As taxações de 50% a produtos brasileiros anunciadas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, a partir de agosto não devem ter um forte impacto nas exportações de Londrina. De acordo com dados catalogados pela reportagem no Comex Stat - sistema oficial de estatísticas do comércio exterior brasileiro - o primeiro semestre do município foi um dos mais exitosos da história, com destaque para a ínfima participação do país norte-americano nas relações de comércio exterior.
Dos US$ 465,2 milhões (R$ 2,7 bilhões) exportados por Londrina no primeiro semestre, somente 3,76% (US$ 17,5 milhões) tiveram como destino os Estados Unidos. Em contrapartida, a relação com a China representou 45,7% (US$ 213 milhões). Para os economistas ouvidos pela reportagem, as taxações dos EUA são preocupantes a nível nacional, mas em Londrina não devem ter grande impacto.
"Tirando o açúcar e o café, nada do que a gente exporta em Londrina é comprado pelos EUA. As principais exportações do Brasil para lá são o aço e os aviões da Embraer (Empresa Brasileira de Aeronáutica), mas a participação deles nas relações comerciais do Brasil hoje é bem menor do que foi no passado", explica o economista e professor da UEL (Universidade Estadual de Londrina), Sinival Pitaguari.
De acordo com ele, as tarifas de 10% aplicadas a produtos exportados pelo Brasil a partir de 5 de abril ajudaram Londrina e o país a expandirem para novos mercados, o que pode ter gerado um movimento inverso ao de prejudicar a economia local. "Essas taxações que os Estados Unidos fizeram ajudaram não só Londrina, mas o Brasil todo a exportar mais soja, porque a China, em retaliação, ao invés de comprar dos EUA, comprou do Brasil e de outros países", afirma, destacando que 65% das exportações do município são de soja e milho, produtos que o país norte-americano compete diretamente com o Brasil no mercado internacional.
Café preocupa
O economista e professor da UEL Emerson Esteves ressaltou, entretanto, que a exportação de café industrializado, que ocupa 23% das vendas de Londrina no exterior, pode sofrer um impacto imediato com as tarifas de Trump.
"A gente exporta muito café para fora. Com a taxação de 10% em abril, o produto que custava R$ 100 virou R$ 110. Então, por isso poderia ter sido melhor [o primeiro semestre]. Agora, vai depender muito da demanda de cada produto", pontuou Esteves, salientando que o primeiro semestre recordista em exportações no município poderia ter resultados ainda maiores sem as tarifas.
Para ele, a melhor saída ainda é a diplomacia para evitar que os 50% de taxas sejam efetivados em agosto. O aumento, garante, teria efeito imediato nas vendas, o que poderia causar crises na economia local. Nesta terça-feira (15), entretanto, Donald Trump reforçou a importância das medidas anunciadas para o "dinheiro entrar nos Estados Unidos", mostrando que não tem a intenção de voltar atrás.
Mesmo assim, Esteves aposta num acordo. "A gente exporta muito café e isso pode afetar, sim. Por isso, o governo vai tentar reverter essa taxação na diplomacia até 1º de agosto. Como o Trump deu esse prazo, ele está aberto à negociação. Se não quisesse, já estaria valendo no mesmo dia do anúncio. Se realmente não baixar as tarifas, o país tem que procurar outros mercados para dar vazão a esses produtos."
Para Pitaguari, o aumento da demanda por café na Ásia pode ser a solução para suprir as taxas norte-americanas. Segundo ele, o Brasil aposta em novos mercados desde o início dos anos 2000, investindo em países asiáticos, o que ajudou a puxar a demanda de produtos brasileiros no mercado internacional.
"Londrina, em específico, foi beneficiada com o aumento da demanda do café e com a quebra de safra em outros países. E houve muito aumento de demanda nos países asiáticos. Por exemplo, os chineses aprenderam a tomar café. Isso é bom? Depende, porque vamos exportar muito mais para eles, porém o preço vai ficar muito mais caro para o brasileiro", comentou Pitaguari.
Resultados animadores no primeiro semestre
O primeiro semestre foi animador para as indústrias de Londrina. O município, com a ajuda da alta do dólar, registrou o maior valor, em real, em produtos exportados desde 1997, ano em que o primeiro balanço foi divulgado pelo governo.
A economia local passou pelo seu auge nas exportações entre 2011 e 2017, período em que os valores exportados ultrapassavam os US$ 500 milhões no primeiro semestre. Números parecidos só voltaram a ser registrados a partir de 2023, com o melhor resultado, na cotação para o real, sendo anotado no primeiro semestre de 2025.
