Na semana que se comemora o Dia da Árvore e início da primavera, Londrina não tem muito o que comemorar. Apesar de suas grandes áreas verdes, há longos trechos de calçadas e ruas sem uma árvore sequer. Quem caminha pelas ruas da cidade sabe a falta que uma sombra faz. Quem procura um lugar sombreado para estacionar o carro sabe que essas vagas são raras. E para piorar a situação, muita gente que mantém uma árvore em frente ao seu imóvel, o que é obrigatório pelo Plano Diretor de Arborização de Londrina, faz podas drásticas expondo a árvore a doenças e pragas e reduzindo significativamente seus serviços ambientais. Isso quando não elimina a planta completamente.
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Londrina figura entre os dez municípios mais arborizados do Brasil, segundo o Censo Demográfico 2022 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), divulgado em abril deste ano. De acordo com o instituto, entre as cidades com mais de 100 mil habitantes, Londrina figura na 6ª posição, com 96,8% das vias com pelo menos uma árvore plantada. E em que pese os dados do IBGE posicionem o município em um lugar de destaque no Brasil, o estudo considerou a presença de pelo menos uma árvore por via e não são raros os longos espaços urbanos em zonas residenciais e comerciais carentes de qualquer vegetação.
A relação do londrinense com as árvores ainda é um problema a ser superado e um desafio para a Sema (Secretaria do Ambiente de Londrina). Erradicadas ou mutiladas sem autorização, as plantas são impedidas de prestar seus serviços ambientais de forma plena e, na maioria das vezes, sob o pretexto de sujarem as calçadas ou taparem a fachada do comércio.
Segundo a The Nature Conservancy, organização da sociedade civil presente em mais de 80 países, as árvores são capazes de prestar serviços ambientais para além da remoção de CO2 (gás carbônico) da atmosfera, função que costuma ser ensinada nas escolas e que paira no senso comum. Em áreas urbanas, essas estruturas naturais podem controlar o ciclo da água – reduzindo alagamento e enchentes–, devolver água à atmosfera por meio da evapotranspiração – contribuindo para a qualidade do ar – e fornecer conforto térmico e acústico nas cidades.
E mesmo com tantos benefícios reais e potenciais, a Sema recebeu, de janeiro a agosto deste ano, 745 denúncias de corte ou poda irregular de árvores no município. O número é 119% superior ao registrado em todo o ano de 2024, quando 340 denúncias foram recebidas pelo órgão.
Além disso, a secretaria enfrenta o desafio de fazer valer o Plano Diretor de Arborização do Município de Londrina (Lei Ordinária nº 11.996/2013), que obriga proprietários e responsáveis de imóveis em áreas urbanas a plantar e a conservar um exemplar arbóreo em frente às suas casas e comércios. No último ano, mais de 750 pessoas foram notificadas para plantio.
PODA DRÁSTICA E ESTÉTICA
A maioria dos acionamentos da população à Sema estão relacionados à poda drástica. O Diretor de Áreas Verdes da secretaria Gerson Galdino explica que as características dessa prática são o corte de mais de 50% da copa; o corte da gema apical, principal galho vertical da árvore; o corte somente de um lado, desequilibrando a estrutura; e o corte em formatos de U ou de V.
Essas práticas são vedadas pelo Plano de Arborização e passíveis de multa que pode variar de R$ 196 a R$ 1.967 se o objetivo da poda for visualizar placas publicitárias ou fachadas comerciais, se atingir árvores protegidas ou bem desenvolvidas, ou ainda se for realizada por interesses econômicos. Em caso de erradicação não autorizada, a multa mínima parte de R$ 983 por planta e pode ser agravada.
Muitas pessoas acreditam que eliminar parte da copa da árvore reduz as chances de queda em temporais. Galdino explica que esse pensamento é equivocado e que o hábito de podar a árvore de forma tão agressiva está na verdade relacionado à queda. ”As pessoas também colocam cimento sobre a raiz para não ficar com terra e deixam as árvores só no tronco. Aí fica aquele monte de cimento, não entra água na raiz e ela também não tem exposição à luz [em razão da poda das folhas, responsáveis pelo processo de fotossíntese que nutre a planta]. Ela vai apodrecendo e quando vem o vendaval, cai”, observa.
Outra prática vedada é a topiaria, um tipo de poda que dá formas à copa das árvores, geralmente quadradas ou arredondadas e muito comum em zonas residenciais. Galdino esclarece que essa prática é feita com finalidade estética e impede a árvore de crescer e desempenhar suas funções. Essa prática é penalizada com multa que pode chegar a R$ 983. “Quando se faz a topiaria, a pessoa deixa a árvore com três metros [de altura] e praticamente tira a função de sombrear, de servir de abrigo para pássaros, de retenção de poeira e de retenção de ruídos”, complementa o diretor.
