Uma pequena orquídea de flores verdes foi descoberta por um pesquisador da UFPR (Universidade Federal do Paraná) durante uma trilha na Serra do Mar, próximo ao Pico do Paraná. Entretanto, ela pode ser enquadrada como em perigo de extinção.
O botânico Mathias Engels contou, para a Ciência UFPR, que nem imaginava se tratar de uma nova espécie de planta quando a coletou. E esse não foi o único caso, já que, durante suas expedições botânicas em diferentes regiões do Brasil, Engels já coletou mais de dez mil amostras para coleções científicas, que depois foram separadas em pequenas porções que acabaram sendo reconhecidas como novas.
Esse foi o caso da orquídea, encontrada em Campina Grande do Sul, município na Região Metropolitana de Curitiba. Apesar de já ter sido encontrada em 1947 pelo botânico curitibano Gerdt Hatschbach, na região do município de Piraquara, também no Paraná, na época da descoberta o material coletado não era suficiente para ser reconhecido como uma nova espécie.
Em 2019, a coleta de Engels, 72 anos após a de Hatschbach, permitiu o reconhecimento e a descrição completa da planta, que depois foi depositada no Herbário UPCB do Departamento de Botânica da UFPR e pesquisadora pelo grupo "Sistemática e Ecologia Molecular de Plantas", sob cordenação de Eric de Camargo Smidt.
Como resultado, a pesquisa descobriu que a espécie pertence à família de orquídeas do gênero Malaxis e, agora, foi batizada como Malaxis engelsii, em homenagem ao pesquisador Mathias Engels.
Apesar de recém-descoberta, na avaliação dos cientistas a espécie Malaxis engelsii está apta a ser enquadrada pelo sistema da IUCN (União Internacional para Conservação da Natureza) como “em perigo”, baseado no número de registros da espécie, da qualidade e da abrangência de seu habitat.
Smidt explica que, de modo geral, isso significa a necessidade de medidas de conservação para esta espécie, seja protegendo o habitat, seja produzindo conhecimento sobre suas características e ecologia, como polinizadores e fungos associados ao seu crescimento, por exemplo.
O fato de a descoberta ser registrada na Mata Atlântica também funciona como um alerta para os pesquisadores.
“O Brasil é o país mais biodiverso do planeta e uma em cada cinco plantas no mundo só ocorrem aqui. Dentro do país, o bioma mais rico e ameaçado é a Mata Atlântica. Descobrir espécies novas nesse bioma, cuja área atual é cerca de 10% de sua área original, mostra o quanto ainda precisamos estudá-lo para protegê-lo”.
As duas localidades em que as amostras foram encontradas são ambientes de florestas nebulosas alto-montanas, conhecidas por serem de difícil acesso, e pertencem à Serra do Mar paranaense — um conjunto de elevações formadas por processos tectônicos que se originaram durante a Era Cenozóica, iniciada há 65,5 milhões de anos.
Associado à alta umidade, a floresta abrange uma área composta por árvores de pequeno porte, fornecendo habitat em abundância para plantas epífitas. De acordo com Smidt, docente da UFPR e orientador da pesquisa, a Malaxis é um gênero de Orchidaceae (maior família botânica do grupo das Monocotiledôneas).
O gênero está distribuído pelos trópicos e subtrópicos do planeta com cerca de 170 espécies. Destas, cerca de dez ocorrem no Brasil. A maioria das espécies da família Orchidaceae, especialmente nos trópicos, são epífitas — plantas que vivem sobre outras usando-as como suporte.
“Em relação à Malaxis, o gênero possui tanto espécies epífitas, quanto terrestres. Aparentemente esta é a primeira espécie epífita do gênero descrita para o Brasil”, destaca.
As características mais visíveis da Malaxis engelsii envolvem a inflorescência densa, com flores bem coloridas, que variam entre laranja, branco e verde, dependendo da peça floral.
Registrada em artigo publicado recentemente na revista científica Lankesteriana, a descoberta é assinada por Smidt e pelo doutorando da Unesp, Thiago Faria do Santos, que fez uma revisão do gênero Malaxis no Brasil.
O pesquisador ainda descreve o habitat da nova espécie como “um ambiente místico, quase proibido para a exploração humana. É onde as nuvens abraçam a floresta, um tipo de ambiente caracterizado pelo alto grau de endemismo [espécies restritas ao habitat], com plantas especializadas para viverem ali”.
A descoberta amplia a compreensão sobre a biodiversidade e é considerada de alta relevância pelos pesquisadores por contribuir diretamente com o progresso científico. “Conhecer as características únicas de uma planta pode levar, por exemplo, ao desenvolvimento de novos medicamentos, materiais ou tecnologias. Assim, a descrição da natureza não é tarefa secundária; ela é o desenvolvimento tecnológico e científico”, diz Santos.