A equipe econômica está passando um pente-fino nas desonerações tributárias para tentar cobrir os R$ 55 bilhões que faltam para o cumprimento da meta fiscal de 2017. Com um universo de desonerações superior a R$ 271 bilhões em 2016, o governo pretende começar a análise pelos regimes especiais de tributação. Estão na mira os programas de incentivos que geraram pouco resultado. Mas o trabalho não será fácil, já que a maioria das mudanças depende de aprovação pelo Congresso.
Entre os atingidos devem estar os regimes que ajudam no controle de preços, mas que acabaram aumentando margem de lucro de pequenos grupos de empresas. O governo entende que esse é um tipo de desoneração que, no longo prazo, distorce o valor dos produtos. "Benefícios com o objetivo de conter os preços dão uma ideia falsa de justiça, porque impactam da mesma maneira o consumo de ricos e pobres. Muitas vezes, distribuir um produto para uma classe da população dá mais resultado do que abrir mão da arrecadação do tributo para todos", afirmou uma fonte.
Na área econômica, a avaliação é que a recuperação das receitas tributárias e as receitas a serem obtidas com privatizações, concessões e securitização não serão suficientes para garantir que as contas de 2017 fechem dentro da meta, fixada em um déficit de R$ 139 bilhões. Por isso, será necessário acionar o chamado "plano C", do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles: aumento de impostos e contribuições. É nessa linha que está a revisão dos programas que envolvem desonerações.
O próprio ministro voltou a admitir, nesta quarta-feira, 3, no seminário Pensamentos Olímpicos sobre a Economia Brasileira, no Rio, que poderá elevar alguns tributos, a depender da evolução da arrecadação. Os aumentos, se vierem a ocorrer, serão feitos da forma "mais pontual possível", prometeu. Ele acrescentou que a decisão será tomada até o dia 31 deste mês, quando se encerra o prazo para envio, ao Congresso Nacional, da proposta do Orçamento federal para o ano que vem.
Caça às bruxas
Para o coordenador do Núcleo de Estudos Fiscais da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e diretor do Centro de Cidadania Fiscal, Eurico Marcos Diniz de Santi, o governo precisa atacar a questão, mas não pode fazer uma "caça às bruxas" nos benefícios tributários. O economista defende que essas desonerações sejam revertidas completamente, mas com uma regra de transição, de cinco a dez anos, que dê segurança aos agentes econômicos que firmaram contratos de longo prazo baseados na atual realidade tributária. Uma mudança mais suave, no entanto, não teria resultado imediato.
"É importante que essas renúncias, hoje protegidas pelo sigilo fiscal dos beneficiários, passem para o Orçamento da União, de uma forma que ganhem transparência e possam ter sua alocação discutida pela sociedade", diz De Santi.
O especialista aponta ainda que o atual sistema tributário, cheio de exceções e judicializado, ajuda a fomentar a atividade de lobby setorial que muitas vezes acaba se transformando em corrupção. O último relatório do governo central já deu um primeiro sinal. Em uma tabela atípica, o Tesouro afirmou que "a carga tributária associada às receitas administradas pela Receita Federal caiu de 14,5% em novembro de 2011 para 12,8% em junho de 2016".
Muitas das desonerações vigentes foram instituídas ainda no governo da presidente afastada Dilma Rousseff e, mesmo com prazo para acabar, demorarão para se dissolver. Para reduzir esses gastos, a equipe econômica precisará contar com a ajuda do Congresso, o que já se mostrou difícil após a tentativa de aprovação do Projeto de Lei que auxilia as contas dos Estados. (Colaboraram Antonio Pita, Daniela Amorim, Fernanda Nunes e Vinicius Neder)
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.