atropelada e arrastada por cerca de um quilômetro pelo asfalto da Marginal Tietê, em São Paulo. O agressor foi Douglas Alves da Silva, de 26 anos, com quem a vítima já havia se relacionado. A mulher teve as duas pernas amputadas, já passou por quatro cirurgias e segue internada. É mais um caso emblemático de violência contra a mulher entre tantos já noticiados.


Diante do aumento dos dados estatísticos, a OAB Londrina, acompanhando a mobilização encampada pela OAB Paraná, realizou neste sábado (6), no Calçadão de Londrina, a Campanha Laço Branco que tem como objetivo engajar os homens na luta pelo fim da violência contra a mulher. A ação que surgiu em 1989 no Canadá e se espalhou por diversos países acontece no dia 6 de dezembro e, no Brasil, uma lei federal sancionada em 2007 instituiu nessa data o Dia Nacional de Mobilização dos Homens pelo Fim da Violência contra as Mulheres.


Em Londrina, associados da seccional local da OAB entregaram aos homens que passavam pelo Calçadão um panfleto com esclarecimentos sobre violência contra a mulher, canais de denúncia e um bombom de chocolate branco em alusão à campanha. Na abordagem, os advogados também lembravam sobre a importância do posicionamento dos homens nos casos de agressão que acontecem em seu círculo social.


"A gente não pode ficar só no campo jurídico da proteção. Isso é uma doença social, a violência contra a mulher. Então, o esclarecimento do agressor em potencial é muito importante. A campanha Laço Branco mobiliza os homens para se posicionarem na luta pelo fim da violência contra a mulher. Pegamos essa campanha internacional e fizemos um dia no Paraná, em todas as subseções, direcionada aos homens", explicou Xavier. "A intenção não é só evitar que eles pratiquem a violência, mas sim para se engajarem nessa luta, fazendo denúncias."

Mudança cultural

O presidente da OAB acredita que apenas com a mudança cultural os índices de feminicídio no país podem começar a cair e uma das mudanças passa pela derrubada da crença de que em briga de marido e mulher ninguém deve meter a colher. "Infelizmente esse é um tipo de violência democrático, que atinge mulheres de todas as classes sociais. E só vai acabar quando houver a conscientização masculina. E os homens devem denunciar os casos de agressão."


Entre os abordados na campanha deste sábado que foram ouvidos pela reportagem, todos se manifestaram favoravelmente à inclusão dos homens nessa mobilização e condenaram as práticas violentas contra as mulheres. Mas ficou claro que os motivos que os levam a evitar as agressões estão mais associados à manutenção da sua própria liberdade do que à integridade física delas.


"Quando meu casamento acabou, pensei em ir atrás dela. Mas aí eu percebi que eu ia acabar com a minha vida", disse o aposentado Eduardo Neves de Azevedo. Ele contou que já conviveu com casais em que a mulher sofria agressões, mas afirmou nunca ter interferido. "É complicado porque a gente vai se meter e pode morrer. O certo é mesmo chamar a polícia."


Sobre a campanha Laço Branco, o aposentado apoiou a iniciativa. "Pode dar certo porque só as mulheres, sozinhas, não conseguem acabar com a violência. Direcionando para os homens, abrindo a mente deles, quem sabe alguns começam a ter mais noção do quanto é errado isso."


"Os homens devem respeitar o direito das mulheres, o direito de igualdade e de gênero porque elas têm o livre arbítrio para irem aonde quiserem. São independentes dos homens. Se um casamento não deu certo, cada um vai viver sua vida. E o homem que souber de um caso de agressão deve aconselhar a não fazer isso porque, hoje em dia, o que está dando mais cadeia é agressão contra a mulher e pensão alimentícia."


Nenhum homem entre os que conversaram com a reportagem admitiu já ter praticado algum tipo de violência contra a mulher, mas muitos relataram ter em seu círculo familiar ou de amigos pessoas com esse histórico.

Vítimas da violência

Quando a escuta se volta às mulheres, no entanto, é fácil encontrar entre elas casos de violência de gênero. "Eu já sofri, minha irmã já sofreu. Minha irmã sofreu violência física, teve o osso da face quebrado. Eu fui com ela à polícia para denunciar. Eu não sofri violência física, mas tive um companheiro que insistiu para que eu viajasse e quando voltei, ele tinha levado a amante para dentro de casa e queria que eu ficasse vivendo com ele e a amante. Na época, na década de 1980, não sabia que isso era um tipo de violência", relatou a aposentada Cleide Oberle. 


A OAB Londrina aproveitou a campanha para divulgar também o projeto Gama, de apoio às mulheres advogadas vítimas de violência. O projeto oferece apoio clínico, psicológico e jurídico. "Nós prestamos, através do Gama, assistência jurídica gratuita em processos, investigações e inquéritos de violência contra a mulher advogada. Além dos canais normais, junto às forças públicas, elas podem denunciar à OAB e pedir assistência gratuita. A gente também convoca o poder judiciário a toda vez que identificar uma vítima de violência que seja mulher advogada, para comunicar a ordem para a OAB poder fazer essa intervenção", ressaltou Xavier.


Para as mulheres agredidas que não estão na advocacia, há várias instituições que oferecem assistência gratuita, inclusive OAB, por meio da advocacia dativa, voltada a quem não tem condições de contratar um advogado.


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