Confira abaixo os resultados no primeiro semestre de cada ano, com o montante de exportados em dólar e o valor traduzido para o real com base na cotação da moeda americana em cada período:
2011: US$ 396.006.596 - R$ 641.530.685,52 (Dólar a R$ 1,62)
2012: US$ 484.871.886 - R$ 901.861.707,96 (Dólar a R$ 1,86)
2013: US$ 451.521.915 - R$ 916.589.487,45 (Dólar a R$ 2,03)
2014: US$ 473.416.716 - R$ 1.121.258.625,72 (Dólar a R$ 2,37)
2015: US$ 570.960.791 - R$ 1.901.899.939,03 (Dólar a R$ 3,33)
2016: US$ 410.776.005 - R$ 1.433.901.497,45 (Dólar a R$ 3,49)
2017: US$ 472.879.118 - R$ 1.508.835.809,62 (Dólar a R$ 3,19)
2018: US$ 262.499.308 - R$ 958.122.474,20 (Dólar a R$ 3,65)
2019: US$ 180.694.355 - R$ 713.731.792,25 (Dólar a R$ 3,95)
2020: US$ 200.878.174 - R$ 1.052.502.666,16 (Dólar a R$ 5,24)
2021: US$ 139.154.894 - R$ 762.637.721,12 (Dólar a R$ 5,48)
2022: US$ 199.301.733 - R$ 1.028.436.994,28 (Dólar a R$ 5,16)
2023: US$ 399.362.703 - R$ 1.992.829.071,97 (Dólar a R$ 4,99)
2024: US$ 450.624.818 - R$ 2.428.847.019,02 (Dólar a R$ 5,39)
2025: US$ 465.181.824 - R$ 2.674.895.438,00 (Dólar a R$ 5,75)
De acordo com a análise do economista Emerson Esteves, há diversos fatores que podem explicar a volta do protagonismo de Londrina nas exportações. Segundo ele, movimentações políticas nacionais e internacionais interferem diretamente no setor econômico.
"É um contexto global. Quando a pandemia chegou, em 2020, houve uma queda da cadeia global de produtos. Então, houve uma queda na exportação de produtos, que agora estamos retomando. Já em 2022, houve a eleição presidencial, o que geralmente impacta a economia. Em 2024, houve a eleição presidencial nos Estados Unidos. Em 2025, os dois cenários já estavam resolvidos, o que trouxe mais segurança para se fazer negócios."
Já Pitaguari elencou outros motivos que interferem no setor de exportações de Londrina, como a demanda internacional e a taxa de câmbio. Para ele, os números foram "carregados" com a alta do dólar que o país presenciou entre 2024 e 2025.
"No fim de 2024 e início de 2025, a taxa de câmbio estava muito elevada, chegando perto de R$ 6,30. O câmbio mais alto deixa os produtos brasileiros mais baratos para quem mora fora do país. O crescimento das exportações deve-se a isso." Pitaguari salientou que, no segundo semestre, os números do município podem surpreender negativamente, mas não pelas tarifas de Trump. "O maior problema será a baixa sequencial na cotação do dólar", disse.
Vendedores de Londrina em alerta
Karine Melaré, diretora de Comércio Internacional da ACIL (Associação Comercial e Industrial de Londrina), explicou, em entrevista ao Portal Bonde nesta quarta-feira (16), que os exportadores do município estão em estado de alerta com a iminente taxação de Trump. Segundo ela, os 10% anunciados em abril foram um aviso do que estava por vir.
"No primeiro semestre, as negociações não foram tão afetadas por conta das taxas de 10%, pois as negociações não acontecem do dia para noite. Já a tarifa de 50% é um caso diferente, porque já está sendo veiculada e causa um grande desconforto porque é bem agressiva. [Se for concretizada], haverá uma revisão de valores e de negociações. Os vendedores ficam em estado de alerta e sem saber se conseguirão seguir exportando."
Melaré pontuou que as medidas de Trump devem afetar a competitividade de diversos produtos londrinenses no mercado internacional. "Nós temos aqui no Brasil benefícios fiscais que fazem com que o nosso produto acabe chegando no exterior mais barato do que no mercado nacional, por exemplo. Com essa taxação, a competitividade fica afetada. Os vendedores estão muito preocupados", salientou a diretora da Acil, elencando que Londrina tem grandes representantes nos setores de embalagens, cosméticos, equipamentos para academia e ortodontia.
De acordo com ela, além da taxação, a verificação de produtos brasileiros no exterior também está mais criteriosa, o que vem causando transtornos em várias negociações. "Alguns desses produtos tiveram que voltar porque o governo dos EUA, além da taxação, agora pede uma documentação que antes não era solicitada."
Apesar dos prejuízos ao se analisar pequenos e médios negócios que vendem produtos para os Estados Unidos, Melaré destacou que as tarifas ao Brasil, se forem concretizadas, não devem interferir nos números do segundo semestre de maneira contundente.
"A nossa exportação para os Estados Unidos desde 2001 vem sofrendo queda ano a ano. No Brasil, as nossas exportações para lá chegaram a quase 25% e hoje não somam 12%. Em Londrina, são cerca de 4%."
Resultado de trabalho e investimento
Melaré afirmou que o primeiro semestre com bons resultados nas exportações de Londrina é resultado de investimento, estudo e a própria movimentação dos empreendedores ao se reinventarem após a pandemia de covid-19.
"Londrina começou a se atentar ao mercado internacional nos últimos anos. Temos feito um ótimo trabalho dentro da Acil, com o Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) e a Apex (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos). Tudo isso tem surtido efeito na nossa região. Além disso, o empresário vem se adequando a algumas tendências e se movimentado no pós-pandemia."
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