Segundo a Sema, atualmente é permitido que se faça apenas poda de levante, ou de limpeza sem a autorização da secretaria. Essa técnica consiste na remoção de ramos e galhos baixos da árvore, elevando a copa da planta. Mesmo assim, Galdino lamenta que a prática mais comum seja o corte drástico sob a alegação de desconhecimento da lei ou com base em receio infundado de que a árvore pudesse cair.
O diretor também destaca que o principal desafio é aumentar a densidade de arborização e vencer a cultura da erradicação fundamentada na ideia de que as árvores causam problemas. Ao longo dos anos de experiência acumulados na Sema, Galdino tem observado que essa cultura está de alguma forma relacionada ao perfil socioeconômico dos bairros.
“A gente tem dificuldade na região central e nas avenidas, por causa do comércio [que tem o hábito de retirar obstáculos que dificultam a visualização da fachada]. E também temos problemas nos bairros com menos poder aquisitivo. Em bairros de classe média a própria população solicita árvores. E nos mais pobres às vezes você planta e eles [moradores] não deixam crescer. Vão lá e quebram ou atacam a árvore do vizinho”, lamenta.
DESAFIOS PARA FISCALIZAR
A Sema conta hoje com uma equipe de 60 pessoas em diferentes áreas de atuação dentro da secretaria. Contudo, apenas quatro são fiscais habilitados para averiguar práticas de poluição, descarte irregular, queimadas, danos ambientais e, inclusive, a poda ou erradicação irregular de árvores.
Galdino explica que uma ferramenta fundamental para aumentar a densidade de arborização é condicionar a obtenção de habite-se em novas construções ao plantio de uma árvore. Segundo o diretor, a lei existe, mas a competência para fiscalizar esse requisito foi retirada da Sema e repassada à Secretaria Municipal de Obras sob a justificativa de desburocratizar o processo, dificultando esse acompanhamento pelo órgão do meio ambiente.
“As construções novas têm que tirar o habite-se. E nesse momento é visto se tem árvores ou não. Só que isso está com a Secretaria de Obras. Essa é uma ferramenta para arborizar a região central e, na minha opinião, uma das melhores”, complementa.
AÇÕES EDUCATIVAS
Se por um lado as denúncias aumentaram de forma expressiva em comparação com 2024, evidenciando o crescimento das práticas irregulares, por outro isso demonstra que mais pessoas estão atentas ao problema da ausência de árvores ou à forma criminosa com que elas são podadas ou erradicadas. Essa é a percepção da Assessora de Educação Ambiental da Sema Lidiani Isidoro.
Para Isidoro, o aumento está diretamente relacionado às ações educativas que a secretaria vem realizando no último ano por meio das redes sociais. No instagram, a Sema orienta o que pode ou não ser feito e disponibiliza canais para formalização de denúncias.
“A gente publica no Instagram o que não pode, o que é ideal. E aí o pessoal fala 'mas aqui na minha rua tem [a situação irregular]. Onde que denuncia?’ Então a gente manda o link para ela abrir a denúncia. E esse ano realmente a gente pegou firme para falar dessa questão da arborização com fotos, com vídeos”, destaca Isidoro.
A assessora salienta que o trabalho que a secretaria tem feito nas escolas e em eventos da prefeitura, com orientações e doação de mudas, têm sido fundamentais nesse processo. Segundo a Sema, somente em 2025 foram distribuídas 3.976 mudas para plantio em área urbana e outras 1.353 foram diretamente plantadas pelo órgão.
REESTRUTURAÇÃO DO QUADRO
Um dos desafios da Sema, para além da educação ambiental, é a fiscalização. O Secretário Municipal do Ambiente Gilmar Domingues lembra que a secretaria fez, recentemente, o chamamento de dois engenheiros ambientais, um arquiteto urbanista, um engenheiro agrônomo e dois técnicos de gestão pública. Agora, a Sema busca a reestruturação do setor de fiscalização, que já foi solicitada à prefeitura.
Mesmo assim, Domingues é resistente ao falar em fiscalização. Para o secretário, o foco do trabalho deve ser em educar. “Uma cidade que acredita na fiscalização para garantir o bem-estar da comunidade está fadada ao fracasso. Nós temos que levar conhecimento, educação ambiental e sensibilizar a comunidade de que aquilo é benéfico. E não acreditar única e exclusivamente na fiscalização. Se fosse assim, nós teríamos que ter 600 mil fiscais para fiscalizar os moradores de Londrina. Óbvio que os abusos têm que ser coibidos com a fiscalização. E é por isso que nós começamos a solicitar para o governo a reestruturação do quadro.”
O secretário reforça a importância das árvores para o que chama de microclima das ruas e destaca que há diferença de dois a três graus de temperatura entre uma rua bem arborizada e outra sem árvores.
“Nós precisamos difundir esta cultura para todas as ruas de Londrina, que é regenerar, reestruturar a arborização urbana em todas as áreas do município, coibindo esses abusos das podas drásticas, proibindo a erradicação de forma aleatória e garantindo manutenção efetiva e de forma correta”, completa Domingues.
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