A disparada dos preços dos serviços nos últimos meses provocou uma forte distorção entre o custo do reparo e da compra de um produto novo. Hoje é mais barato adquirir um eletrodoméstico novo do que consertá-lo. No caso de roupas, o preço de um ajuste é quase o valor da peça. Nos itens de alta tecnologia, como o iPod, o cenário é mais radical: o próprio fabricante recomenda a compra do produto no lugar do conserto.
Dados do Índice de Preços ao Consumidor (IPC) da Fipe mostram que, nos últimos 12 meses até abril, o IPC subiu 6,39%, enquanto os preços dos serviços livres, aqueles que variam de acordo com a demanda e a oferta, aumentaram 7,41%.
Isso significa que os preços dos serviços subiram 1 ponto porcentual acima do IPC geral e quase 2 pontos porcentuais acima da variação de preços dos produtos com preços livres (5,24%) registrada no mesmo período. O IPC da Fipe considera os preços na cidade de São Paulo.
Quando se leva em conta a medida oficial de inflação, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), do IBGE, a escalada do preço dos serviços em relação ao dos produtos fica ainda mais nítida. Em 12 meses até abril deste ano, o IPCA subiu 6,51% e os preços dos serviços aumentaram 8,57%, uma diferença de mais de 2 pontos porcentuais.
Comparada com a variação de preços dos bens duráveis, isto é os produtos de maior valor, como eletrodomésticos e eletrônicos, por exemplo, a diferença é ainda maior: de quase 9 pontos porcentuais. É que os preços dos duráveis tiveram deflação de 0,26% no período.
Raiva. "Sei que essa mudança de preços relativos provoca muita raiva no consumidor quando ele precisa pagar caro pelo conserto. Mas isso é ser desenvolvido", diz o coordenador do IPC da Fipe, Antonio Comune. Ele lembra que nos Estados Unidos, por exemplo, como os serviços são muito caros não vale a pena consertar o eletrodoméstico e é mais interessante jogá-lo fora e comprar outro novo.
Comune observa que essa mudança de preços relativos entre produtos e serviços é um movimento estrutural que já vem ocorrendo há algum tempo, mas foi acelerado nos últimos 12 meses em razão da escassez de mão de obra e da valorização do real em relação ao dólar.
Em dez anos, o custo do serviço de costura, por exemplo, subiu 140,45% em São Paulo, enquanto o preço do vestido aumentou 6,09%, e a inflação foi de 90,83%. No caso do conserto de equipamento doméstico, houve um acréscimo de 121,59% em dez anos e o preço do forno de micro-ondas teve deflação de 16,29%.
Thiago Curado, economista da Tendências Consultoria , observa que desde 2005 a inflação dos serviços vem correndo acima da inflação geral. "Essa é a consequência natural do processo de desenvolvimento e do bom momento pelo qual passa a economia brasileira, com desemprego em queda, ganho de renda e explosão do crédito."
Curado destaca também que os ganhos de produtividade obtidos pela indústria são maiores que no setor de serviços, especialmente com a presença da China no mercado internacional. "Isso afeta os preços relativos."
Tatiana Pinheiro, economista do Banco Santander, ressalta que a mudança dos preços relativos entre serviços e produtos reflete também a menor oferta de prestadores de serviços, o que reduz a concorrência e eleva preços, na maioria das vezes balizados pelo salário mínimo, que teve ganhos reais nos últimos anos. Além disso, o consumo aquecido sanciona a alta dos preços dos serviços.
Já no caso de produtos, observa ela, o cenário é inverso. O câmbio favorável às importações e a forte concorrência de produtos estrangeiros forçam os preços desses itens para baixo, aumentando a diferença de preços relativos entre produtos e serviços. (As informações são do jornal O Estado de S. Paulo)